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O que querem os brasileiros

O que melhor poderia ocorrer ao Brasil neste momento? Cada brasileiro tem uma resposta na ponta da língua. Mais dinheiro no bolso, mais saúde, garantia de emprego, maior segurança nas cidades, harmonia social. Qual é a palavra que resume esses superlativos? Crescimento. A indicação a resumir as expectativas gerais é esta: os brasileiros esperam a expansão do Produto Nacional Bruto da Felicidade, o PNBF, ou seja, o grau de satisfação de todas as classes. Como se alcança esta meta? Por meio de medidas de natureza econômica, social e política.
 
A meta, vale reconhecer, resvala pelas tortuosas curvas da imponderabilidade, comum aos países, principalmente quando estes atravessam uma das maiores crises de sua história. Existe, porém, um amplo espaço de previsibilidade, que pode ser preenchido com decisões focadas para a melhoria do bem-estar social. Este território é o do entendimento sobre a abrangência da po­lítica e leva em conta o fato de que ela não é apenas a arte do possível, mas a vontade de viabilizar coisas que parecem impossíveis.
 
Portanto, cabe a um novo governante resgatar as esperanças perdidas. Para tanto, urge fazer sinais na direção de reformas, a começar pelas tão propaladas reformas política e tributária. O País vive uma crise crônica porque a natureza de sua política é incompatível com um modelo racional de Estado e uma gestão moderna de democracia. Em consequência, vive-se uma situação de precária governabilidade, agravada por tensões entre insti­tuições. Olhe-se, por exemplo, para o tamanho do Ministério. O ideal seria que o eventual novo presidente Michel Temer pudesse cortar uma boa parte do lote de Pastas. Mas a realidade política impõe a distribuição do poder entre os partidos que darão sustentação ao novo governo. Por isso, o apelo social por um corte vertical nos Ministérios acabará não tendo resultados.
 
Entre as ações prementes, precisa-se reformar o sistema político-eleitoral; modernizar a es­trutura do Estado, a partir de limites sobre competências entre Po­deres e redefinição de atribuições entre entes federativos; consolidar a legislação infraconstitucional, que mantém buracos desde 1988, e atualizar os eixos das relações do trabalho. Os cidadãos – de todas as classes, vale lembrar – precisam enxergar no Estado braços protetores, e não uma bocarra escancarada e pronta para engolir impostos, encargos e contribuições. Querem um sistema previdenciário que lhes retribua o peso de anos de contribuição. Como, porém, conviver com um sistema de previdência que se mostra falido? Exige-se uma escola pública de qualidade e capaz de abrigar milhões de brasileiros que permanecem fora do sistema educacional. Os brasileiros sonham com os tempos d’outrora, quando a segurança permitia que as pessoas circulassem de maneira tranquila pelas ruas das cidades. Ao governo, portanto, impõe-se o dever de avançar em matéria de segurança pública. Ninguém pode ser contrário a programas de redistribuição de renda. O Bolsa Família é um importante programa de redistribuição de renda e a mão que puxa o cordão dos miseráveis. Mas assistir 13 milhões de famílias por meio de bolsas, sem lhes dar uma saída para esse modelo acomodatício, é aprofundar o buraco, construir a cama perpétua da inércia. Ora, as saídas só aparecerão quando o país entrar na era do pleno emprego.
 
Como interstício entre anos eleitorais, 2017 poderia ser a chave para abrir a porta de grandes reforma. Dar-se-ia prazo suficiente para maturação das decisões. E a aplicação das novas disposições em matéria de reforma tributária, política ou previdenciária poderia ser protelada para dois a quatro anos mais adiante. Não dá mais para esticar o cordão da crise intermitente que amarra o País às raízes arcaicas. O xeque-mate no jogo é a crise econômica. A Nova Matriz Econômica – desonerações e subsídios – carece ser desmontada. Diques pontuais para atenuar as ondas da pororoca só serão eficazes se acompanhados de reformas do Esta­do. Sob esse prisma, a diretriz deve ser a de deixar ao Estado apenas o que lhe compete, transferindo para a iniciativa privada funções que escapam à esfera estatal. Urge termos um Estado adequado, nem gordo nem magro. 
 
Reformar, como se sabe, é mudar, inovar, avançar, recondicionar conceitos que ultrapassam limites físicos para abrigar questões comportamentais. Implica mudança de atitudes. Por que não abrir um grande debate sobre o parlamentarismo? O nosso modelo presidencialista está esgotado. Saturado. As coalizões partidárias acabam se transformando em colisões. 
 
Urge evitar excesso de Medidas Provisórias. Sob essa inspiração, o Palácio do Planalto só usaria o instrumento excepcional da Medida Provisória em caso de urgência e relevância. A sinalização de boa von­tade e respeito ao sistema normativo seria reconhecida, contribuindo para aperfeiçoar a imagem burilada pelo cinzel do populismo.
 
No que diz respeito ao Judiciário, já se percebe que a justiça sai dos longos corredores das Cortes para chegar às ruas. O Judiciário já é aplaudido. Veja-se o juiz Sérgio Moro. Veja-se o ministro Teori Zavascki, cujo voto pela suspensão da atividade parlamentar do presidente da Câmara foi aprovado unanimemente na Suprema Corte. Os juízes começam a receber aplausos da sociedade.
 
O que se espera, enfim, dos atores do cenário institucional é o compromisso com os Valores mais sagrados do sistema democrá­tico e, sobretudo, a vontade de contribuir para elevar os padrões da cidadania. Em suma, espírito público, aquela chama cívica que Tocqueville enxergou, há 180 anos,  quando descreveu a democra­cia norte-americana: “Existe um amor à pátria que tem a sua fonte principal naquele sentimento irrefletido, desinteressado e indefiní­vel que liga o coração do homem ao lugar em que nasceu. Confun­de-se esse amor instintivo com o gosto pelos costumes antigos, com o respeito aos mais velhos e a lembrança do passado; aqueles que o experimentam estimam o seu País com o amor que se tem à casa paterna.”
 
 
 
Gaudêncio Torquato, jornalista, professor titular da USP é consultor político e de comunicação. Twitter: @gaudtorquato

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