Estadão

Obras raras do Modernismo vão a leilão no Rio

Um pequeno livro que reflete sobre a guerra e a paz se destaca num leilão de obras modernistas no Rio. Anterior à Semana de Arte de São Paulo, Há uma Gota de Sangue em Cada Poema volta com destaque ao mercado de publicações raras com suas críticas aos governantes e aos militares.

O livro, editado em 1917, é assinado por um certo Mário Sobral, pseudônimo do escritor Mário de Andrade, que logo viria a ser o ícone do movimento de mudança na cultura brasileira. A lista de joias artísticas e literárias é formada ainda por catálogos originais de exposições de Tarsila do Amaral e clássicos do século 20.

A brochura da 1ª edição da obra de Mário ainda conserva a capa e a contracapa originais. Além de ser o primeiro livro do autor paulistano, o exemplar de 50 páginas ganhou status de raro por ter sido impresso no chamado "papel de guerra", um produto de pouca qualidade – a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) dificultou a importação de papel pelas gráficas. Assim, restaram poucos exemplares da coletânea de poemas, apenas aqueles que foram muito bem guardados ao longo do tempo.

O exemplar de Há uma Gota deve ser tão disputado ou, como arriscam especialistas, mais do que primeiras edições de livros conhecidos e influentes do Modernismo. Embora utilize técnicas tradicionais do poema, a obra de Mário de Andrade é tratada como um marco do processo de rupturas. Expõe a intensidade humana de um intelectual e, diferentemente de outros livros do período, adota abertamente um tema universal. O autor não faz rodeios ao criticar a adesão de setores internos do País ao belicismo, uma posição que remete aos dias atuais de guerra no continente europeu.

O pioneirismo do livro publicado quase cinco anos antes da Semana de 1922 está na obsessão de Mário de Andrade em fazer a reflexão do conflito externo, no caso a Primeira Guerra, com cores brasileiras, uma marca do movimento artístico que se consolidou anos depois.

<b>OUTRAS RARIDADES</b>

Entre os exemplares do leilão da Livraria Letra Viva, que ocorrerá no próximo sábado, 19, estão a 1ª edição do romance Macunaíma e a coletânea de poemas Pauliceia Desvairada – os dois livros de Mário são considerados obras-primas do Modernismo.

A capa de Pauliceia, com seus losangos coloridos, é uma das mais famosas da literatura brasileira e inspirou não apenas as artes gráficas, mas o mundo da moda e a arquitetura. Há ainda uma edição de luxo do romance sobre o mito amazônico editada pela Sociedade dos Cem Bibliófilos do Brasil, nos anos 1950.

<b>TARSILA</b>

O livreto Tarsila apresenta a mostra da artista modernista na Galerie Percier, em Paris, entre os dias 7 e 25 de junho de 1926. Um autorretrato da pintora foi colado na capa e o desenho de um saci estilizado aparece impresso na contracapa. Já numa folha em branco interna há um desenho a lápis de três mulheres, com roupas características da década de 1920, fumando e bebendo. Numa outra folha foram feitos esboços de detalhes de cabeças e braços que, aparentemente, serviram de base ao processo de criação do desenho principal. A autoria das ilustrações ainda não foi analisada.

O livreto Tarsila-Rio-1929, também com o autorretrato da pintora na capa, indica que a exposição no Palace Hotel, no Rio, entre 20 e 30 de julho, foi a primeira realizada por ela no País – São Paulo não era o único cenário da escolha dos principais nomes do Modernismo para exibir sua arte.

A lista de obras raras do leilão conta ainda com dois exemplares originais da Klaxon, revista mensal que divulgava o movimento modernista. O número 2, de junho de 1922, expõe um curioso desenho intitulado Guaraná Espumante, a "obsessão do sábio". Por sua vez, o 4, de agosto do mesmo ano, anuncia que a coletânea de poemas Pauliceia Desvairada estava à venda nas livrarias.

A revista tinha entre seus colaboradores o próprio Mário, além de Oswald de Andrade, Sérgio Milliet, Sérgio Buarque de Holanda, Rubens Borba de Moraes, Luís Aranha e Guilherme de Figueiredo.

As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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