Os fundos de pensão foram pegos no contrapé pelo coronavírus. Com patrimônio equivalente a 13% do PIB e pagamentos anuais de R$ 60 bilhões aos participantes, eles vinham reduzindo seus déficits, que, no agregado, passaram de R$ 76 milhões, em 2015, para R$ 26 milhões em 2019. Com a queda na Bolsa – o Ibovespa já recuou 26% no acumulado deste ano -, o sinal de alerta volta a acender no setor.
Maior fundo de pensão do País, o Previ, dos funcionários do Banco do Brasil, teve retorno negativo de 12,4% em um de seus planos no primeiro trimestre, com déficit de R$ 23,6 bilhões. Em entrevista recente ao Estadão, o diretor de investimentos do fundo, Marcelo Wagner, admitiu a possibilidade de fechar o ano sem bater a meta de rentabilidade. "É possível que isso aconteça com todo o segmento (de fundos)", disse.
No Postalis, dos Correios, dos dois planos de previdência um não conseguiu bater a meta de rentabilidade nos quatro primeiros meses do ano. Nesse período, o plano deveria ter apresentado rentabilidade de 1,85%, mas o número ficou em -2,4%.
O diretor de investimentos do fundo, Alexandre Miguel, diz, porém, que "não está no radar" ficar aquém da meta anual. "Março foi traumático para quem está na Bolsa, mas, se houver uma estabilização nesse cenário de notícias mais animadoras vindas do exterior, com a economia reabrindo, nossos dois planos devem bater a meta."
Na Petros, dos empregados da Petrobrás, os três maiores planos registraram a pior rentabilidade do setor no trimestre, entre -13,3% e -15,3%. A meta variava de 1,61% a 1,83%. Em nota, o fundo afirmou que fez mudanças em seu portfólio e que deve conseguir superar as metas em abril e maio. Destacou ainda que "investimentos de planos de previdência devem ser observados sob a ótica de longo prazo".
<b>Aportes</b>
Se não revertidos, os déficits podem fazer com que alguns planos tenham de exigir aportes extras de seus participantes, como ocorreu nos anos 2010. O presidente da Associação Nacional dos Participantes de Fundos de Pensão e dos Beneficiários de Saúde Suplementar de Autogestão (Anapar), Antonio Bráulio de Carvalho, prepara algumas propostas para levar ao governo. Na modalidade de benefício definido, em que o valor a ser recebido pelo aposentado é estabelecido em regulamento, a sugestão é que, se houver a necessidade de equacionar o déficit, o ajuste seja aplicado apenas em 2023. Pela lei, os ajustes têm de ser feitos anualmente para assegurar o valor do benefício. Nesses casos, os trabalhadores na ativa precisam contribuir com valores mais elevados e o benefício dos aposentados reduz.
"Muitos contribuintes ainda estão pagando contribuições extras de anos anteriores. Então, excepcionalmente, estamos pedindo para que os resultados de 2019, 2020 e 2021 sejam aplicados apenas em 2023", diz ele.
Na modalidade de contribuição definida, em que as cotas são corrigidas mensalmente e o valor a receber no futuro dependente do montante acumulado, a proposta é aplicar apenas 50% do prejuízo agora. O restante seria aplicado apenas quando a economia voltasse a se recuperar.
Segundo o superintendente da Previc, Lucio Rodrigues Capelletto, os impactos da pandemia foram "significativos" nos fundos de pensão, mas todos têm capacidade para pagar as obrigações nos próximos 18 meses. Para Luis Ricardo Martins, da Abrapp, também é cedo para falar em equacionamento. "É preciso lembrar que estamos vivendo uma crise conjuntural. Em crises anteriores, a recuperação foi rápida."
<b>Queda de juros empurra planos para ações</b>
Antes da pandemia, os fundos de pensão tinham iniciado um movimento de diversificação dos investimentos em Bolsa para compensar a queda dos juros e cumprir as metas de rentabilidade.
Segundo dados da Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp), até novembro de 2019 (último dado disponível) a renda fixa representava 73,5% dos ativos dos fundos e os investimentos em ações, 18%. Naquele mês, com os juros em queda, a rentabilidade dos investimentos ficou negativo em 0,15%, enquanto a renda variável (ações) ficou positiva em 0,5%. O resultado era um indicativo de que as carteiras precisavam apostar em ativos de maior risco.
"O sistema estava iniciando um movimento para aumentar o risco de seus investimentos e cumprir as metas atuariais", diz o presidente da Abrapp, Luis Ricardo Martins. Esse movimento vinha num crescente tão grande que os fundos de pensão estavam ocupando espaço até então dos investidores estrangeiros na Bolsa, acrescenta o economista José Roberto Afonso.
O entrave agora é que a Bolsa despencou com a crise do coronavírus, ainda que haja indícios de recuperação. Enquanto isso, os investimentos conservadores – como títulos do Tesouro – estão com rentabilidade baixa. Eles são atrelados à Selic, que está em 3%, menor nível da história.
"Os ativos precisam crescer numa taxa semelhante ao atuarial. Sem esse equilíbrio, os fundos têm de mudar suas estratégias", diz professor da FEA/USP José Roberto Savoia, ex-secretário de Previdência Complementar. Diretor de investimentos do Postalis, Alexandre Miguel diz que, antes da pandemia, os investimentos em títulos públicos já não batiam a meta. "Víamos a necessidade de tomar mais risco." As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>