Mundo das Palavras

O vazio da alma é ferida aberta

Quatro suicídios de estudantes de alta classe média em São Paulo criaram pânico entre empresários, educadores, e, pais da cidade. Uma prova da dificuldade deles em entender o que impulsionou aqueles jovens. Algo, infelizmente, universal – como mostraram as reações de internautas quando a imagem de um homem devastado por sofrimentos íntimos foi recentemente postada no Facebook. 
 
O homem, esculpido em metal em tamanho natural, é obra do artista romeno Albert György. Sozinho, sentado num banco de praça, com a cabeça abaixada, ele tem um enorme buraco no lugar de seu peito, deixando-o assim, sem coração e sem espaço para o ar dos pulmões. 
Algumas pistas para o desvendamento do tipo de sofrimento daquele homem – o mesmo dos suicidas – apareceram nas manifestações dos internautas. Mas, dispersas e sem aprofundamento. 
 
Por exemplo, a atriz, ceramista e pedagoga chilena Lenka Chelen mencionou relacionou a escultura à solidão, à mudez e ao vazio existencial. A adolescente peruana Miriam Fdez viu nele “la ausência del diálogo, del interés por saber como está la outra persona”.  Já a argentina Beatriz Ithurralde escreveu que a obra de György “transmite el dolor de la soledad de uma manera única”. Enquanto para o goiano Gaspar Ferreira ela mostra a ansiedade, a inquietação e o medo provocados por “injustiça social, má distribuição da riqueza, e ausência de princípios e valores”. Já a neerlandesa Maritha Van Schravendijk classificou-a como expressão de desesperança profunda.
 
Há porções de verdade em todas estas observações. Mas, na verdade, quem já vivenciou a situação existencial conhece duas verdades profundas dramáticas, e, generalizadamente mal conhecidas. Por isto quem superou aquela vivência – como é o caso do autor deste texto – tem a obrigação moral de tornar público seu conhecimento íntimo. 
 
A primeira deve provocar espanto em muita gente: os suicidas não querem morrer. O que eles buscam, de fato, é o fim de uma dor insuportável. 
 
Imagine-se um prédio alto em chamas. Tomado por esta dor, o corpo do futuro suicida se transforma num prédio assim. Por isto, ele se jogará até do seu último andar – se for necessário – para se livrar deste corpo em chamas. 
 
A segunda verdade: depressão, a palavra usada para identificar a dor que provoca o suicídio, pouquíssimo esclarece sobre a força, a natureza e o processo de instauração deste sofrimento. Por isto, sua incompreensão é um desafio para a área da Saúde. Que terá de enfrentá-lo – com urgência – reunindo especialistas não só dos campos de Psicologia e Psiquiatria, como de Filosofia e Sociologia, para que pessoas como os jovens paulistanos não continuem se matando. 
 
(Na ilustração, a escultura “Melancolie”, de Albert György, criada em 2014)
 

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