Variedades

Peça de teatro com enredo contra o totalitarismo chega ao Sesc Guarulhos

O Sesc Guarulhos, a mais nova unidade do Sesc São Paulo no estado, receberá, em seu novíssimo Teatro, o espetáculo “Estado de Sítio”, adaptação de Gabriel Villela – que também assina a direção e os figurinos – para o texto clássico do filósofo argelino Albert Camus. Serão duas apresentações, dias nos dias 25 (sábado, às 20h) e 26 (domingo, às 18h) de maio.
 
O elenco traz no palco os atores Elias Andreato, Claudio Fontana, Chico Carvalho, Arthur Faustino, Cacá Toledo, Daniel Mazzarolo, Kauê Persona, Marco França, Mariana Elisabetsky, Nathan Milléo Gualda, Pedro Inoue, Rogério Romera, Rosana Stavis e Zé Gui Bueno. Já a cenografia é assinada por J C Serroni.
 
Concepção – Na peça, o totalitarismo infecta o organismo social de maneira insidiosa e os sintomas podem não ser facilmente identificáveis, mas os efeitos são implacáveis. Para a encenação de Estado de Sítio, Gabriel Villela “parte do princípio de que a epidemia deveria ultrapassar a condição de alegoria – o que na atual conjuntura talvez reduzisse a poética de Camus a uma espécie de alerta político, correndo inclusive o risco de fazermos um espetáculo panfletário – para atingir a categoria mais ampla de símbolo”.
 
Segundo Villela, que recentemente encenou os elogiados espetáculos Boca de Ouro, de Nelson Rodrigues, e Hoje é Dia de Rock, de Zé Vicente, “a riqueza dramatúrgica de Camus não se limita a um contexto histórico específico nem a um campo político delimitado, mas é um mosaico de teatralidades que nos lembra que a liberdade exige esforço coletivo e contínuo”.
 
Para os figurinos, Vilella traz o preto como cor básica complementada com cores nos adereços de cabeça. Já a maquiagem de Claudinei Hidalgo também realça o caráter grotesco e não realista dos personagens, enquanto a direção musical de Babaya e Marco França França traz no coro trágico grego arranjos polifônicos de canções revolucionárias icônicas, como Fischia il Vento, o Hino da Resistência Francesa, músicas ciganas de Goran Bregovic e outras cantadas em ladino (língua falada por comunidades judaicas originárias da Península Ibérica).  
 
Ivan Andrade, diretor-assistente do espetáculo, ressalta que na peça “é possível reconhecer traços que vão da tragédia grega ao auto-sacramental. Camus tinha a mesma sensibilidade para costurar estilos, gêneros, escolas, tendências etc, que tinha para transitar entre o jornalismo, o ensaio filosófico, o romance e a dramaturgia, sempre visando defender aguerridamente suas ideias libertárias”. 
 
Responsável pela cenografia da montagem, José Carlos Serroni (J. C. Serroni) questiona: “Que espaço poderia corporificar o medo, a submissão, a negligência e a omissão dos governantes diante de problemas reais que agonizam uma sociedade organizada de homens de bem? Como simbolizar a peste, um grande mal e uma punição que paira sobre a cidade?”. Que possamos atender uma vontade de Camus que chegou a dizer: "Perceber-se-á bem que Estado de Sítio se trata de uma peça de cólera, mas sobre essa questão terei uma coisa a acrescentar: cheguei a pensar chamar o espetáculo de 'O Amor de Viver’”.
 
Estado de Sítio – Ao escrever a obra, Camus declarou que pretendia “atacar frontalmente um tipo de sociedade política que se organiza, à direita ou à esquerda, de modo totalitário. Esta peça toma o partido do indivíduo, da natureza humana naquilo que ela possui de mais nobre, o amor, contra as abstrações e os terrores de um regime autoritário”.
 
Sua obra anterior, A peste, é um romance primoroso que aborda o flagelo do totalitarismo simbolizado por uma epidemia que se espalha em uma vila marítima. A semelhança com Estado de Sítio é tamanha que, apesar da insistente negativa de Camus, parece difícil não entender essa peça como uma adaptação do romance. Alguns papeis secundários teriam sido simplificados, o posicionamento face à Igreja se tornado mais duro, o sarcasmo potencializado na figura do personagem Nada (Chico Carvalho) e o autoritarismo ganhado um viés alegórico sobretudo com os personagens da Peste (Elias Andreato) e sua Secretária, a Morte (Claudio Fontana). Ainda assim, ambas obras têm a mesma dinâmica (a epidemia vem da periferia para o centro da cidade, sendo o mar a única escapatória possível), tratam-se de tragédias de separação – de Diego (Pedro Inoue) e Vitória (Mariana Elisabetsky) – e o medo é o fio condutor de uma e de outra.
 
