A arquitetura suntuosa da sede do Ministério da Pesca e da Aquicultura, em Brasília, esconde a trajetória de um órgão marcado, em seus 12 anos de existência, por antigas práticas de uso eleitoral da máquina pública e denúncias. A presidente Dilma Rousseff, contudo, não anunciou ainda se manterá ou extinguirá a pasta na mudança que fará na estrutura do governo.
Nascida em 2003 na gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca teve uma vida de gestão pública efêmera no jogo de poder. Com um peso orçamentário de R$ 11 milhões no primeiro ano de funcionamento, atingiu R$ 72 milhões em custeio e investimentos no fim do segundo mandato do petista, quando foi rebatizada de Ministério da Pesca e Aquicultura. Hoje, sob o comando de Hélder Barbalho, herdeiro do senador Jader Barbalho (PMDB-PA), tem gastos de cerca de R$ 150 milhões por ano. Atualmente, a pasta consome cerca de R$ 1 milhão por mês em aluguel, energia, água e telefone.
A força do ministério está no cadastro do seguro-defeso, um programa de concessão de um salário mensal para pescadores em tempo de pesca proibida. O benefício é pago pelo Ministério do Trabalho, mas as carteirinhas do programa que consumiu R$ 2,3 bilhões neste ano são controladas pela Pesca. “A importância política da pasta está em cima do cadastro de pescador”, afirma Gil Castello Branco, da organização Contas Abertas. “A ideia de remunerar o pescador em período de proibição da pesca é perfeita, mas onde tem benefício pode existir fraude e dificuldade de gestão.” A entidade acompanha a curva dos números do seguro-defeso desde 2003, quando se gastou um total de R$ 81 milhões no repasse do benefício para 113 mil pescadores.
Origem
Ao criar a secretaria com status de ministério em 2003, Lula escolheu como titular do órgão José Fritsch, candidato do PT que ficou em terceiro lugar na disputa pelo governo de Santa Catarina no ano anterior. Com experiência em movimentos de terra e agricultura familiar, Fritsch iniciou uma parceria com governos estaduais e empresários para reduzir um gargalo de mais de duas décadas, desde a extinção da antiga Superintendência da Pesca, do tempo da ditadura militar.
Após a saída de Fritsh, em 2006, o Ministério da Pesca e Aquicultura passou por momentos de suspeição. Em 2010, o então ministro Altemir Gregolin foi acusado de desviar R$ 36 milhões de emendas do Congresso voltadas a atividades pesqueiras no Pará e no Maranhão para a compra de 28 lanchas-patrulha – ele nega irregularidades.
Entre 2012 e 2014, a pasta viveu um período “evangélico”. O bispo e senador Marcelo Crivella (PRB-RJ) e o também representante da Igreja Universal Eduardo Lopes comandaram a Pesca. No ano passado, o PRB loteou sua estrutura. De suas 27 superintendências estaduais, 17 eram ocupadas por filiados do partido sem relação com o setor, incluindo um piloto de avião, um diretor de TV, advogados e políticos.
Esse período foi marcado ainda pela crônica policial. Agentes da Polícia Federal e procuradores do Ministério Público abriram investigação para apurar denúncias de uso de distribuição de carteiras de pescador, que dão direito ao seguro-defeso, para fins eleitorais – Crivella nega.
Neste ano, a Pesca já gastou R$ 71 milhões em custeio e investimentos em programas. O gasto anual pode ultrapassar os R$ 110 milhões do ano passado. Enquanto a presidente não define se manterá ou extinguirá a pasta, o ministro Hélder Barbalho mantém agenda intensa em seu reduto, o Pará. No dia 18, esteve em Vitória do Xingu para inaugurar a sede da colônia de pescadores.
Depois, em Altamira, vistoriou obras de um centro de pesca, abriu uma outra colônia, deu entrevistas e instalou um escritório da pesca num prédio público da cidade. A maior parte dos 300 funcionários em Brasília, no entanto, não corre o risco de perder o trabalho por ser concursada. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.