Nome fundamental do cinema brasileiro dos últimos 60 anos, a família Barreto embarca agora em uma nova empreitada: o cinema de animação. Com a criação da empresa Amazonika SA, voltada para projetos em defesa do meio ambiente, da Amazônia e da sustentabilidade, Luiz Carlos, Lucy, Paula e Bruno Barreto – entre outros membros da família e parceiros de longa data – querem finalmente elevar o Brasil ao patamar da animação global e mitigar a forte migração de animadores brasileiros que precisam sair do País para trabalhar em projetos mais ambiciosos.
O mercado de animação mundial tinha expectativas de atingir US$ 270 bilhões em 2020: no Brasil, o mercado independente já é forte – vide a indicação de O Menino e o Mundo, de Alê Abreu, para o Oscar em 2016, e a forte presença de filmes nacionais em festivais de cinema – mas grandes investimentos ainda são raridade por aqui. A nova empresa foi montada para preencher essa lacuna.
O projeto da animação – intitulada Amazonika – ainda está em fase inicial de desenvolvimento, na chamada "bíblia", que envolve argumento, roteiro, pranchas de artes, descrição dos personagens, arco dramático do filme e um teaser de um minuto, entre outras especificações técnicas. Com a bíblia em mãos, a produtora pode negociar com estúdios e distribuidoras, mantendo controle criativo. Só essa etapa deve custar cerca de US$ 2 milhões – a produção total tem uma previsão de US$ 60 milhões. Segundo uma estimativa da empresa, o processo de captação vai até agosto de 2021, depois a negociação com estúdios e produtoras parceiras segue até dezembro de 2022, o acerto dos direitos de distribuição até julho de 2023, e a produção em si começaria no segundo semestre de 2023.
"Fundamos a empresa Amazonika SA para montar esse projeto, viabilizar financeiramente", explica o produtor Luiz Carlos Barreto, de 92 anos. "O trabalho de pesquisa já foi todo concluído. O argumento está sendo desenvolvido por uma pessoa indicada pelo Carlos Saldanha. Quando levamos o projeto a ele em Connecticut, ele disse que era uma ideia muito melhor que a Era do Gelo. Temos potencial para uma sequência de cinco ou seis filmes. Uma franquia."
O projeto pretende contar a história da origem da Floresta Amazônica, milhões de anos atrás. Segundo Barreto, ele vai utilizar uma teoria muito difundida por Jorge Mautner, de que a Floresta era um imenso cerrado e que, após cataclismos que geraram chuvas intermináveis, se desenvolveu na maior floresta tropical do mundo. "Essa história nos atraiu muito, porque era uma versão sobre a Amazônia que até hoje não se tem muito conhecimento", explica. "Não tínhamos como fazer documentário ou filme, só seria possível numa linguagem de animação."
Com a ideia, foi desenhado um plano de negócios e a produtora buscou parcerias com grupos na Europa e nos EUA. A ideia é fazer associações não apenas para a produção, mas também para a distribuição. "Queremos distribuir em nível mundial", diz Barreto.
Outras ideias rondam a empresa. Uma delas é a criação de um espaço criativo para animadores no Brasil, um estúdio. "O maior desafio é colocar o projeto de pé", diz Paula Barreto, presidente da Amazonika SA. "O empresariado brasileiro ainda não tem referências, é complicado eles entenderem que o projeto não visa um filme único, mas, sim, uma estrutura para animação. Vamos convencer investidores de que existe um mercado. Essa estrutura vai servir para tudo: vídeos educacionais, institucionais, publicidade. Vamos promover treinamentos em laboratórios 3D. Um parque temático pode ser um caminho também." Paula diz que as piores previsões de faturamento futuro já são muito boas. "As animações aceitam dublagem em todo canto, tem esse potencial."
A empresa ainda tem outros dois projetos em desenvolvimento: uma série documental sobre os biomas brasileiros, em parceria com o Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ), e um outro filme, Icamiaba, a ser dirigido por Julia Barreto.
Com o cinema e o meio ambiente em xeque pelas políticas públicas do governo federal, os Barretos não desanimam. "Todo governo é passageiro", diz Luiz Carlos. "Esse governo, que não tem nenhuma tendência a não ser de destruição, não nos impede de continuar pensando e colocando o imaginário acima do clima atual. Como dizia o (arquiteto e urbanista) Lúcio Costa, o Brasil é grande e não tem nenhuma vocação para a mediocridade. Esse projeto está dentro desse pensamento. Ele se sustenta na grandiosidade do Brasil." As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>