A Polícia Federal deflagrou na manhã desta terça, 27, a segunda etapa da Operação Parasita, batizada de Hospedeiro, para investigar suposto esquema de desvio de recursos públicos do Instituto Evandro Chagas – órgão vinculado à Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde – que teria envolvido o pagamento de R$ 1,6 milhão em propinas, entre 2011 e 2020, segundo apurações do Ministério Público Federal e da Controladoria-Geral da União.
Sediado em Ananindeua, na região metropolitana de Belém, o IEC atua nas áreas de pesquisas biomédicas e na prestação de serviços em saúde pública.
Agentes cumprem três mandados de busca e apreensão em dois endereços no Distrito Federal e um mandado de prisão preventiva contra o servidor do IEC Márcio Roberto Teixeira Nunes, em Belém. As ordens foram expedidas 3ª Vara Federal Criminal da Justiça Federal em Belém.
As informações foram divulgadas pelo MPF.
Segundo a Procuradoria, o pedido de prisão de Márcio foi feito em denúncia apresentada à Justiça no dia 4 de setembro. Ele é acusado de pagar mais de R$ 300 mil em propina a outros investigados para assegurar sua nomeação no Instituto. Também estão sob suspeita quatro servidores e uma bolsista do IEC, e uma funcionária da empresa beneficiada pelos desvios.
A primeira fase da Parasita, aberta em fevereiro, levantou provas sobre supostas irregularidades no Centro de Inovações Tecnológicas – CIT do Instituto Evandro Chagas – IEC, órgão ligado ao Ministério da Saúde. O MPF aponta que as fraudes aconteciam com a participação de pesquisadores e funcionários do Instituto, e ocorriam nas aquisições de produtos laboratoriais com o favorecimento de empresa indicada pelo grupo sob suspeita.
De acordo com os investigadores, a análise do material apreendido revelou diversas tentativas do grupo investigado de interferir na troca da Direção do IEC. As apurações miram os crimes de corrupção ativa, corrupção passiva e tráfico de influência.
Na denúncia, os procuradores apontaram a existência de direcionamento de licitações, a realização de manobras para aumentar ilicitamente o lucro da empresa – por meio de superfaturamento e de compras de produtos em quantidade acima da necessária – e pagamentos ilícitos da empresa a servidores públicos.
<b>As acusações</b>
Na peça de acusação enviada à Justiça, a Procuradoria aponta que licitações foram direcionadas para favorecer a empresa Ferpel, e tinham por objeto atender demandas do Centro de Inovações Tecnológicas (CIT), setor do IEC vinculado à Seção de Arbovirologia e Febres Hemorrágicas.
Nesse setor trabalharam três dos quatro servidores acusados: Márcio Roberto Teixeira Nunes – alvo do mandado de prisão -, Clayton Pereira Silva de Lima, e João Lídio da Silva Gonçalves Vianez Júnior. O quarto servidor acusado, Daniel Portal Cantanheide, atuou como pregoeiro do IEC. A bolsista acusada é Keley Nascimento Barbosa Nunes, esposa do também acusado Márcio Roberto Teixeira Nunes, e a funcionária da Ferpel acusada é Edília dos Santos Valente.
De acordo com a denúncia, que cita resultados de análises da Controladoria-Geral da União e da PF de documentos obtidos por meio do cumprimento de mandados de busca e apreensão, a Ferpel tinha acesso antecipado e privilegiado a várias informações dos procedimentos licitatórios, sendo que muitos dos documentos internos relativos à disputa eram na verdade elaborados pela própria empresa.
Além disso, os editais contavam com a previsão de cláusulas elaboradas com o propósito de desclassificar a maior quantidade possível de concorrentes, destaca o MPF. "Já na própria disputa da licitação, contava com tratamento privilegiado por parte do pregoeiro, que muitas vezes burlava regras previstas no edital e na legislação para garantir que a Ferpel vencesse a maior quantidade possível de lances", detalha o MPF.
A denúncia aponta ainda que os denunciados tentavam assegurar a maior margem de lucros possível à empresa beneficiada. "Isso se dava desde a etapa da cotação de preços, que na verdade era uma simulação feita para se obter o maior valor possível", diz a Procuradoria.
Ainda segundo a acusação, na etapa de planejamento da licitação, os servidores do IEC envolvidos realizavam pedidos muito acima da verdadeira necessidade do instituto, sem justificativa técnica adequada.
Já na execução dos contratos, os investigadores apontam outras fraudes: muitas vezes se atestava o recebimento de produtos diferentes, em quantidade menor ou com características diferentes (menor qualidade, prazo de validade inferior) das previstas nos instrumentos contratuais, sendo que, ainda assim, havia posterior desvio de parte desses bens (que eram subtraídos do IEC e devolvidos à empresa fornecedora).
Segundo a Procuradoria, a margem de lucro gerada pelas manobras fraudulentas era dividida entres os responsáveis pela prática dos atos criminosos.
<b>Candidato a diretor</b>
Alvo do mandado de prisão preventiva, Márcio Roberto Teixeira Nunes chegou a ser nomeado como diretor substituto do IEC, diz o MPF. A Procuradoria frisa que o diretor titular nomeado, Jorge Travassos, não está entre os denunciados, mas é investigado porque teve contas pessoais pagas pela Ferpel, do servidor preso nesta manhã.
Para justificar a necessidade da preventiva, os procuradores argumentaram que o acusado tem agido de maneira muito veemente para possibilitar o cometimento de ilícitos penais e garantir sua impunidade.
"Como já visto, ele interferiu pessoalmente nos processos de licitação buscando designação de pregoeiro favorável a seus interesses e fornecendo manifestações técnicas para obter vantagens ilícitas. Além disso, buscou descaracterizar situações ilícitas, como demonstra a tentativa de se desfazer dos produtos com validade vencida", ressalta o MPF.
"As recentes alterações na direção do instituto constituem enorme risco, já que em várias ocasiões Márcio deixou claro que se trata de passo que possibilitará o cometimento de mais desvios e impossibilitará sua apuração", complementa a Procuradoria.
<b>COM A PALAVRA, OS CITADOS</b>
Até a publicação desta matéria, a reportagem buscou contato com os citados, mas sem sucesso. O espaço permanece aberto a manifestações.