As intensas chuvas que caem no Recife e na região metropolitana da capital desde a quarta-feira, 25, deixam marcas de luto e destruição nas comunidades atingidas. Na última semana, enchentes e deslizamentos já provocaram 44 mortes e há ao menos 56 desaparecidos. O número de desabrigados chega a 3.957 e 533 pessoas estão desalojadas na região.
Uma das vítimas foi o jardineiro Alex Roberto da Luz, de 41 anos. Morador do bairro da Muribeca, em Jaboatão dos Guararapes, na região metropolitana, ele morreu na quarta-feira, 25, enquanto tentava evitar que seus animais fossem arrastados pela enxurrada em uma rua alagada. Seu corpo foi encontrado nesta sexta-feira, 27, por seus irmãos, que usaram uma jangada para vasculhar a região.
"O que me revolta é que tivemos de fazer as buscas pelo meu irmão sozinhos. Os bombeiros disseram que a prioridade era resgatar pessoas idosas", contou Alexandro Rodrigo, irmão de Alex. "Passamos dois dias procurando por ele. Depois, ainda esperamos sete horas até que fossem buscar e levar para o Instituto Médico Legal (IML). É revoltante."
Além dos afetados diretamente pelas chuvas, houve casos de pessoas que passaram mal por conta da angústia causada pelo avanço das águas. A professora Lua Freire Soares, de 47 anos, contou que sua mãe, Dalva Freire Soares, de 86, começou a se sentir mal depois que a água começou a invadir a casa da família, no bairro da Imbiribeira, na zona sul do Recife. Apesar dos alagamentos frequentes em épocas de chuva, foi a primeira vez que a água avançou tanto no imóvel.
"Quando percebi que a água invadiu nossa casa, por volta das 6 horas da manhã, disse para a minha mãe ficar na cama. Pouco tempo depois, voltei ao quarto e ela já estava passando mal. Liguei para o Samu, tentei reanimá-la, mas não foi possível. Depois, liguei para os bombeiros, para a polícia, para tentar retirar o corpo, mas a rua estava alagada. Só conseguimos por volta das 15 horas", relatou a professora. "Minha mãe sempre teve medo de que algo assim pudesse acontecer, era hipertensa e não resistiu ao impacto da situação."
A família da doceira Mirtes Carla de Oliveira, de 34 anos, também ainda está sob o impacto dos deslizamentos que ocorreram na região do Córrego do Abacaxi, no bairro de Caixa D Água, em Olinda. "Meu filho do meio não consegue dormir, chora bastante", relata Mirtes, que mora há oito anos na localidade. "Perdi todo o meu material de trabalho, minha casa está com 50 centímetros de lama. É uma tristeza."
Mirtes conta que estava acordada no início da madrugada da quarta-feira, preocupada com a intensidade das chuvas, quando ela e o marido escutaram um forte estrondo. Ele, a princípio, pensou que se tratava de um trovão. A doceira, no entanto, não teve dúvidas: a barreira próxima à sua casa havia desabado.
O casal acordou os três filhos, de 17, 8 e 6 anos, e deixou o imóvel, buscando abrigo na casa de parentes. Só no dia seguinte Mirtes teve dimensão do impacto do deslizamento. Dois de seus vizinhos, o casal Rosemary da Silva, de 44 anos, e Sérgio Pimentel, de 54, morreram naquela madrugada. Os corpos foram encontrados na quinta-feira.
Em casa, Mirtes viu que sua estação de trabalho, localizada nos fundos da casa, havia sido totalmente perdida, enquanto a residência foi tomada pela lama.Uma situação vivenciada também por alguns dos seus vizinhos.
Moradora da comunidade de palafitas localizada na Baía do Pina, na zona sul do Recife, a marisqueira Leydiane da Silva, de 27 anos, tem vivido dias de apreensão por conta da intempérie. Com as chuvas e a maré alta, ela sofre com a insegurança de sua moradia, cuja estrutura, além de naturalmente frágil, foi comprometida recentemente por conta do incêndio que atingiu a comunidade no início de maio.
"A maré alta, misturada com o lixo, tem trazido muitos problemas. Na minha casa, as paredes e as telhas estão encharcadas. Muita gente saiu daqui depois do incêndio, mas eu não tinha para onde ir", conta Leydiane. "A Prefeitura deu até segunda-feira (30) para a gente sair. Nós, que somos de palafita, vamos receber uma indenização de R$ 1.500 pela casa e um auxílio de R$ 200. O que mais me preocupa neste inverno é o trabalho. As chuvas misturam águas doce e salgada, não vamos ter como trabalhar catando os mariscos."