Polícia

Patrulha Maria da Penha já prendeu 26 pessoas em Guarulhos

A Patrulha Maria da Penha completa quatro anos de existência nesta sexta-feira (5), um serviço da Guarda Civil Municipal (GCM) de Guarulhos que presta assistência e monitora mais de 200 mulheres que sofreram violência doméstica, além de fiscalizar o cumprimento de medidas judiciais que determinam que seus agressores mantenham-se afastados das vítimas. Flávia e Joana (nomes fictícios) fazem parte dessa estatística. Sobreviventes de tentativas de feminicídio, ambas denunciaram os ex-maridos e hoje recebem proteção e apoio do programa.

O aniversário do patrulhamento coincide com os 16 anos da Lei Maria da Penha, que busca combater não somente as estatísticas, mas também o agravamento da dor e dos traumas causados pela violência de gênero às vítimas e a suas famílias. “Eu falo que são anjos, é uma equipe incrível”, diz Flávia em referência à patrulha, que a acompanha desde o início das atitudes de seu ex-marido e chegou a prendê-lo ao flagrá-lo perseguindo-a.

Ao todo 26 agressores já foram presos por se aproximarem das vítimas após decisão judicial que determinou que mantivessem distância. Ao longo dos anos o serviço já realizou quase 9 mil fiscalizações de medidas protetivas, que consistem em visitas às residências dessas mulheres e rondas por seus bairros.

Depois que Flávia se separou de seu agressor teve que lidar com a síndrome do pânico, que a acompanhou por um longo período. Até mesmo barulhos comuns e ruídos em casa eram gatilhos que a fazem temer pela própria vida. Foram 27 anos de espancamentos, abusos sexuais, ameaças de morte e privação do direito de ir e vir. “Eu não podia nem visitar a minha mãe”, relatou ela, que é profissional da saúde e precisou realizar os processos seletivos para empregar-se escondida do ex-companheiro.

A última agressão física ocorreu ao conquistar uma vaga de emprego, quando o criminoso a humilhou em seu local de trabalho na frente de seus colegas. De acordo com ela, foi nesse momento que estreitou sua relação com a GCM, que ela define como o primeiro órgão que realmente a ouviu, abraçou, acolheu e encorajou.

Essa história não é um caso isolado. No primeiro semestre deste ano foram registrados mais de 5,1 mil casos de violência contra a mulher em Guarulhos, entre lesões físicas, agressões psicológicas, estupros, assédios sexuais, calúnias e difamações. No país, o ciclo de violência doméstica tirou a vida de 3,8 mil pessoas em 2021.

Trabalho permanente

A GCM percorre semanalmente mais de 100 km por toda a cidade para garantir maior segurança às mulheres inseridas no programa e a suas famílias. O trajeto contempla todas as regiões, mas, de acordo com o Mapa da Violência contra as Mulheres da cidade, os bairros com os maiores índices de denúncias e flagrantes em 2022 foram Pimentas, Cumbica e Bonsucesso.

Outro ponto de parada da patrulha é a casa de Joana e sua filha. O ex-marido, inconformado com o divórcio e as denúncias registradas por ela, invadiu sua residência e a golpeou com três facadas que feriram gravemente a medula óssea, o pescoço e a coluna cervical. Atualmente ela vive sobre uma cama hospitalar adaptada para seu quarto.

Depois de dois meses de internação, seguida por dezenas de sessões de fisioterapia e exercícios em casa, Joana recobrou parte dos movimentos das mãos, do pescoço e dos pés. “Mesmo no hospital a Patrulha Maria da Penha me deu apoio. Estavam sempre comigo para me ajudar naquele momento”, relembrou a sobrevivente, que mantém a fé no seu processo de recuperação.

O ciúme é a justificativa mais utilizada pelos agressores, que manipulam as mulheres muito antes de iniciarem as agressões físicas. Hoje a lei compreende como violência doméstica também os abusos psicológicos, sexuais, patrimoniais e contra a moral. “O abuso começou logo no início da relação, mas eu não percebia. Para me arrumar, fazer cabelo ou unha, era sempre um briga. Eu tive que me demitir mais de cinco vezes por ciúmes dele. O objetivo era me fazer depender dele em tudo”, desabafou Joana.

Os guardas que atuam no serviço são capacitados em uma série de condutas, como escuta e orientação qualificada às vítimas, mediação de conflitos, aplicação da Lei Maria da Penha e demais serviços disponíveis para auxiliar no rompimento do ciclo de violência. O time já orientou mais de 500 pessoas que vivenciaram a violência doméstica. “É bom saber que existem pessoas que estão empenhadas em fazer um serviço por amor e comprometimento”, reforçou Flávia.

As mulheres violentadas por ex-maridos são a maioria nas visitas realizadas pela Guarda, mas há também fiscalização de medidas protetivas para filhas que foram abusadas sexualmente por seus pais, uma neta assediada por seu avô e uma mãe maltratada pelo filho.