A escolha de Cádiz (Espanha) como cenário da obra não é casual. Apesar da memória recente do nazismo e do fascismo na Europa, o regime fascista de Franco, extremamente violento, ainda sobreviveria na Espanha por quase quatro décadas (1938-1973), uma mácula na história de uma Europa que já começava a avançar na transição para a democracia liberal. Cádiz, uma cidade brutal e longamente ocupada, cenário ideal para ter a peste como alegoria, tornando-a instrumento de medo, um ambiente propício a violências, deportações, instaurando um eterno estado de vigilância. Na peça é a coragem que triunfa sobre o mal, vale lembrar que Camus nunca foi um pacifista ingênuo – ele sabia que a resistência exigia sacrifícios, algumas vezes sobre-humanos.
 
Albert Camus – Nascido na Argélia durante a ocupação francesa no seio de uma família paupérrima, Albert Camus (1913-1960) graduou-se em filosofia e teve uma ousada carreira de jornalista, período em que tomou posições incisivas em relação à Guerra da Independência Argelina. Já morando na França, alcançou notoriedade em 1942 com a publicação de O estrangeiro, romance que se destacou por suas implicações filosóficas. Junto com a peça Calígula (1941) e com o ensaio O mito de Sísifo (1942), o romance constituiu o que ele mais tarde chamou de Trilogia do Absurdo.
 
Segundo Camus, a vida tem que ser vivida apesar da total falta de sentido e sem recorrer à esperança, isto é, devemos aceitar a noção de absurdo do nosso destino. Ao longo da vida, ele ainda publicou outros dois romances (A peste e A queda), vários ensaios, peças e um livro de contos. Suas posições libertárias fizeram com que ganhasse a antipatia tanto de nazistas quanto de comunistas, ficando famosa a ruptura pública com seu amigo Jean-Paul Sartre por desavenças políticas. Em O homem revoltado (1951), Camus fez uma dura crítica aos processos de insurreição e de revolta metafísica, além de condenar o assassinato e o suicídio como reações ao absurdo.
 
Camus morreu num acidente de carro em 1960 junto com seu editor Michel Gallimard. Por algum tempo houve a suspeita de que ele tivesse sido assassinado a mando da URSS pelas fortes críticas que fazia a Moscou.
 
FICHA TÉCNICA
 
Texto: Albert Camus
 
Direção, Adaptação e Figurinos: Gabriel Villela
 
Tradução: Alcione Araújo e Pedro Hussak
 
Elenco: Elias Andreato, Claudio Fontana, Chico Carvalho, Arthur Faustino, Cacá Toledo, Daniel Mazzarolo, Kauê Persona, Marco França, Mariana Elisabetsky, Nathan Milléo Gualda, Pedro Inoue, Rogério Romera, Rosana Stavis e Zé Gui Bueno
 
Cenografia: J C Serroni
 
Iluminação: Domingos Quintiliano
 
Direção Musical: Babaya e Marco França
 
Diretores assistentes: Ivan Andrade e Daniel Mazzarolo
 
Foto: João Caldas Fº
 
Produção executiva: Luiz Alex Tasso
 
Direção de Produção: Claudio Fontana
 
SERVIÇO
 
ESTADO DE SÍTIO – SESC GUARULHOS
 
Dias: 25/05, sábado, às 20h e 26/05, domingo, às 18h
 
Local: Teatro
 
Capacidade: 349 lugares
 
Duração: 90 minutos
 
Classificação etária: para maiores de 16 anos
 
Ingressos: R$ 30,00 (inteira); R$ 15,00 (meia: estudante, servidor de escola pública, + 60 anos, aposentados e pessoas com deficiência); R$ 9,00 (credencial plena: trabalhador do comércio de bens, serviços e turismo matriculado no Sesc e dependentes).
 
 
 
SESC GUARULHOS
 
Endereço: Rua Guilherme Lino dos Santos, nº 1.200, Jardim Flor do Campo, Guarulhos – SP
 
Horário de funcionamento: De terça a sexta, das 9h às 21h30. Sábados, das 9h às 20h e domingos e feriados, das 9h às 18h.
 
Telefone: (11) 2475-5550

 

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