Estadão

País se viciou em resolver a gestão com leis e PECs

Um dos pais da Lei de Responsabilidade Fiscal, o economista José Roberto Afonso avalia que o País "parece viciado" em resolver seus problemas de administração por meio de leis e Propostas de Emendas à Constituição (PECs). Um dos principais especialistas em contas públicas, Afonso hoje reside em Lisboa, de onde acompanha com apreensão o debate fiscal – "limitado e interditado" – no Brasil.

"É um momento oportuno para mudanças de paradigmas e de regras fiscais", diz. "O Brasil está um pouco desconectado dessa discussão mundial."

Como fundador do Fórum de Integração Brasil-Europa (Fibe), que será lançado hoje, Afonso pretende conectar o País a países lusófonos e nações europeias. "Insisto em alertar que teorias, políticas e práticas, não só fiscais, como também econômicas e sociais, estão mudando, de forma súbita e profunda em todo o mundo. O Brasil precisa conhecer e participar mais dessa revisão, e o Fibe se propõe a ajudar."

<b>Como o senhor vê a situação das contas públicas brasileiras atualmente, com toda essa questão da PEC dos precatórios?</b>

Precatório, como diz o próprio nome, é dívida. O gasto já foi realizado no passado. Esse imbróglio, na origem, tem mais a ver com questões gerenciais do que deveria ser com as legais. O Brasil parece viciado em tentar resolver problemas de gestão com leis e emendas constitucionais, e depois se reclama de um ativismo parlamentar e judicial.

<b>O senhor é favorável ao teto de gastos de forma ortodoxa ou acredita que o sistema possa ser mais "flexível"?</b>

Parece-me que o debate fiscal no Brasil está muito limitado e interditado. É um momento oportuno para mudanças de paradigmas e de regras fiscais. O Brasil está um pouco desconectado dessa discussão mundial, que está voltada para o futuro das finanças públicas, como no restante da economia e da sociedade.

<b>Como senhor citou, o endividamento aumentou em todo o mundo durante a pandemia. O senhor acredita que esse também será um tema para os formuladores de políticas nos próximos anos?</b>

Certamente. Agora, é bom pontuar que o contexto histórico, econômico e social mudou radicalmente. A dívida pública disparou em todo o mundo, mas suas taxas de juros nunca foram tão baixas. De novo, o Brasil é um pouco exceção à regra. Insisto em alertar que teorias, políticas e práticas não só fiscais, como econômicas e sociais, estão mudando, de forma súbita e profunda em todo o mundo. O Brasil precisa conhecer e participar mais dessa revisão, e o Fibe se propõe a ajudar.

<b>O senhor é o fundador do Fibe. O que é exatamente essa instituição?</b>

É uma associação cultural que nasce com o propósito de promover a integração econômica e social entre o Brasil e países da Europa, usando Portugal como porta de entrada, bem como os demais países lusófonos do mundo. Será um espaço para debates e estudos, com visão multidisciplinar, que visa a contribuir para conectar o Brasil aos novos ventos que sopram mundo afora depois da pandemia e da revolução digital. Se buscará, sobretudo, que o diálogo aconteça de forma permanente, responsável e conectado com o mundo, fora do ambiente polarizado.

<b>O senhor se mudou para Portugal, mas é tido como um dos maiores especialistas em contas públicas do Brasil. O Fibe abordará temas relacionados à área fiscal e trabalhará também em outras áreas, é isso?</b>

Cultura, artes, tecnologia, novas relações econômicas e sociais são temas que concentrarão as atenções do Fibe. Será multidisciplinar. Matérias como tributação e finanças públicas interessam também, mas serão tratadas dentro do contexto de mudanças estruturais que marcam suas instituições e suas políticas, como em outras matérias. Os desafios impostos pelo mundo pós-pandemia, cada vez mais globalizado e digital, despertarão a atenção, desde o evento de largada da associação entre os dias 12 e 14 de novembro, aqui em Lisboa.

As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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