Estadão

Papa me disse que eu deveria continuar a receber a comunhão, diz Biden

Face a face no Vaticano, o presidente Joe Biden manteve conversas extensas e pessoais com o papa Francisco nesta sexta-feira, 29. Biden disse ter ouvido do pontífice que ele era um "bom católico" e deveria continuar comungando, embora os conservadores estejam pedindo que o sacramento seja negado ao democrata porque seu apoio aos direitos ao aborto contradiz os ensinamentos da Igreja.

Os dois católicos romanos mais proeminentes do mundo ultrapassaram o tempo em suas discussões sobre mudança climática, pobreza e a pandemia do coronavírus, uma conversa calorosa que também tocou na morte, em 2015, do filho do presidente, Beau, aos 46 anos, de câncer. Os dois também fizeram piadas sobre envelhecer bem.

Biden disse que o tema do aborto não apareceu na reunião. "Acabamos de falar sobre o fato de ele estar feliz por eu ser um bom católico e eu continuar recebendo a comunhão", disse Biden. O apoio do presidente aos direitos ao aborto e ao casamento entre pessoas do mesmo sexo o colocou em conflito com muitos bispos dos EUA, alguns dos quais sugeriram que ele deveria ter a comunhão negada.

Um vídeo divulgado pelo Vaticano mostrou vários momentos calorosos e relaxados entre Francisco e Biden, enquanto eles apertavam as mãos e sorriam repetidamente. Francisco costuma ter uma aparência severa, especialmente em fotos oficiais, mas ele parecia bem relaxado nesta sexta-feira.

A reunião privada durou cerca de 75 minutos, segundo o Vaticano, mais do que o dobro da duração normal de uma audiência com o pontífice. Os dois se sentaram frente a frente em uma escrivaninha na biblioteca papal, acompanhados por um tradutor. Depois, trocaram presentes e fizeram uma reunião mais ampla, que incluiu a primeira-dama e altos funcionários. A sessão deixou Biden mais de uma hora atrasado em sua agenda.

"Biden agradeceu a Sua Santidade por sua defesa dos pobres do mundo e pelos que sofrem de fome, conflito e perseguição", disse a Casa Branca. "Ele elogiou a liderança do papa Francisco na luta contra a crise climática, bem como sua luta para garantir o fim da pandemia para todos por meio do compartilhamento de vacinas e de uma recuperação econômica global equitativa."

Biden se orgulha de sua fé católica, usando-a como um guia moral para moldar suas políticas sociais e econômicas. Ele usa um rosário e vai à missa semanalmente. Depois de deixar o Vaticano, Biden disse que teve uma reunião "maravilhosa" e que o papa orou por ele e abençoou seu rosário. Ele disse que a oração era sobre "paz".

<b> MARIDO DE JILL </b>

Uma dúzia de guardas suíços em seus uniformes listrados de azul e dourado ficaram em posição de sentido no pátio de San Damaso quando Biden e sua mulher, Jill, chegaram. Eles foram recebidos pelo monsenhor Leonardo Sapienza, que dirige a casa papal, e então cumprimentou um a um os porteiros papais, ou cavalheiros papais, que se enfileiraram no pátio.

"É bom estar de volta", disse Biden enquanto apertava a mão de um deles. "Sou o marido de Jill", disse ele a outro antes de ser conduzido ao Palácio Apostólico com afrescos e levado para a biblioteca particular do papa.

De acordo com o Vaticano, Biden presenteou Francisco com uma vestimenta litúrgica, feita em 1930 pelo famoso alfaiate papal Gammarelli e usada pela ordem jesuíta do papa nos EUA, onde estava guardada nos arquivos da Igreja da Santíssima Trindade, a paróquia que Biden frequenta regularmente em Washington. A Casa Branca disse que faria uma doação para instituições de caridade em nome do papa.

Biden também colocou o que é conhecido como moeda-desafio na palma da mão do papa durante um aperto de mão e saudou Francisco como "o mais importante guerreiro pela paz" que já conheceu. A moeda personalizada representa o berço político de Biden, Delaware, e uma referência à unidade militar de seu falecido filho Beau. Biden disse a Francisco que Beau gostaria que ele apresentasse a moeda ao papa.

"A tradição é diz que, e estou apenas brincando sobre isso, da próxima vez que te ver, se você não tiver, você terá de comprar as bebidas", disse Biden, referindo-se à moeda. Ele acrescentou: "Sou o único irlandês que você conheceu que nunca bebeu". Francisco riu e respondeu: "Os irlandeses trouxeram uísque".

Biden, de 78 anos, também contou a história do jogador de beisebol americano Satchel Paige, um arremessador negro que jogou até os 50 anos, em uma parábola sobre o envelhecimento. "Quantos anos você teria se não soubesse quantos anos você tem?", disse Biden, citando Paige. "Você tem 65 anos, eu tenho 60", acrescentou Biden, enquanto Francisco, de 84, apontava para sua cabeça e ria.

Francisco presenteou Biden com um azulejo de cerâmica representando a iconografia do peregrino, bem como uma coleção dos principais documentos de ensino do papa. No vídeo do Vaticano, ele podia ser ouvido pedindo a Jill Biden para que "orasse por ele".

<b>FAMÍLIA TRUMP É RECEBIDA PELO PAPA FRANCISCO</b>

O encontro caloroso contrastou fortemente com o encontro de Donald Trump em 2017 com Francisco, com quem o ex-presidente teve um relacionamento espinhoso. Fotos daquela reunião de 30 minutos mostraram um Francisco com o rosto impassível ao lado de um sorridente Trump. A reunião de Biden também foi mais longa do que os 52 minutos que Barack Obama passou com Francisco em 2014.

Biden está visitando Roma e depois segue para Glasgow para cúpulas consecutivas, primeiro uma reunião com os líderes do Grupo dos 20 países líderes e em desenvolvimento e, em seguida, uma conferência climática global.

Biden e Francisco já se encontraram três vezes, mas o encontro desta sexta-feira foi o primeiro desde que o democrata tornou-se presidente.

O presidente americano também se reuniu separadamente com os anfitriões da cúpula do G-20, o presidente italiano, Sergio Mattarella, e o primeiro-ministro italiano, Mario Draghi. Ele terminou o dia com o presidente francês, Emmanuel Macron, com quem tentou novamente suavizar as relações depois que os EUA e o Reino Unido decidiram fornecer submarinos nucleares para a Austrália, fazendo a França perder um lucrativo contrato no processo.

A visita de Biden ao papa ocorreu no momento em que os bispos dos EUA se preparam para realizar sua convenção anual de outono (Hemisfério Norte) no próximo mês, em Baltimore. Em pauta, está um esforço dos conservadores para desqualificar Biden de receber a comunhão. A Conferência de Bispos Católicos dos Estados Unidos emitiu uma declaração após a reunião do Vaticano que não abordou comentário de Biden sobre a Comunhão.

Em vez disso, a declaração sugeria que o presidente não seria destacado em nenhum documento na reunião dos bispos no próximo mês. O documento "pretende falar sobre a beleza de encontrar Jesus Cristo na Eucaristia e é dirigido a todos os católicos", disse o comunicado. Francisco enfatizou que não rejeitará os líderes políticos que apoiam o direito ao aborto, embora a política católica permita que os bispos individuais escolham se querem evitar que as pessoas tomem a Comunhão. (FONTE: ASSOCIATED PRESS)

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