O pai da foto era um mineiro europeu, do início do século XX? É o que parecem indicar suas roupas enegrecidas, talvez pela poeira que recobria os corpos dos trabalhadores naqueles locais subterrâneos.
A outra pergunta que inevitavelmente suscita a imagem é: quem a registrou? Do fotógrafo, porém, infelizmente, só se podem conhecer o talento e a sensibilidade revelados na captação daquela cena familiar. Centrada não na pobreza gritante do seu ambiente. Mas, no cuidado amoroso do pai dedicado, concentradamente, na filha mais nova que ele alimenta. Mas que, claramente, se estende também aos outros dois filhos – relevam as expressões faciais tranquilas deles.
Isto significa que foi o amor paterno, na sua maravilhosa vitória sobre a pobreza material, que a lente do fotografo mirou.
Hoje, este desconhecido artista visual contribui para que brasileiros enxerguem uma dimensão do papel do pai. Obscurecida no debate que eclodiu na atual – e tão atormentada – campanha eleitoral presidencial. Graças ao discurso pronunciado, há poucos dias, por um candidato à vice-presidência, diante de público de empresários. No qual o candidato sustentou uma inusitada visão da formação moral dos filhos em famílias privadas da presença do pai – e do avô. Portanto, assistidas apenas pela mãe – ou pela avó. Tais famílias, disse ele, se tornam fábricas de desajustados tendentes a integrarem-se em quadrilhas de traficantes.
Com a desqualificação da importância das mães e avós na educação das crianças e jovens, como era previsível, ele atingiu, de modo imediato e desastrado – para quem precisa de votos – 53% do eleitorado, composto por mulheres. Que, naturalmente, reagiram com veemência e indignação justa.
No entanto, a visão que o candidato tem da influência familiar nos filhos também diminui a relevância do pai, embora à primeira vista pareça valorizá-lo. Pois reduz seu papel ao de um disciplinador dos filhos, que, segundo o candidato, capaz de evitar o desajustamento social deles. Talvez o candidato pense assim por ter passado a maior parte de sua vida, em quartéis – já que é militar. Nos quais terá visto muitas vezes jovens recrutas sendo adaptados às Forças Armadas, por cabos e recrutas, através do aprendizado da obediência cega às ordens de superiores. Ocorre, contudo, que este tipo de ajustamento social não corresponde à serventia verdadeira de um pai. A quem compete, acima de tudo, fazer seus dependentes felizes. E isto, eventualmente, pode importar até em respeitar, neles, alguma tendência natural e saudável para o confronto com hierarquias sociais caducas ou injustas. Sem a preservação desta inclinação não existiriam artistas e inventores que fazem o gênero humano evoluir exatamente porque são “desajustados” à ordem social preexistente a eles. Em resumo: pai – como mãe, avó e avô – servem apenas para dar amor aos seus descendentes. Como, aquele que, com certeza, sentem os filhos do homem sujo e esfarrapado da foto antiga.