Na avaliação da crítica, Leviatã sai na frente na disputa pelo Oscar de filme estrangeiro. De fato, o representante russo é de alto impacto. Mas pode não ser assim. O forte estudo de Zyviagntsev sobre o Estado corrupto pode perfeitamente ser superado por outros concorrentes, e isso por uma excelente razão – a disputa na categoria filme em língua não-inglesa está particularmente acirrada este ano.
Kimbuktu, da Mauritânia, é tido, por quem já o viu, como um espanto, uma daquelas surpresas que o cinema reserva de tempos em tempos. Como fala da expansão do mundo islâmico, tema também de grande atualidade, pode vir a emplacar. Há também Tangerines, de Zaza Urushadze, que concorre pela Estônia. Trata, de maneira ficcional, sobre a disputa do território de Abkhazia, em 1992, após a dissolução do império soviético. De acordo com um dos membros da Academia de Hollywood, Tangerine traz reflexões sobre o absurdo da guerra em nível de A Grande Ilusão, o clássico de Jean Renoir. Só vendo para julgar se a comparação vale ou é apenas retórica vazia, pastel de vento.
Já o polonês Ida cava seu apelo no mundo do passado, mas com um tema considerado sempre contemporâneo pela Academia, o Holocausto. O fato é que Pawel Pawlikowski revisita esse assunto de maneira muito original e intensa. Ida é a noviça que, antes de receber as ordens do convento e isolar-se do mundo, sai com uma tia atrás da história da família. Essa busca é pretexto para um mergulho na história polonesa dos tempos da 2ª Guerra Mundial, os crimes do antissemitismo e do colaboracionismo, revisitados sob a perspectiva dos anos 1960, sob o governo comunista de viés stalinista. Ida fala, portanto, do nazismo (anos 1940), do stalinismo (anos 1950-60), e do que toda essa carga pesada histórica legou à Polônia atual. Um belíssimo filme, sem dúvida, forte concorrente ao Oscar.
Talvez correndo por fora, e na condição de azarão, esteja o argentino Relatos Selvagens, de Damian Szifron, brilhante filme de episódios, talvez um tanto irregular. Relatos tem sido muito elogiado no Brasil, em especial pela maneira aguda de tratar a tensão social do país sob formato pop, de diálogo fácil com o público. É verdade. O longa abre com um episódio arrasador, conciso e de desfecho bombástico. Outros caem no facilitário, como o da briga de trânsito flertando com o trash. No todo, é muito bom, mas talvez lhe falte estofo suficiente para dar aos hermanos a terceira estatueta da Academia nesta categoria (as duas vitórias anteriores são de A História Oficial, de Luis Puenzo, e O Segredo dos seus Olhos, de Juan José Campanella).
O Brasil desejava competir nessa categoria de pesos pesados com Hoje em Quero Voltar Sozinho que, obviamente, não ficou entre os finalistas. Sabe de nada, inocente.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.