Um antigo temor em relação à Arena Corinthians se concretizou. O plano de negócios apresentado para justificar a construção do estádio, de fato, não ficava em pé, como muitos críticos ao projeto já previam antes mesmo de a bola rolar no gramado do Itaquerão. Por causa disso, o time está revendo, para abaixo, o preço das áreas mais luxuosas.
A reportagem do Estado teve acesso a documentos que embasam o pedido de suspensão temporário do pagamento de parcelas do financiamento feito para a construção do Itaquerão. Neles, os sócios da Arena Corinthians argumentam que simplesmente não vão conseguir pagar o empréstimo por causa da baixa rentabilidade do estádio no primeiro ano de operação.
O pedido de mais carência foi enviado à Caixa Econômica Federal, que atuou como intermediária na liberação do crédito do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Basicamente, há três sócios que devem fazer o Itaquerão gerar lucros e pagar o financiamento: o próprio Corinthians, o grupo Odebrecht, por meio da Odebrecht Participações e Investimentos, e a gestora de fundos BRL Trust.
LIQUIDAÇÃO – Dentro do novo plano de negócios, a primeira medida foi rever preços. Afora um pequeno aumento aplicado sobre alguns ingressos avulsos, a maioria dos valores foram reduzidos. É como se arena estivesse em liquidação. Um exemplo são os preços mínimos do chamado PSL (sigla em inglês para Personal Seat License, numa tradução livre, direito pessoal de uso de assento). Esse setor é como uma cadeira cativa, na qual o torcedor tem o direito de usar aquele assento por todo o período que adquiriu – no mínimo um ano.
No PSL Business, no 8º andar, a redução média de preço foi 75%. Um deles chegou a ter preço mínimo de R$ 28 mil e hoje está avaliado em R$ 5,5 mil. O corte mais expressivo foi feito nos camarotes de festas. Um deles já custou quase R$ 1,5 milhão. Agora sai por menos de R$ 650 mil.
Parte das mudanças que foram apresentadas à Caixa, na prática, já estão sendo feitas na Arena. Setores que antes não tinham a venda de bilhetes avulsos, como as cadeiras superior Business e os camarotes de festa, todos no prédio oeste, considerado o espaço mais nobre e rentável do Itaquerão, já são comercializados e os preços por lá variam de R$ 120 a R$ 350. “O principal objetivo foi aumentar a receita no segundo turno do campeonato”, explica Gustavo Herbetta, superintendente de marketing do Corinthians. Inicialmente, o Plano de Negócios projetou que a demanda seria tão espetacular que não seria necessário ter os avulsos.
NOVO PLANO – Ele lembra que a alteração, que o clube chama de novo Plano de Negócios, aumentou consideravelmente a venda de ingressos. “Existia uma demanda reprimida de pessoas do setor leste; o lado oeste, que era direcionado mais para o público corporativo, não enchia. O plano número 1 tinha um valor fora da realidade, então tentamos remodelar de forma que os valores coubessem na vida real.”
Na mudança promovida, dos quase quatro mil lugares para o PSL Business ficaram cerca de 800 cadeiras apenas. “Abrimos o oitavo andar, onde tem um bufê, música, ou seja, um conteúdo diferenciado para o torcedor. É uma área vip corporativa e o restante da cadeiras foi para o torcedor comum, que era uma demanda reprimida”, diz Herbetta.
Para muitos críticos desse novo Plano de Negócios, a proposta anterior foi dinamitada e o clube está pensando a curto prazo, sem ter uma garantia de renda futura com a venda de setores no mínimo pela temporada toda. “Você desvaloriza o negócio com falsa imagem de sucesso”, afirmou uma pessoa do Corinthians, preferindo não ser identificada.
Herbetta reconhece que a boa fase do Corinthians ajuda a encher o estádio neste momento, mas pondera também que a arrecadação aumentou consideravelmente nas últimas partidas.
ATRASOS NA OBRA ATRAPALHAM PROJETO – Em público, o Corinthians sempre evitou entrar em rota de colisão com a Odebrecht, construtora que fez o estádio em Itaquera. No entanto, no clube é consenso de que os atrasos na obra atrapalharam, e muito, a negociação dos setores mais nobres que poderiam estar dando lucro agora e só têm rendido dor de cabeça. Na sexta-feira passada, o time externou a insatisfação e deixou claro que vai cobrar da construtora cada mão de tinta e saco de cimento que o contrato da obra previu. Postou uma nota em seu site, avisando os torcedores que o fato de a Odebrecht anunciar o fim da obra não significa o encerramento oficial dos trabalhos.
Um novo relatório de acompanhamento das obras está sendo finalizado. Já se sabe que vai mostrar que as pendências permanecem, principalmente no prédio Oeste, área mais luxuosa. E o clube avisou: “Quaisquer diferenças encontradas serão objeto de solicitação de devolução dos recursos para adequação da Obra e de seu Projeto Contratado e/ou abatimento da dívida de Construção”. Procurada, a Odebrecht preferiu não comentar.
Inicialmente, o contrato, que era de preço fechado, previa a entrega da Arena Corinthians por R$ 820 milhões. Os recursos não foram suficientes e o valor foi revisto para R$ 985 milhões. Inicialmente, a construtora deu a obra por encerrada em dezembro de 2014. Em julho passado, porém, vários pontos do prédio Oeste estavam inacabados. “Todo o sexto andar não tinha mármore no chão – estava no cimento”, diz executivo próximo aos sócios da Arena que não quer ser identificado.
A loja do Corinthians, para vender camisas e objetos do clube, foi aberta apenas na semana passada. Os dois restaurantes panorâmicos permanecem inacabados. Não tem sequer massa corrida na parede e piso.
O atraso nas obras também manchou a imagem do estádio e a venda dos “naming rights” empacou por meses, mas agora parece estar perto de uma solução. O Corinthians assinou um NDA, um Termo de Confidencialidade com uma empresa para batizar a arena.
Ninguém da diretoria fala em nomes, mas estima-se que a intenção seja receber R$ 20 milhões por ano pelo negócio. A carta na manga do Corinthians é que a TV Globo, na última renovação de contrato para transmissão de jogos da equipe, se comprometeu a falar o nome da empresa em suas exibições ao vivo. A Caixa, patrocinadora do time, tem prioridade por contrato para cobrir qualquer oferta da venda dos “naming rights”.