Em dezembro, 20,7 milhões de paulistas têm um bom motivo para comemorar. Eles fazem parte do contingente de brasileiros que recebem o 13º salário, o que garantirá uma "injeção" de R$ 35,9 bilhões na economia do Estado. Porém, antes de sair gastando, convém tomar alguns cuidados
A auxiliar contábil Edileuza de Souza Santana, de 21 anos, que mora no Tucuruvi, zona norte de São Paulo, já sabe o destino do seu 13º salário: fazer a rematrícula na faculdade onde cursa Ciências Contábeis. O restante ela promete guardar em uma poupança. Aliás, há quatro anos ela "esquece" este salário adicional, que recebe agora, e o deposita pensando no futuro.
"Todas as economias que tenho guardadas vieram do 13º salário. Sempre economizei. Quando recebo, não conto com ele para nada, só o utilizo em caso de urgência, como no caso da rematrícula da faculdade este ano. Desde a primeira vez que economizei este salário adicional, senti muito mais tranquilidade e segurança. O trabalhador não deve se vislumbrar e gastar o 13º à toa", observou.
Edileuza faz parte do grupo de apenas 18,8% paulistanos que poupam o que recebem, segundo pesquisa da Associação Comercial de São Paulo (ACSP)/Ipsos, divulgada em novembro. O levantamento mostra que 28,9% dos entrevistados não irão economizar. Vão utilizar o dinheiro extra para pagar dívidas. O número mostra um avanço em relação a 2010, quando 27,2% dos consumidores disseram que usariam o salário para o pagamento de contas em atraso.
Dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostram que o 13º salário deverá injetar na economia brasileira, até o final de dezembro, R$ 118 bilhões – o que representa 2,9% do produto interno bruto (PIB), beneficiando 78 milhões de brasileiros, sendo 29,7 milhões ou 38,1% do total, aposentados ou pensionistas da Previdência Social.
Ainda de acordo com os levantamos do Dieese, o número de pessoas que receberá o 13º em 2011 é cerca de 5,4% superior ao observado em 2010 – estima-se quatro milhões de pessoas a mais.
13º deve ser usado para pagar despesas extras de todo ano
Na economia paulista, o 13º salário irá injetar R$ 35,9 bilhões. O valor corresponde a 30,4% do total do Brasil e 59,3% da região Sudeste. O montante equivale a 2,7% do PIB estadual. São 20,7 milhões de paulistas que terão o dinheiro extra em dezembro.
Para o professor da Escola de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em São Paulo, Samy Dana, de 32 anos, a auxiliar contábil Edileuza é um exemplo a ser seguido. "O 13º salário pode ser poupado para as gastos de início de ano como matrículas escolares, IPVA, IPTU e IR. É bom lembrar que, apesar das promoções natalinas, as ofertas em janeiro são maiores. Logo, adiar um pouco as compras pode ser um ótimo negócio", orientou Dana.
Já para as pessoas que têm dívidas, o 13º – segundo explicou o economista da FGV – pode ser uma grande oportunidade para quitá-las. Neste aspecto, o porteiro Antonio Alves é um grande exemplo. "Mas o consumidor deverá ficar atento, principalmente, a dívidas onerosas como cartão de crédito e cheque especial".
O orientação é importante mesmo com o afrouxamento das regras de crédito e baixa de juros anunciadas pelo Banco Central na primeira quinzena de novembro, como forma de estimular a economia.
Brasileiros nunca deveram tanto
Os brasileiros estão endividados. Desde a crise de 2008, quando o governo aumentou a oferta de crédito para manter a economia aquecida, a dívida total dos trabalhadores saltou 80,7% e o valor das parcelas pagas mensalmente cresceu 60%, enquanto o salário aumentou apenas 33,3%.
Dados do Banco Central apontam que o endividamento das famílias brasileiras está no nível mais alto da história: pessoas físicas devem cerca de R$ 715,1 bilhões aos bancos em operações das mais simples, como o microcrédito e o cheque especial, até financiamentos longos, como o imobiliário e de veículos, passando pelo cartão de crédito. Cada brasileiro, segundo o BC, deve média de 4,1% da soma dos salários de um ano inteiro.
Mesmo com este quadro desanimador, o governo quer tentar garantir um Natal mais tranquilo e uma boa ceia à mesa do brasileiro. Para isso, na primeira quinzena de novembro, o Banco Central decidiu remover a maior parte das medidas adotadas no fim de 2010 para restringir a oferta de crédito ao consumidor. Na época, quando elas foram anunciadas, a economia brasileira estava muito aquecida e a prioridade era conter a aceleração da inflação.
Medidas reduzem exigências e crédito fica mais fácil
Pelas medidas adotadas pelo Banco Centralem novembro, a redução das exigências de capital para empréstimos comuns como o crédito consignado (com desconto na folha de pagamento), crédito direto ao consumidor (CDC) e financiamento de veículos foi a considerada mais importante. Outra medida foi para incentivar os empréstimos. O BC mexeu nas exigências de reserva de capital que os bancos precisam manter em caixa para emprestar.
As medidas já surtem efeito. A Caixa Econômica Federal, por exemplo, está oferecendo, até o final do ano, R$ 10 bilhões em créditos destinado às pessoas físicas. Os recursos vão atender às necessidades dos clientes neste período de aumento do consumo e despesas extras.
O Banco do Brasil, por sua vez, cortou taxas de juros de financiamento de veículos, crédito pessoal e consignado destinado a pessoas físicas. O banco está reduzindo em até 0,5 ponto percentual a taxa de juros nos empréstimos para a compra de veículos novos e com até 10 anos de uso. O corte valerá para os financiamentos de até 60 meses, alvo das medidas do BC.
No caso de crédito consignado, as operações no Banco do Brasil entre 37 e 60 meses terão os juros reduzidos em até 0,4 ponto percentual. Haverá ainda corte de até 0,2 ponto percentual em linhas de crédito pessoal entre 25 e 36 meses.
O economista Samy Dana, da FGV, acredita que o resultado das medidas será um pouco complicado. "A taxa de juros no Brasil é um grande problema. Há uma distância muito grande entre ela [taxa] e o consumidor final".
Dana comentou que a questão de empréstimos não é uma novidade "ruim", mas o consumidor deverá prestar atenção na taxa de juros do empréstimo com a taxa básica da economia e, o que é mais importante, ter cuidado com o cheque especial e o cartão de crédito. Apesar da oferta fácil, depois é preciso honrar com os pagamentos.
Pagamento mínimo do cartão de crédito segue em 15%
O Banco Central desistiu de aumentar o limite para pagamento mínimo do cartão de crédito a partir de dezembro. Assim, a taxa seguem em 15% do total da fatura. Circular do BC editada em novembro do ano passado previa que o pagamento mínimo subiria a 20% a partir de 1º de dezembro de 2011. A instituição já havia elevado o percentual de 10% para 15% em junho.
No crédito pessoal, o BC estimulou empréstimos com prazo de 24 a 36 meses, mas manteve ou elevou restrições para operações acima desse prazo. Por exemplo, para prazos acima de 60 meses, o Fator de Ponderação de Risco (FPF) sobe de 150% para 300%. Nesses prazos, porém, a medida afeta número menor de financiamentos, já que operações com esses prazos são mais raras no mercado.
O ex-presidente do Banco Central e economista da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas Gomes, declarou que o BC quer evitar a extensão da crise financeira em 2012. "O Natal d será favorável, graças ao nível de emprego ainda positivo. Com as mudanças, o BC está tentando evitar a extensão da crise no ano que vem".