Liberdade

Uma rotina tranquila era inimaginável para Flávia. Agora, livre do ciclo de violência, ela aproveita todas as oportunidades que lhe aparecem, seja para estudar, viajar, apaixonar-se novamente ou fazer amizades. “Eu renasci, não tinha noção de que uma vida assim existia”, disse. Criada sob ideais machistas, ela acreditava que estava condenada a um casamento que destruiu sua autoestima por quase três décadas. Ao ver os filhos sofrerem com a situação, apoiou-se em seu sentimento maternal para conseguir fazer a denúncia.

Joana pôde vestir no último Natal o vestido vermelho que havia comprado há cinco anos, além de passear com a filha sem preocupação. Ela relata colecionar histórias absurdas dos 15 anos em que esteve casada, mas, com o fim do relacionamento, retomou sua autoestima, a vaidade e tem fé em dias melhores.

“Temos que educar sobre violência já na infância para que os meninos cresçam sem praticar esse crime. Quantas vezes ouvi que ele mandava em mim?”, ressaltou Joana, que em seguida agradeceu, emocionada, à patrulha por acompanhá-la. “Muito obrigada por tudo, não tenho palavras para falar sobre o apoio recebido. Se não fossem vocês e a Lei Maria da Penha, que funciona muito bem, como estariam essas mulheres?”, ponderou.

Denúncias

Para denunciar ligue para a Central de Atendimento à Mulher (180) ou para a GCM pelo telefone 153. Para acompanhamento psicossocial e orientação jurídica, contate o Centro de Referência de Atendimento às Mulheres em Situação de Violência Doméstica em Guarulhos pelo telefone 2469-1001.

Solenidade marca os quatro anos da Patrulha Maria da Penha em Guarulhos

Uma plateia de mais de cem pessoas participou nesta sexta-feira (5) da solenidade em celebração ao 4º aniversário da Patrulha Maria da Penha e aos 16 anos da Lei Maria da Penha, promovida pela Prefeitura de Guarulhos no auditório do Paço Municipal, no Jardim Bom Clima. O prefeito Guti participou do evento, que apresentou também um balanço da atuação da administração municipal, por meio da Subsecretaria de Políticas para as Mulheres e da Secretaria para Assuntos para Segurança Pública (SASP).

“Quanto se protege a mulher, protege-se a família. A violência contra a mulher é uma violência brutal conta a sociedade. Tivemos alguns avanços, mas o ideal é que vivêssemos em paz no convívio familiar. Combater esse tipo de crime é necessário, porém o melhor é a mudança de comportamento. Devemos educar as crianças nas escolas para o respeito e a convivência em harmonia. Agradeço a toda a equipe que se dedica ao acolhimento nas Casas da Mulher Clara Maria e ao trabalho da Patrulha Maria da Penha”, destacou Guti.

A subsecretária de Políticas para Mulheres, Verinha Sousa, ressaltou a importância da denúncia de crimes e do envolvimento de toda a sociedade para combater a violência doméstica. “Devemos ter em mente que o silêncio não protege. Temos que denunciar, pois a lei existe para fazer nossos direitos enquanto mulher. O tratamento da violência contra a mulher vai muito além da questão de empoderamento feminino, autonomia da mulher e elevação da autoestima. Precisamos do empenho de todos. A população tem a obrigação de ajudar”, disse a gestora.

Por sua vez, o secretário de Direitos Humanos em exercício, Martinho Risso, lembrou a intersetorialidade entre a Subsecretaria de Políticas para as Mulheres e a Pasta para Assuntos de Segurança Pública. “É notável e muito importante o trabalho desenvolvido em parceria. Enquanto a subsecretaria faz um trabalho preventivo, a Patrulha Maria da Penha realiza vigilância ostensiva e repressiva. Já a lei deu o arcabouço jurídico que orienta o trabalho da polícia tendo em vista proteger a mulher das violências física, sexual, moral, psicológica, entre outras, e do preconceito de gênero”, afirmou Risso.

Marcio Pontes, secretário para Assuntos de Segurança Pública, falou da implantação da Patrulha Maria da Penha e apresentou dados recentes da atuação do serviço. “A importância da lei que criou a Patrulha é enorme para o município, que cresceu no combate à violência doméstica. Desde sua criação já foram contabilizadas 8.905 fiscalizações de medidas protetivas. Neste período, 223 vítimas foram inseridas no programa de proteção e 26 homens foram presos em flagrante por descumprimento de medidas judiciais”, revelou Pontes.

Na solenidade desta sexta-feira foram homenageados o secretário de Habitação, João Darcio, ex-secretário para Assuntos de Segurança Pública e responsável pela lei de criação da Patrulha Maria da Penha, e o atual gestor Marcio Pontes.

A solenidade contou com a participação da presidente do Conselho de Políticas para as Mulheres, Irene Araújo, da titular da Delegacia da Mulher, Luciana Lopes, da presidente da Associação Brasileira de Defesa da Mulher, da Infância e da Juventude (Asbrad), Dalila Figueiredo, da comandante regional da Inspetoria de Defesa da Mulher de São Paulo, Mary Roseane de Souza, do comandante do 15º BPM, o tenente-coronel Campos, da inspetora Darcy Feitosa, da Patrulha Maria da Penha, além de membros dos Legislativos estadual e municipal.

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