A força-tarefa da Operação Lava Jato apura se existe relação entre a suposta dívida de R$ 60 milhões da campanha de reeleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2006, com o Grupo Schahin e o empréstimo de R$ 12 milhões feito pelo banco do grupo, em 2004, para o pecuarista José Carlos Bumlai – novo alvo das investigações, em Curitiba.
As apurações partem da revelação dos novos delatores da Lava Jato, o ex-gerente de Internacional da Petrobras Eduardo Musa e o lobista Fernando Baiano Soares. Segundo eles, contrato de US$ 1,6 bilhão da estatal foi dirigido em 2011 para a Schahin, com intermediação de Bumlai e Baiano, como forma de compensar o grupo pela dívida eleitoral.
A ligação de Bumlai nesses dois episódios obscuros envolvendo as finanças do PT e empresas do cartel acusado de corrupção na Petrobras pode unificar dois dos maiores escândalos das administrações petistas, a Lava Jato e o mensalão, avaliam investigadores do caso.
Um dos caminhos desse apuração é um documento apreendido pela Polícia Federal, em março do ano passado – quando foi deflagrada a Operação Lava Jato – no escritório da contadora do doleiro Alberto Youssef, Meire Pozza.
É um contrato no valor de R$ 6 milhões, assinado em 2004 entre a empresa 2S Participações Ltda., do publicitário Marcos Valério, e a Expresso Nova Santo André, do empresário Ronan Maria Pinto, de Santo André, investigado na morte do prefeito petista de Santo André, em 2002, e a Remar Agenciamento e Assessoria.
No mesmo ano, 2004, o Banco Schahin concedeu um empréstimo para Bumlai de R$ 12 milhões. O pecuarista diz que o dinheiro seria usado para negócios na área rural. “Fiz um empréstimo para meus negócios, meus agronegócios que envolvia R$ 12 milhões. Isso aí já serviu para tudo, para pagar aquele caso de Santo André, para pagar não sei quem.” O valor foi quitado.
Chantagem
O Ministério Público Federal sabia, desde 2012, da existência de um negócio que envolveria R$ 6 milhões e os investigados do mensalão. O publicitário mineiro Marcos Valério, operador de propinas no mensalão, afirmou em tentativa de delação premiada naquele ano – quando seria condenado – que dirigentes do PT pediram a ele R$ 6 milhões. O dinheiro seria destinados ao empresário Ronan.
Segundo Valério, isso serviria para que o empresário de Santo André parasse de “chantagear” o ex-presidente Lula, o então secretário da Presidência, Gilberto Carvalho, e o então ministro da Casa Civil, José Dirceu – preso desde março, pela Lava Jato, em Curitiba.
Ronan tentava relacionar Lula, Carvalho e Dirceu a suspeitas de corrupção na cidade que teriam motivado o assassinato do prefeito Celso Daniel, em 2002 – a conclusão da polícia paulista é de que ele foi vítima de um crime comum, não político. Bumlai teria sido uma das pessoas que atuara nesse episódio de suposta compra do silêncio do empresário de Santo André.
O empresário negou qualquer relação com o caso, e disse não conhecer nem Bumlai nem Marcos Valério.
Contrato confidencial
Dois anos depois das afirmações de Valério, em delação que acabou não sendo fechada, o contrato dos R$ 6 milhões da empresa do publicitário envolvendo empresa de Ronan foi apreendido no escritório da contadora de Youssef durante as buscas da Lava Jato.
O material intitulado “Enivaldo confidencial” seria um contrato “referente a um proprietário de uma empresa de ônibus de Santo André/SP” que era guardado a “sete chaves”, contou Youssef em seu termo de delação 25, prestado em 26 de outubro de 2014.
“Enivaldo Quadrado disse que preparou a triangulação de pessoas que figurariam em tal contrato”, explicou Youssef. “O contrato foi feito entre a empresa de Marcos Valério, isto é, a 2S Participações Ltda, e uma outra empresa que Enivaldo indicou.” A empresa, para os investigadores, é a Remar. Para isso, o ex-dono da Bônus-Banval “receberia dinheiro ou algum outro favor”, contou.
Segundo o doleiro, quem pediu para que Enivaldo Quadrado fizesse o documento “era uma pessoa ligada ao Partido dos Trabalhadores – PT, chamada Breno Altiman”.
Breno Altman é jornalista e consultor internacional, com relação próxima com o ex-ministro José Dirceu. Ele nega qualquer envolvimento no caso e diz nunca ter visto Bumlai.
O doleiro disse que não poder especificar o tipo de chantagem estaria envolvida no esquema, mas que ela objetivava o silêncio em relação ao Caso Celso Daniel.
Contrato da Petrobras
As novas revelações dos delatores Fernando Baiano e Eduardo Musa, feitas entre setembro e outubro, levaram os investigadores do MPF e da Polícia Federal a buscarem uma conexão entre esses dois episódios suspeitos que tem como personagens Bumlai, o PT e os esquemas de corrupção alvos da Lava Jato e do mensalão.
Bumlai foi citado em depoimentos colhidos entre agosto e setembro pela força-tarefa da Lava Jato como intermediário da Schahin, junto com o lobista Fernando Baiano, da contratação da empresa pela Petrobras em 2011, para operação do navio-sonda Vitória 10000. A contratação seria uma compensação pela dívida do PT, por gastos na campanha de reeleição de Lula.
Em 2012, quando tentou um acordo com a Procurador, dois anos antes da Lava Jato, Marcos Valério mencionou que, pelo empréstimo dado ao pecuarista no episódio da chantagem contra o PT, a Schahin seria recompensada com contratos da Petrobras.
Defesas
Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o pecuarista José Carlos Bumlai negou qualquer envolvimento com pagamentos envolvendo chantagem e disse que sua relação com a Schahin foi legal.
Consultado, Ronan Maria Pinto disse aguardar “com tranquilidade as investigações que vêm sendo feitas no âmbito da Operação Lava Jato, e que devem encerrar de vez esse assunto em que toda hora tentam me envolver”. O empresário disse que não conhece José Carlos Bumlai, Marcos Valério e que “não tenho qualquer relação com esses fatos”.
Breno Altman afirmou que não tem relação algum com os fatos e disse não conhecer o pecuarista Bumlai. Filiado ao PT desde a década de 1980, Altman explicou que nunca foi da estrutura partidária.
O presidente nacional do PT, Rui Falcão, disse que a história é “totalmente falsa, pois a suposta dívida mencionada na delação nunca existiu. É mais uma mentira divulgada de maneira irresponsável, sem base em provas, na tentativa de comprometer o PT”, afirmou. “A arrecadação do partido sempre foi feita em obediência à lei, através de transações bancarias, todas elas declaradas à justiça eleitoral”, completou.