Os planos do CTC para ser a Monsanto da cana

Uma das maiores referências no desenvolvimento de variedades de cana-de-açúcar mais produtivas e eficientes, o Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) traçou planos ambiciosos para promover sua expansão no País. Nos laboratórios da companhia, em Piracicaba (SP), cientistas desenvolvem variedades de matérias-primas geneticamente modificadas e trabalham em um projeto ainda maior: criar sementes artificiais de cana, que prometem revolucionar o plantio do setor sucroalcooleiro.

Com a aposta em biotecnologia, o CTC planeja abrir seu capital na B3, Bolsa paulista, e também na Nasdaq, nos Estados Unidos. A companhia brasileira de pesquisa quer ser vendida aos investidores em Nova York como "a Monsanto da cana" – multinacional de agricultura e biotecnologia controlada pela alemã Bayer.

Criada em 1969 pelo grupo de usinas da Copersucar, a companhia passou quase 40 anos com foco em melhoria da produtividade dos canaviais, mas sem fazer grandes avanços em biotecnologia.

Foi a entrada de novos sócios, a partir de 2004, que permitiu à companhia de pesquisa traçar uma estratégia mais estruturada para todo o setor. Hoje, entre os principais acionistas estão a Raízen (joint venture entre Cosan e Shell), com 20% de fatia, e o braço de participações do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDESPar), com 18,9%. A Copersucar tem 26% do negócio.

"Quando cheguei aqui, em outubro de 2011, a cana-de-açúcar já estava atrasada há pelo menos 20 anos. Então, decidimos virar o botão", diz Gustavo Leite, presidente do CTC. Antes, o executivo tinha comandado a Monsanto no Canadá e no Brasil, quando a canola e a soja transgênicas foram lançadas.

<b>Sobrevivência</b>

A mudança de estratégia da empresa de pesquisa brasileira foi vital para garantir a sobrevivência do centro de pesquisa. De 2017 para cá, a companhia já lançou duas variedades transgênicas de cana resistentes à broca, umas das principais pragas que afetam os canaviais e causam prejuízos anuais de R$ 5 bilhões às usinas. O próximo passo será uma combinação de variedades resistentes à broca e também tolerantes a herbicidas. A segunda onda prevê o lançamento de uma variedade resistente ao bicudo, praga que "come" outros R$ 4 bilhões das usinas por ano.

Mais do que perda de receita, as principais pragas do setor – broca e bicudo – afetam duramente a produtividade dos canaviais. Até então, o controle é feito no "olhômetro": funcionários de usinas andam pelos canaviais e tentam detectar canas "doentes" – as variedades atacadas apresentam furinhos em seus gomos. Os defensivos agrícolas ajudam nesse combate, mas não são totalmente eficientes.

Com a nova estratégia, a empresa pôde começar a cobrar royalties pelo uso das variedades desenvolvidas. De 2012 até agora, foi injetado cerca de R$ 1 bilhão em pesquisas. Em 2014, quando o BNDESPar entrou na sociedade, o CTC firmou o compromisso de fazer sua listagem como companhia aberta na B3, operação feita em 2016, e de negociar suas ações em Bolsa (IPO, inglês) até 2023. Esse processo deverá ser antecipado. Leite já conversa com bancos e pretende ir à Bolsa até 2021.

Maior produtor global de cana, com uma produção anual média de 650 milhões de toneladas e faturamento de R$ 100 bilhões, o Brasil não está no radar das grandes multinacionais por não ter uma escala mundial, como é o caso da soja e do milho.

Ao contrário de outras importantes culturas de grãos, que tomaram conta de quase todas as lavouras do mundo por seu ganho de produtividade, redução no uso de agrotóxico e no impacto ambiental, a cana geneticamente modificada é produzida em pequena escala no País, mas tem grande potencial para crescer. A expectativa é chegar ao fim da safra 2020/21 com área plantada de 50 mil hectares, de um total de 9,2 milhões hectares em todo País.

<b>Revolução nos canaviais</b>

Em paralelo ao desenvolvimento das variedades transgênicas, cientistas do CTC estão debruçados em seu projeto mais ambicioso: a semente artificial de cana, que promete mudar a forma de se plantar a matéria-prima que chegou há 500 anos no Brasil pelas mãos do português Martim Afonso de Souza.

A empresa está reproduzindo em seu laboratório de Piracicaba milhões de embriões que vão dar origem à semente perfeita: resistente a pragas e tolerante a herbicidas. "Será uma revolução nos canaviais", afirma Plinio Nastari, presidente da consultoria Datagro, especializada no setor sucroalcooleiro. "O ciclo de vida da cana, que hoje é de cinco anos, pode cair para três a quatro anos."

Nesses últimos séculos, o plantio de cana é praticamente o mesmo: pedaços de cana são jogados na terra para se reproduzirem. Escondidos a sete chaves, vários protótipos de sementes já estão sendo testados no CTC. O que se sabe é que a semente será muito menor do que os toletes jogados na terra. O plantio da cana artificial não será feito na horizontal, como é feito hoje, e sim na vertical.

Hoje, para plantar um hectare de cana são usados de 15 a 20 toneladas da matéria-prima. Com a semente, essa proporção cai para 300 quilos, explica Leite. Além da melhoria da produtividade, o sistema de plantio vai mudar com máquinas mais adequadas – as atuais compactam o solo.

A expectativa é que essas sementes sejam comercializadas a partir de 2024. Com o projeto em pé, será preciso fazer pesados investimentos na construção de fábricas para replicar essas sementes pelo País. "Não é barato. Por isso, os planos da companhia de levantar recursos na Bolsa."

<b>Sem concorrente</b>

"Não temos nada parecido no Brasil e no mundo. Somos o único. O potencial para atrair investidores para comprar nossas ações é enorme", diz. Para ele, o que o CTC desenvolve para a cana é comparável ao que a Monsanto faz com os grãos. A única concorrente do CTC no País foi a CanaVialis, criada em 2003 por cientistas brasileiros que participaram do sequenciamento do genoma da cana e tinham o grupo Votorantim como principal investidor. O negócio chamou a atenção da Monsanto, que comprou a empresa em 2008. Sete anos depois, a multinacional decidiu sair do setor de cana e encerrou as atividades da companhia no País. As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

Posso ajudar?