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Permitir revisão do acordo terá consequência em vários outros, diz Janot

No julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre as diretrizes para a atuação do juiz na homologação de um acordo de delação premiada, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, se mostrou frontalmente contra a revisão dos termos do acordo de colaboração premiada do Grupo J&F. Ele disse que isso fragilizaria o próprio instituto das delações premiadas e chamou de “salto triplo mortal de costas” a alegação de que os delatores do Grupo J&F não poderiam obter perdão judicial porque seriam líderes de organização criminosa.

“A essa altura, a homologação verifica voluntariedade, legalidade e regularidade. E permitir uma revisão completa do acordo a essa altura terá consequência, sim, em vários outros acordos de colaboração premiada. A mensagem que se passará é que o Ministério Público (MP) ao acordar pode, mas não muito. O MP, ao acordar, promete, mas não sabe se vai poder cumprir”, afirmou Janot, mostrando preocupação com os rumos não só da Lava Jato mas de quaisquer investigações no Brasil.

“O que se quer aqui é impugnar a legalidade do acordo com base no disposto no inciso 1º do parágrafo 4º do artigo 4º da Lei de Organizações Criminosas. Na mesma hipótese, o MP poderá deixar de oferecer de denúncia se o colaborador não for líder de organização criminosa. Qual é o salto triplo mortal de costas que se pretende fazer neste caso? Sem nenhuma prova, sem nenhuma instrução, em nível de habeas corpus, mandado de segurança ou questão de ordem… sem nenhuma prova, partir-se para uma presunção absoluta que existe a organização nesta ou naquela extensão e que uma pessoa ou outra seria o líder da organização criminosa, espancando de forma clara o princípio da presunção da inocência”, afirmou Janot.

Janot disse ser impossível “presumir que fulano é líder de organização criminosa”. “Toda vez que o MP estiver conduzindo uma instrução estaria liberado da prova? Para dizer que o líder é fulano ou sicrano?”, questionou o procurador, afirmando que apenas “no momento da sentença o juiz verificará os termos da colaboração”.

A afirmação foi feita para rebater o que foi sustentado no próprio plenário pelo advogado Cézar Rocha Bittencourt, que representa Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), preso no curso da investigação aberta contra Loures e o presidente Michel Temer com base nas delações da JBS. Questionada por aliados do governo Temer, a ausência de oferecimento de denúncia também foi apontada pelo advogado Gustavo Passarelli, que atua em nome do governador de Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja (PSDB).

O procurador-geral disse que a lei se refere à possibilidade de “sindicalização do acordo” em dois momentos. “No primeiro, será remetido ao juiz para homologação o qual deverá verificar a sua regularidade, legalidade e voluntariedade. Num segundo momento, a lei se refere de novo à possibilidade de sindicalização do acordo quando, nos termos do parágrafo 11º do art 4º da lei, diz-se que a sentença apreciará os termos do acordo homologado e sua eficácia. A sentença depois de instrução penal realizada haverá de aferir a eficácia do acordo no desenvolvimento da instrução e da produção da prova”, disse Janot.

No começo de sua manifestação, Janot havia defendido a prevenção do ministro Edson Fachin para ser o relator das delações da JBS. Segundo ele, ao contrário do que questiona o advogado de Reinaldo Azambuja, a prevenção não se deu por ser Fachin o relator da Lava Jato, mas, sim, de várias investigações específicas, em petições e inquéritos, sobre os quais as delações do Grupo J&F trouxeram fatos e subsídios conexos. Como exemplo, citou dois inquéritos que apuram uma suposta organização criminosa formada por parlamentares do PMDB – uma no Senado, uma na Câmara. Também citou a investigação aberta contra os ministros Eliseu Padilha e Moreira Franco com base na delação da Odebrecht, envolvendo recebimento de caixa 2 para o PMDB na campanha de 2014, tendo o acerto financeiro sendo feito, de acordo com delatores, em jantar no Palácio do Jaburu.

Janot também defendeu a concentração das delações de um grupo em um único relator, sem divisão de termos de depoimentos antes da homologação, argumentando que “a metodologia de homologação conjunta do acordo de colaboração oferece racionalidade, segurança, controle de sigilo”. Ele também assinalou que este foi “o protocolo que foi seguido em todos os casos de colaboração na Corte”. “O acordo diz respeito ao indivíduo e não aos fatos aos quais traz. Há necessidade de se manter a colaboração como um todo”, disse Janot, explicando que depois das homologações é possível haver redistribuição.

Outro argumento trazido por Janot foi o de que o acordo de colaboração, que permite o uso de técnicas especiais de investigação, “não é o meio de prova, mas o meio de obter prova”. Janot apontou que não deveria haver questionamento sobre a decisão individual de juízes de homologar uma delação, como não há sobre a decisão individual de juízes diante de diversos outros meios de obtenção de prova.

“A delação é meio de obter prova, como é meio de obtenção de prova a ação controlada, a quebra de sigilo, a escuta telefônica, e todas essas decisões, todas essas decisões são tomadas de forma monocrática”, disse.

“Todos os precedentes na Corte foram decididos por votação monocrática dos relatores. Se a minha memória não falha, cinco ou seis ministros já homologaram colaborações premiadas por decisão monocrática”, acrescentou.

No fim do voto, Janot disse que o “Ministério Público Federal confia que seja mantida a prevenção do ministro relator, confirmada a homologação por ato monocrático e que seja a essa altura validada regularidade desse acordo”. E arrematou citando uma frase de Martin Luther King: “Não há nada mais trágico nesse mundo do que saber o que é certo e não fazê-lo. Que tal mudarmos o mundo começando por nós mesmos?”

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