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Perda da mãe e atuação heroica em final ditam superação de goleiro do polo

Transformar a dor da perda em combustível a fim de arrebatar a medalha de ouro para o Brasil. Esse foi o roteiro hollywoodiano que Diogo Checchinato cumpriu no último dia 16 de julho. Ao abdicar do velório da mãe e optar pelo jogo derradeiro no Pan Sub-19, ele conquistou o título, foi eleito o goleiro do torneio de polo aquático e ainda defendeu duas cobranças na disputa por penalidades contra os americanos. Da atitude na piscina às palavras após a conquista, o goleiro deu o tom do sentimento que dominou o seu coração no jogo.

"Acabamos de ser campeões Pan-Americanos e está complicado falar agora. Recebi uma notícia muito triste: minha mãe veio a falecer. Mas de nenhuma forma isso me intimidou. Lutamos, não desistimos e ganhamos. Queria fazer uma homenagem para ela. Onde quer que você esteja, isso é para você, mãe. Te amo, um beijo", disse o atleta com voz embargada após receber a medalha de ouro.

Em entrevista ao Estadão, o goleiro comentou ter passado ainda por outro momento de emoção quando o hino nacional foi executado antes do jogo. "Ela sempre foi patriota e gostava demais do Brasil. Chorei muito naquele momento e cantar o hino me fez bem."

Diogo recebeu a notícia da morte da mãe logo após a vitória sobre a Argentina pelas semifinais da competição. Durante os jogos, no entanto, o atleta já vinha mantendo contato com o pai por telefone. Cátia Pereira Mendes Checchinato, de 51 anos, levava uma vida normal até abril deste ano. O diagnóstico da doença foi constatado em maio e transformou a rotina de toda a família. "Foi um câncer super raro, que costuma atingir homens adultos e obesos. Estava fazendo tratamento pesado, mas não foi feita a quimioterapia diretamente porque tinha outros problemas para solucionar primeiro. Nesse meio tempo, ela partiu."

Mesmo com o estado de saúde debilitado, a mãe sempre fazia questão de ver o filho em ação. "No Pan, ela acompanhou as partidas da seleção brasileira pela televisão, mas fazia muito esforço para conseguir assistir aos jogos", disse o filho.

Muito da trajetória conquistada no esporte até aqui por Diogo veio graças ao apoio dos familiares. Se o pai serviu como referência para a entrada na modalidade, Cátia foi o alicerce nesta fase da vida do filho. "Comecei a jogar com nove anos no Jundiaiense e me destaquei a partir dos 12. Em 2018, fui defender o Barceloneta, da Espanha, e minha mãe foi junto. Me ajudava desde a alimentação até a adaptação aos estudos. Ia comigo aos treinos e me ensinou a ser independente."

No esporte de alto rendimento, os desafios são uma constante. Cátia, que jogou vôlei em Jundiaí, emprestou a sua experiência emocional para colocar o filho nos eixos quando a situação exigia. "Sempre me deu muita força. Quando cheguei à Espanha, meu nível era muito inferior aos demais atletas, mas graças a ela, me mantive firme. Quando jogava mal, ela me tranquilizava. Como era motivado e apaixonado pelo que fazia, seguia sempre em frente."

Com o passar dos anos e a extrema dedicação nos treinos e jogos, Diogo foi se transformando em realidade. No ano passado, pelo Sesi, foi o MVP (Most Valuable Player) do Campeonato Brasileiro Sub-20. A performance rendeu a convocação para o Sul-Americano e lá, mais uma vez, a resposta foi satisfatória: voltou campeão e como melhor goleiro do torneio.

DRAMA UNIU SELEÇÃO
Totalmente integrado ao elenco, Diogo se sentiu abraçado pelos companheiros ao saber da perda da mãe. A quebra de um protocolo determinado pela comissão técnica, que era a proibição do uso de celulares nas refeições, acabou sendo a senha para enfrentar o momento mais dramático de sua vida. "Eles têm essa regra para que os atletas estejam sempre interagindo. Porém, a comissão técnica sabia da situação. Meu pai ligou desesperado e eu procurei me acalmar. Fui para o quarto, fiquei pensativo e decidi que ia jogar a final. Muitos choraram e o time se uniu mais ainda."

Os ensinamentos da mãe foram colocados em prática para que Diogo tivesse os nervos no lugar e pudesse cumprir seu papel na luta pelo ouro. "É o controle natural da vida. Não tem como prever ou como causar. É o que minha mãe sempre me ensinou. Ela era pesquisadora e tudo o que falava envolvia a ciência", disse o jogador. No dia da final, a ansiedade e a resiliência se misturaram aos pensamentos do atleta. "Acordei uma hora mais cedo do que tinha programado no despertador por falta de sono e vi uns vídeos para me motivar. No café, comi pouco e sei que todos estavam focados no que tinham de fazer."

Da preleção do técnico à provocação dos americanos, que no aquecimento na piscina ocuparam também uma parte do espaço destinado aos brasileiros, Diogo se manteve focado no objetivo do ouro. Após a decisão e o primeiro lugar garantido, a solidariedade dos colegas de time se fez presente ainda na água. "Todos vieram nadando na minha direção, fizemos uma roda de oração e festejamos muito. Lembro que sempre que acabava um jogo, ia abraçar a minha mãe e ela respondia com um parabéns", comentou.

PAI EMPURROU FILHO PARA O GOL
Alessandro, ou simplesmente Xispita, é um dos grandes nomes do polo aquático de Jundiaí. Apesar de ter como origem a posição de marcador de centro, ele se destaca também pela versatilidade em outras posições. Pai de Diogo, ele é responsável direto pelo seu ingresso no polo aquático. Mas Xispita não gostou de ver o filho rumar para o gol. "Meu pai não queria que eu fosse goleiro. Como era um ótimo jogador, na cabeça dele, eu tinha que ser igual", afirmou o goleiro, que tem ainda mais dois tios que também praticam a modalidade.

E o gosto pela posição, segundo o próprio filho, acabou ganhando força após uma atitude involuntária do pai. "Ele me mostrou um vídeo com atuações do Jesus Rollán, um dos maiores goleiros da história do polo. Fiquei tão impressionado que no dia seguinte já estava na piscina."

FACULDADE DE MEDICINA
A ficha da medalha de ouro ainda não caiu. Mas, aos 19 anos, Diogo já tem uma certeza: vai cursar a faculdade de medicina. Em meio ao início promissor no polo aquático, o jogador revelou que ainda estuda a possibilidade de disputar o próximo Mundial Sub-20 da modalidade, que acontece no ano que vem. "No fim do ano passado, tinha parado de jogar polo, mas voltei. A tendência é que participe", afirmou, deixando em aberto essa possibilidade.

No reencontro com a família, o vazio pela ausência da mãe já sinaliza explicações para suprir essa ausência. "Nesta minha volta, meu pai chorou muito e abracei minha irmã. É uma situação difícil, mas em contrapartida, foi um alívio. Para alguém que teve câncer, minha mãe sofreu pouco. Sei que ela está presente."

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