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O vício da mediocridade

Os tropeços do modelo de ajuste econômico implantado pelo governo Dilma não surpreendem. Trata-se de uma frustração anunciada. Como eu disse no Senado no início de março, vaticinando o que viria a acontecer, estamos diante de um oximoro perfeito: um ajuste desajustado. Os principais objetivos – promover o equilibrio fiscal, deter a inflação e melhorar as expectativas dos agentes econômicos – não só não foram atingidos como ficaram mais distantes.
 
O comportamento da inflação derrubou as projeções e ela chegará perto dos 10% ao longo do ano. Isso era previsível, dado o tamanho dos reajustes dos preços administrados – energia, combustíveis e transporte – além da resiliente indexação da economia.  
 
As metas fiscais eram irrealistas e o déficit primário aumentou de 0,6% a 0,8% do PIB (12 meses) entre dezembro e abril. O déficit nominal cresceu de 6,2% a 7,5%% do PIB no mesmo período. Isso também era previsível, graças, de um lado, à queda das receitas do governo (perto de 5% real), derivada da recessão, e, do outro, à aloprada política de juros.    
 
Desde que Dilma se reelegeu, o reajuste acumulado da taxa de juros (SELIC) chegou a 2,75 pontos percentuais. Os aumentos prosseguiram apesar de a economia continuar desabando, de não haver pressão de demanda e de a diferença das taxas brasileiras com as do exterior serem imensas (cerca de 0% nos EUA e na Europa). São aumentos fúteis, mas que, além de derrubarem os investimentos e a atividade econômica, levando junto empregos e arrecadação, entram na veia do deficit público: o custo anualizado para o Tesouro da elevação dos juros é da ordem de R$ 38 bilhões!  
 
O ônus social e político do ajuste desajustado para o governo Dilma ainda está por se manifestar plenamente. O desemprego, que saltou de 4,9 para 6,4% entre abril do ano passado e abril deste ano, caminha para 9% até dezembro, segundo projeção do professor J.R.Mendonça de Barros, que estima a queda do PIB de 1,5 a 2% em 2015 e crescimento zero em 2016. Alguém duvida que, como consequência, a crise política se agravará ainda mais no segundo semestre?
 
Aliás, se há um terreno onde o desempenho do governo deixa a desejar é precisamente o das expectativas, que, no mundo econômico de hoje, funcionam cada vez mais como profecias que se auto-realizam. A sinalização de caminhos – frentes de expansão capazes de puxar a economia – é essencial para que políticas de ajustes funcionem melhor. Mas isso é tudo o que o governo não faz. Sem esforço, podemos identificar três frentes possíveis e necessárias: exportações, infraestrutura e petróleo.
 
No comércio exterior continuamos galhardamente aprisionados na Papuda da União Alfandegária do MercoSul, segundo a qual renunciamos à nossa soberania comercial: qualquer acordo de livre comércio com outro país precisa ser aprovado pelos sócios: Argentina, Uruguai, Paraguai e,agora, Venezuela.
 
Quanto à Infraestrutura – portos, aeroportos, ferrovias, estradas, hidrovias, energia, que turbinam o custo-Brasil – tardiamente anunciou-se um plano, dificultado pelos juros elevados, que afastam parceiros privados, e pelos cortes de 36% dos investimentos federais.. E, para culminar, o toque cucaracha: o novo anúncio substituiu a alucinação do Trem-bala Rio-SP pela Ferrovia Transperuana, que, supostamente, abriria o caminho do Pacífico para a economia brasileira. Só que sai mais barato exportar a soja do Brasil Central para a China via porto Santos ou Paranaguá do que pela nova ferrovia do Pacífico: 46 dólares a menos por tonelada, segundo Blairo Maggi, meu colega do Senado, ex-governador de Mato Grosso e grande produtor de soja. Mas projeto-miragem não é inofensivo: ao contrário, a brincadeira contribui para tirar a seriedade do anúncio e a credibilidade do governo.
 
No setor do petróleo, tudo ia bem até o acesso de megalomania que acometeu os governos petistas em relação à empresa, com os imensos e desastrosos investimentos em refinarias (prejuízos de R$80 bilhões),   o loteamento político de cargos estratégicos, e o arrocho dos preços dos combustíveis (prejuízos de R$60 bilhões) – estratégia oportunista para segurar a inflação. Assim a dívida líquida da Petrobrás chegou a R$330 bilhões, equivalentes a 5 vezes a geração de caixa operacional da empresa. Tanto é assim a atual diretoria da estatal programou a venda de ativos da ordem de 14 bilhões de dólares!
 
Em 2010, e como estratégia da eleição presidencial, o regime de concessão para a exploração do pré-sal foi substituído pelo de partilha, Estabeleceu-se que a Petrobrás deveria ser o operador único de cada área licitada e financiar pelo menos 30% do investimento necessário. Entre as discussões e definições sobre a mudança de método, e as dificuldades da Petrobrás para cumprir a nova obrigação , o Brasil ficou cinco anos sem leilões (2008-2013), levando a uma semi-estagnação da indústria petrolífera.
 
Por isso mesmo, apresentei no Senado projeto que retira a obrigatoriedade de a Petrobrás ser a operadora única do pré-sal e de bancar 30% dos custos dos investimentos. Hoje, ela não tem dinheiro nem capacidade para cumprir esse papel. Garanto que os dirigentes mais responsáveis da empresa apoiam a medida, que, por outro lado, permitiria dinamizar a exploração do pré-sal.
 
Soberania ameaçada? Invasão das transnacionais? Tudo delírio. A Petrobrás detém reservas equivalentes a 40 vezes sua produção anual! Mais ainda, a lei de 2010 permite que o Conselho Nacional de Política Energética entregue à empresa, sem licitação, áreas que considere estratégicas.Meu projeto não mexe nisso nem no regime de partilha.(Ou seja, se aparecer um Kuwait dentro ou fora do pré-sal o CNPE pode imediatamente entregá-lo à Petrobrás).
 
O propósito é ajudar a recuperação da Petrobrás e a dinamização da produção nacional de petróleo. Uma contribuição à melhora das expectativas sobre a economia brasileira, mas o Palácio do Planalto se opõe a ela.
 
A característica definidora de um governo ruim é não querer melhorar. O governo ruim se intoxica com a própria mediocridade. Vicia-se nela.
 
 
 
SENADOR DA REPÚBLICA, EX-PREFEITO E EX-GOVERNADOR DE SÃO PAULO
 

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