A Polícia Militar vem reforçando o policiamento nos bairros de Perdizes e Pacaembu, zona oeste da capital paulista, para inibir invasões a imóveis desabitados. Além da ação policial, moradores se mobilizam para monitorar endereços que possam ser alvo de invasores.
Desde o início do mês, seis policiais atuam 24 horas por dia com viaturas na mesma região onde duas casas vizinhas foram invadidas no Pacaembu. "Atualmente, aumentamos o efetivo para tentar coibir novas invasões e dar uma resposta mais rápida caso elas aconteçam", afirmou o capitão Daniel Di Luca, comandante da 3.ª Companhia do 4.° Batalhão da Polícia Militar.
Os policiais que atuam na região integram a operação Diária Especial por Jornada Extraordinária de Trabalho Policial Militar (Dejem), espécie de trabalho extra desempenhado por PMs. A atividade corresponde a oito horas contínuas de policiamento ostensivo e preservação da ordem pública.
O policiamento tem inibido a ação dos invasores, segundo o capitão. "Desde que começamos esse patrulhamento, não tivemos informações de nenhuma invasão nova."
Segundo o artigo 161 do Código Penal, é crime "suprimir ou deslocar tapume, marco, ou qualquer outro sinal indicativo de linha divisória, para apropriar-se, no todo ou em parte, de coisa imóvel alheia". A pena prevista é de detenção de um a seis meses, além de multa. "Essas invasões deixaram as pessoas com medo. A gente fica imaginando se vai acontecer de novo, fica com medo de viajar e deixar a casa vazia por muitos dias", diz uma moradora que preferiu não se identificar.
"Não há sensação de insegurança. Estamos seguros. As leis estão em vigor, não estamos num país sem lei. Sobretudo, estamos cuidando uns dos outros como uma verdadeira comunidade", diz a moradora e líder comunitária Quil Dulci.
<b>Ocorrências</b>
Segundo a Secretaria da Segurança Pública do Estado (SSP), ao menos cinco ocorrências do crime de alteração de limites (apropriar-se, de forma parcial ou total, do imóvel alheio) foram registradas no 23.º DP (Perdizes), entre janeiro e abril. A Polícia Civil investiga se há relação entre os episódios. Em algumas situações, as invasões são seguidas de extorsão. Os valores, segundo relatos de moradores, já chegaram a R$ 100 mil.
Se a vítima decide não pagar, precisa recorrer à Justiça e entrar com ação de reintegração de posse. A presença de crianças, adolescentes e idosos nos locais invadidos frequentemente dificulta a reintegração, dizem os moradores.
As invasões motivaram a mobilização da vizinhança para evitar a ocupação de outros imóveis vazios. Os moradores compartilham informações pelas redes sociais e monitoram os endereços desabitados. Há seis anos, eles também organizam a chamada "Rede de Comunicação e Cooperação" entre habitantes de todas as ruas do bairro. O objetivo principal é a prevenção primária de segurança. "É basicamente: todo o mundo vigia tudo o tempo todo ", diz Dulci.
O capitão Di Luca explica que o policiamento possui restrições legais para atuar nas invasões. "Eles (os invasores) são muito rápidos e, quando já estão estabelecidos no local, o que pode acontecer até em poucos minutos, somente uma decisão judicial pode tirá-los. Legalmente não podemos tirar as pessoas à força."
<b>Legislação</b>
Segundo a legislação brasileira, a posse é protegida pelo direito e, para a retirada forçada dos invasores, é necessário que o dono do imóvel entre com uma ação judicial de reintegração de posse. O juiz pode então conceder uma liminar e emitir um mandado para que a polícia faça a remoção. "A legislação brasileira equilibra a proteção da propriedade privada com a necessidade de garantir moradia digna e a função social da propriedade", diz Armin Lohbauer, advogado especialista em Contencioso Cível do escritório Barcellos Tucunduva Advogados (BTLaw).
Quem mora na região também reforça a segurança dos imóveis, com a contratação de cães de guarda, por exemplo. Os imóveis da região se caracterizam por muros altos, portões elétricos fortificados e cercas de proteção. Moradores contam que a comunidade possui assistência particular coletiva de câmeras com inteligência artificial em todas as entradas e saídas do bairro e que fornece informações diretamente às polícias. As casas contam também com vigilância particular coletiva.
A falta de movimentação nos imóveis é uma das características observadas pelos invasores, segundo Josué Paes, presidente do Conselho de Segurança (Conseg) da área de Perdizes e Pacaembu. Nos últimos anos, surgiram vários endereços do Pacaembu com placas de "aluga-se" ou "vende-se". "Há o indicativo de que (os invasores) mapeiam, estudam e até monitoram imóveis que não estão sendo usados; observam a falta de movimentação da casa, como acúmulo de correspondência na caixa do correio", afirma. "O que é bastante dolorido na situação é saber que essas invasões são lideradas por aproveitadores que exploram a população mais vulnerável agindo de forma ilegal e criminosa. São quadrilhas que ganham dinheiro enganando e explorando pessoas que não têm onde morar e o que comer", opina Quil Dulci.
A movimentação dos moradores se intensificou após dois imóveis, um em frente ao outro, terem sido invadidos na Rua Heitor de Morais, praticamente um mês atrás. Os dois endereços estavam desabitados. Num deles, os proprietários foram avisados pelos vizinhos e conseguiram tirar os invasores com ajuda da Polícia Militar no dia 21 de abril.
A outra casa seguiu ocupada por quase duas semanas. No dia 2 deste mês, a Justiça de São Paulo autorizou a reintegração de posse. Na decisão, a juíza Lais Helena afirma que o direito à moradia deve ser garantido legalmente pelo Estado e pelo Município – conforme prevê a Lei Orgânica de Assistência Social – e pelos programas governamentais, não pelo proprietário do imóvel.
<b>Cinco famílias</b>
Em abril, o <b>Estadão</b> esteve no local e falou com integrantes do grupo de invasores. Cinco famílias, incluindo crianças, ocupavam o espaço, que tinha ligações clandestinas na rede de água e nos postes de iluminação. Eles negaram integrar movimentos por moradia e disseram ter ido para a casa da Rua Heitor de Morais depois que o imóvel onde estavam, perto da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), foi desapropriado por causa das obras da futura Linha 6-Laranja do Metrô.
Em outros locais da cidade, com presença de movimentos coletivos de luta por moradia, as ocupações permanecem. Hoje, cem famílias ocupam um prédio na esquina das Ruas Apiacás e Ministro Gastão Mesquita, na zona oeste. O edifício está com obras paradas e foi tomado em 19 de abril.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>