Patrícia Melo sempre resistiu ser considerada autora de literatura policial – sua obra, na verdade, apesar de pinceladas criminais, até pode ser classificada como de suspense. Com o lançamento de Fogo-Fátuo (Rocco), porém, seu décimo livro, ela já aceita a nova alcunha. “Agora posso dizer que escrevi um romance policial come il fault, ou seja, inserido na clássica escola americana, com detetive, crime, assassino e, como pano de fundo, um retrato da violência das grandes cidades.”
Fogo-Fátuo tem como protagonista Azucena, a bela chefe do setor de perícias da Central Paulista de Homicídios. Filha de um delegado aposentado, que é amante de ópera (daí a origem de seu nome), ela é um oásis em meio a uma corporação corrupta e decadente – além da falta de pessoal e de viaturas, o departamento é suspeito de mascarar boletins de ocorrência, o que dificulta as investigações.
Em um momento em que o índice de crimes na cidade atinge um número alarmante – o que desperta crítica constante da imprensa -, Azucena é incumbida de investigar a morte de Fábbio Cássio, belo ator que estoura os miolos na última cena de uma peça de teatro: o revólver carregava balas de verdade e não de festim.
Aos poucos, a hipótese de suicídio é trocada pela de assassinato, surgindo suspeitos como Cayanne, namorada de Fábbio, alpinista social, aspirante a celebridade, participante de reality show. “Ao lidar com o caso, Azucena descortina uma faixa cruel da sociedade, que trata a morte como espetáculo e não diferencia fama e infâmia”, conta Patrícia, que planejava escrever a trama desde que publicou Acqua Toffana, em 1994.
O tempo em que o projeto permaneceu na gaveta certamente facilitou o endurecimento da escrita – Fogo-Fátuo traz lirismo em vigas mestras, e harmonia em canos enferrujados. Os personagens, em sua grande maioria, são movidos por ganâncias, que ganham enormes proporções quando retratadas pela imprensa marrom.
Azucena, nesse caso, assemelha-se a grandes detetives da literatura, como Philip Marlowe (de Raymond Chandler) e Sam Spade (de Dashiell Hammett), ou seja, profissionais íntegros e incorruptíveis. “E, como eles, ela tem uma vida pessoal caótica, especialmente quando é obrigada a se separar de um marido que, depois, se volta contra ela”, explica.
A construção do personagem é um dos trunfos do romance. Patrícia apresenta os motivos: “ela acredita que o silêncio dos mortos é apenas uma linguagem, com sintaxe e semântica próprias, como o inglês ou a música. Quando aceitou, na juventude, a sugestão do pai de cursar biologia, e mais tarde, ao se especializar em criminologia e prestar concurso para entrar na polícia técnica, o que tinha em mente era isso, entender aquele idioma”.
O título do romance faz alusão ao livro do mesmo nome do escritor colaboracionista francês Drieu de la Rochelle (1893-1945), obra que inspirou o filme Trinta Anos Esta Noite, de Louis Malle. “Tanto a obra como o longa me incentivaram a escrever o meu Fogo-Fátuo”, conta Patrícia que, ao mesmo tempo em que produzia sua história, desenvolvia uma nova arte: a pintura. A própria capa de Fogo-Fátuo traz um de seus desenhos. “É algo misterioso, que parece um quebra-cabeça.” Nesta quinta-feira, 12, durante o lançamento, os fãs poderão apreciar outras pinturas, que estarão expostas. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.