Os óculos escuros camuflam o cansaço. Foram mais de 20 horas de viagem até que os integrantes de O Rappa desembarcassem em São Paulo, no início da manhã desta quinta-feira, 2. Eles fizeram quatro shows na Austrália e na Nova Zelândia. Algo, até então, inédito para a banda. Apesar das energias não estarem 100% carregadas, Marcelo Falcão (vocal e violão), Lauro Farias (baixo), Marcelo Lobato (teclados) e Xandão (guitarra) falam com entusiasmo sobre o novo trabalho, o CD e DVD gravado na Oficina Brennand, no Recife. O disco foi lançado pelo Google Play Música. “É difícil se reinventar depois de 20 anos de estrada. Ainda dá muito prazer entrar no estúdio com esses caras. Acho que isso nunca vai mudar. Se a gente não breca, produzimos 2 ou 3 álbuns só com coisas inéditas”, diz Falcão, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo.
O repertório do novo trabalho traz 17 músicas. Dessas, 4 são inéditas. Há também outros sucessos dos álbuns Sete Vezes (2008) e Nunca Tem Fim (2013). O set inclui ainda vários hits que marcaram a carreira do grupo. “Queríamos dar uma oportunidade para que as músicas menos conhecidas caíssem na graça do grande público. Tem muita coisa bacana que fica de lado. Muitos artistas hoje em dia se preocupam mais com outras coisas do que fazer música de verdade. Essa, entretanto, sempre foi uma preocupação de todos os integrantes da banda. Fazer música”, complementa Falcão.
Diferentemente do primeiro acústico lançado pela banda em 2005, desta vez O Rappa usa instrumentos diferentes nos arranjos das canções. O repertório vai da guitarra de 12 cordas, passando pelo clavinete, o piano elétrico, a escaleta e os steel drums – tambores de aço – utilizados com frequência na música caribenha. “Aprendemos muito gravando esse trabalho. Nem sempre dominamos tecnicamente os instrumentos, mas vale a tentativa de experimentar, tentar algo novo. Em vários momentos, nos deparamos com sonoridades nunca antes experimentadas”, afirma Lauro.
Gravado na oficina do escultor e artista plástico Francisco Brennand, no Recife, o trabalho mostra os quatro integrantes se apresentando em uma lindíssima galeria de arte a céu aberto. Foi a primeira vez que o local recebeu um show desse porte. O DVD também mostra cenários históricos do Recife, além de obras impactantes e um encontro emocionante com Brennand. “Foi uma emoção gigantesca. Nós sempre admiramos muito o trabalho dele. Na hora, fiquei superemocionado. O Recife é muito rico culturalmente”, afirma Falcão. A banda também toca com alguns músicos da região, como RAPadura, Rafinha Bravoz, João do Pife e Marcos do Pífano.
A relação de amor com o Recife é antiga. Começou com o Festival Abril Pro Rock no fim da década de 1990 e se mantém até hoje. Os últimos shows de O Rappa na cidade atraíram um bom público, principalmente o do Marco Zero, realizado no carnaval do ano passado. “Tinha um preconceito enorme. Quando fomos chamados para nos apresentar no carnaval, camarada, pensei que a coisa não vingaria. Erro meu. Me apaixonei ainda mais por Recife e pelo carnaval”, conclui Falcão.
Momento político. A trajetória musical de O Rappa é marcada por letras que falam sobre os mais variados problemas sociais do País. Desde o primeiro disco, O Rappa (1994) até Nunca Tem Fim (2013), a banda sempre colocou em pauta discussões referentes aos menos favorecidos social e economicamente. A política, portanto, nunca foi um viés diretamente abordado.
“Temos muito cuidado para falar sobre política ou, de alguma forma, nos manifestar em público. Para compor, a gente se inspira no nosso dia a dia, nos problemas corriqueiros do Vidigal (bairro da zona sul do Rio), por exemplo. O Lobato (tecladista) continua pegando ônibus e eu vou normalmente ao supermercado, sabe? Isso também se aplica aos problemas. Não mudou”, crava Xandão. “O que precisa ficar claro é que, antes de sermos azuis, vermelhos ou amarelos, somos brasileiros e queremos um País melhor”, diz Falcão.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.