O projeto que prevê mais um penduricalho para elevar os salários de juízes, procuradores e promotores – um bônus automático de 5% nos vencimentos das categorias a cada cinco anos – avançou nesta quarta-feira, 17, no Senado com potencial de causar um impacto fiscal ainda maior. Originalmente, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Quinquênio apresentada pelo presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), contemplava as carreiras da magistratura e do Ministério Público. O texto aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, no entanto, estendeu o benefício para outros agentes públicos.
Estudo feito pelo Centro de Liderança Pública (CLP) considerando o pagamento do chamado quinquênio apenas para juízes, procuradores e promotores estimou um impacto anual de R$ 1,8 bilhão. Agora, com a inclusão de outras carreiras do serviço público na proposta chancelada na CCJ no Senado, o líder do governo na Casa, Jaques Wagner (PT-BA), disse que esse valor pode chegar a R$ 42 bilhões anuais.
"É um tsunami do ponto de vista das carreiras jurídicas. Isso vai ter impacto nos 26 Estados e no Distrito Federal. Não ficará restrito", afirmou o petista.
Relator da proposta, o senador Eduardo Gomes (PL-TO) acatou emendas para ampliar o bônus de 5% para integrantes da Advocacia Pública da União, Estados e Distrito Federal, membros da Defensoria Pública, delegados da Polícia Federal e ministros e conselheiros de Tribunais de Contas. "A gente precisa gastar melhor o dinheiro público e talvez gastar melhor seja gastar melhor com bons funcionários públicos", disse o relator. Ele, porém, não fez um cálculo do efeito que a "nova" PEC teria para os cofres públicos.
<b> Bomba </b>
"O que tenho aqui vindo da Fazenda é que, se o cenário de ampliação (da PEC) for maior, colocando Senado e outros Poderes, chegaríamos a um impacto de R$ 42 bilhões por ano", disse Wagner, ao defender a rejeição da proposta. "Quero só que os colegas entendam que bomba pode estar por vir com essa bem-intencionada PEC, que é para valorizar principalmente os tribunais superiores, que não têm tantos penduricalhos quanto outras carreiras do Judiciário."
O líder do governo disse ainda que o quinquênio é "a pior política de gestão de pessoal, porque não fala em meritocracia, é um aumento vegetativo da folha, independente do gestor, e não estimula a melhoria do serviço público prestado".
<b>Base</b>
Mesmo com as colocações do petista, boa parte da base de apoio do governo Lula votou a favor da proposta. Além do aval de Pacheco, a PEC também tem o apoio do presidente da CCJ, senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP).
Pacheco defende a PEC do Quinquênio sob o argumento de que ela corrige uma distorção na remuneração dos magistrados em início de carreira, que podem receber vencimentos superiores aos que se encontram no fim da jornada profissional. Para ele, o benefício contribui para a valorização do Judiciário e do Ministério Público e evita que bons magistrados troquem suas carreiras pela iniciativa privada.
"Queremos promotores e procuradores de Justiça que tenham independência funcional e que se dediquem inteiramente à defesa da ordem democrática. Então, precisamos proporcionar um ambiente atrativo ou perderemos profissionais altamente vocacionados para outras carreiras que remuneram melhor", diz Pacheco na justificativa da PEC.
O texto aprovado pela comissão seguiu para o plenário do Senado, onde é necessário o voto favorável de 49 dos 81 integrantes da Casa, em dois turnos. Passada essa etapa, a proposta será encaminhada para a Câmara, onde precisará ser avalizada por colegiados da Casa e também por 308 dos 513 deputados em plenário.
<b>Dupla</b>
A aprovação da PEC do Quinquênio na CCJ demonstrou a dependência do governo em relação à dupla formada por Pacheco e Alcolumbre, postulante ao comando do Senado. Foram 18 votos favoráveis à proposta e sete contrários. O governo sofreu defecções por todos os lados. PSD e União Brasil deram, cada um, quatro votos a favor da proposta. A influência direta de Pacheco e Alcolumbre refletiu no posicionamento não só nas bancadas de seus partidos, mas também em outras legendas, como o PL e o MDB.
O apelo feito pelo líder Jaques Wagner não surtiu efeito. Pelo menos quatro senadores considerados muito governistas (Veneziano Vital do Rêgo, do MDB, Omar Aziz e Angelo Coronel, do PSD, e Ana Paula Lobato, do PSB) votaram contra o pedido de Wagner. O único senador do PSD a rejeitar a PEC foi Otto Alencar (BA).
Por outro lado, o governo contou com o apoio de oposicionistas como Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) e Eduardo Girão (Novo-CE). O general Hamilton Mourão (Republicanos-RS), ex-vice-presidente da República, também indicou voto contrário à PEC.
<b>Teto</b>
A proposta original em debate no Congresso estabelece o pagamento a cada cinco anos do Adicional por Tempo de Serviço de 5% (limitado a 35%) para juízes, procuradores e promotores – considerados hoje a elite do funcionalismo público. Como esse adicional é considerado verba indenizatória, seria acrescido à remuneração sem entrar no abate-teto. Atualmente, o teto do funcionalismo público federal é de R$ 44 mil, que corresponde ao salário de um ministro do Supremo Tribunal Federal.
De acordo com o estudo do CLP, elaborado pelo economista Daniel Duque, o quinquênio beneficiaria 31,8 mil dos 266 mil magistrados, procuradores e promotores que atuam no País. E 17,8 mil integrantes do Judiciário e do Ministério Público teriam remuneração mensal maior que o teto constitucional.
O adicional mensal recebido por juízes e procuradores ficaria entre R$ 1,3 mil e R$ 12 mil, conforme o tempo de carreira. "É inaceitável discutir um novo privilégio para o funcionalismo público. A realidade do cidadão está muito distante dessa pequena parcela de servidores que recebe benefícios exorbitantes", disse o economista ao <b>Estadão</b>.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>