A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) decidiu que as operadoras de planos de saúde continuarão cobrindo as cesáreas eletivas – aquelas feitas por decisão da grávida e do obstetra, não por indicação clínica. O que muda agora é que as gestantes terão de assinar um termo de consentimento sobre os riscos da cirurgia.
A medida esvazia o plano da agência de reduzir drasticamente as cesarianas entre as mulheres atendidas pelos planos, modificando resolução da própria ANS sobre o tema, que passou a valer ontem. As cirurgias, no entanto, só poderão ser marcadas se a gestação completar 39 semanas, para reduzir os casos de bebês prematuros.
A medida ainda será detalhada em instrução normativa. Hoje, 84,6% das mulheres atendidas por planos têm filhos por cesárea; na rede pública, a proporção cai para 40%.
Entre as regras anunciadas em janeiro para reduzir a quantidade de cesarianas estava a do partograma, que passava a fazer parte do processo de pagamento. O relatório mostra se houve algum problema que levou à necessidade de fazer a cesárea e agora pode ser consultado pela operadora, em auditoria.
A intenção da ANS, ao editar a resolução, era a de que o plano poderia “glosar” (negar) o pagamento se as etapas não fossem cumpridas, e a cesárea não se justificasse. Em emergências, quando não é possível preencher o partograma, deve ser apresentado relatório médico.
Na prática, com a medida, os planos poderiam negar o pagamentos de cesáreas eletivas. Agora, o partograma e o relatório médico continuam sendo exigidos, mas, se houver cesárea eletiva, o termo de consentimento assinado pela grávida substitui os documentos.
“A resolução não deixava claro como seria o procedimento para o caso da cesárea por decisão da mulher. Tudo tem de ficar muito claro, porque as operadoras querem auferir lucro. Elas poderiam glosar (negar) o pagamento. Argumentamos que a mulher tem o direito de escolher o que é melhor para ela. Desde que o médico explique o que é o parto cirúrgico e o normal. Negociamos então a assinatura de um termo de consentimento”, explicou o obstetra José Hiran Gallo, integrante do Conselho Federal de Medicina, que participou das negociações com a ANS.
Recuo
O assessor da ANS, João Luís Barroca, negou que tenha havido recuo. “Houve uma interpretação equivocada de que as cesáreas eletivas não seriam cobertas pelos planos. A exigência do partograma e do relatório médico é porque hoje não há nada, nenhum documento. Não se sabe como um parto vira cesárea ou se é decisão da mulher. O importante é o retorno do parto a níveis aceitáveis; 85% de cesáreas é inaceitável em qualquer lugar do mundo. Não posso entrar na relação médico-paciente, mas o que nós queremos evitar são casos como o da mulher que marca o nascimento para o dia tal porque o mapa astral é mais favorável.”
Ele defende “um pacto” para reduzir o número de cesarianas na saúde suplementar, “como já aconteceu com o aleitamento materno”. “Há 30 anos, pediatras viveram bombardeio de que o leite materno não era bom. Graças à mobilização da sociedade, virou-se esse jogo.”
A resolução tem outros pontos importantes. As grávidas poderão perguntar à operadora sobre a proporção de partos normais e cesáreas que o médico faz.
As empresas terão 15 dias para fornecer a informação, sob pena de ser multada em R$ 25 mil. Elas também terão um Cartão da Gestante. Na cartilha de oito páginas, o médico preencherá informações sobre resultados de exames médicos, ultrassonografias e até mesmo tratamento dentário.
O presidente da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), Etelvino Trindade, diz que a redução de cesáreas é importante, mas que as normas deviam ter sido aplicadas após uma análise das causas do crescimento do procedimento.
“A primeira coisa a se fazer, nesses casos, é um diagnóstico de situação. Em algum momento, houve o interesse de médicos e de pacientes e isso se tornou uma cultura.” Trindade diz que a cesárea não deve ser descartada, pois é a única alternativa quando o parto normal é inviável.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.