A Polícia Civil de Minas Gerais, o Itamaraty e as autoridades dos Estados Unidos investigam o desaparecimento de jovens brasileiras nos Estados Unidos envolvidas com a coach e modelo Katiuscia Torres Soares, que se apresenta nas redes sociais como Kat Torres (Facebook) ou Kat a Luz (Instagram). Entre elas está Letícia Maria Alvarenga, 21, de Perdões (interior de Minas Gerais, a 213 km de Belo Horizonte), que foi ao país para um programa de au pair e deixou de responder a familiares e amigos no Brasil depois de ter contato com Katiuscia. Além de Letícia, a jovem Desirrê Torres, 26, natural do Estado de São Paulo, também estaria na mesma situação. Imagens das duas aparecem em sites estrangeiros de acompanhantes.
Depois de não terem mais contato com Letícia, familiares registraram o primeiro boletim de ocorrência no dia 19 de agosto. De acordo com o depoimento prestado pelo pai, Cleider Alvarenga, à Polícia Civil de Perdões, Letícia foi para o exterior em 2019 para participar de um programa de au pair, modalidade de intercâmbio na qual o estrangeiro auxilia uma família no cuidado de crianças. Ela passou a se comportar de forma estranha há meses, depois de começar a fazer consultas com Katiuscia. A jovem pediu à família várias vezes que lhe enviasse dinheiro – ora para o próprio sustento, ora para negócios que pretendia empreender com a coach, afirmando que havia finalmente encontrado alguém que "acreditava nela".
Ainda de acordo com a família, na última vez em que Leticia esteve no Brasil, em abril deste ano, ela preferiu se hospedar em um hotel e foi à casa dos seus familiares apenas para buscar sua certidão de nascimento e carteira de trabalho.
Nas redes sociais de Katiuscia, Leticia apareceu em diversos momentos falando em nome da influenciadora e desempenhando funções que davam a entender que elas trabalhavam juntas. No dia 7 de março, por exemplo, a modelo publicou um vídeo de Leticia, no qual a jovem diz "venho falar em nome de Kat Torres porque o mundo corre perigo".
Em março, Letícia aparece em outro vídeo de Katiuscia, cuja legenda é "banho de iniciação deusa alienígena". A jovem aparece maquiada no vídeo, enquanto a coach enche a banheira com navalhas, pirulitos e bolinhas de plástico, para um suposto ritual.
Depois que o caso ganhou repercussão, Letícia fez algumas aparições, tanto no perfil de Katiuscia quanto no seu pessoal, afirmando que está bem e que não quer ser procurada. Ela aparece com o cabelo pintado de ruivo dizendo que "meu pai abusou de mim e minha mãe ia para a roça", "Kat foi a única pessoa para quem contei a minha história. Ela me disse que eu tinha que ir para os Estados Unidos e ser au pair lá".
Em vários outros vídeos, publicados em seguida, a jovem dá explicações contraditórias sobre o local em que está e os motivos pelos quais cortou relações com a família. Nesta terça, 18, ela apareceu abatida dizendo que outra jovem, Desirrê Torres, que também realizou consultas com Katiuscia Torres, estava "no cativeiro da Yasmin Brunet", depois da modelo publicar mensagens de apoio às famílias.
<b> A LETICIA NÃO ESTÁ BEM </b>
O pai de Leticia, Cleider Alvarenga, diz que a filha "não está bem psicologicamente. Todos nós, amigos e familiares, não a reconhecemos mais. O desejo da família é que ela volte em segurança para o Brasil, para que possa se tratar e poder fazer suas escolhas de vida em plena consciência". Além das autoridades brasileiras, a família também acionou a Polícia e o Consulado de Houston e formalizou denúncia junto ao departamento de Tráfico Humano.
Em resposta ao <b>Estadão</b>, o Ministério das Relações Exteriores afirma que "por meio do Consulado-Geral do Brasil em Houston, tem conhecimento da situação e está em contato estreito com as autoridades policiais norte-americanas responsáveis pela investigação do caso".
A Polícia Civil de Minas Gerais também esclarece que "a Polícia Federal já foi consultada para fornecer os registros do passaporte de movimentação internacional. Mais informações serão repassadas em momento oportuno para não atrapalhar os trabalhos investigativos". De acordo com a família de Letícia, ela deixou o País apenas no dia 14 de maio, semanas depois de ter buscado os documentos em Perdões. As investigações estão sendo conduzidas pelo delegado Pedro de Queiroz Monteiro. Josias Moreira Giffoni, delegado regional de Lavras (a 24km de Perdões), afirma que algumas pessoas já foram ouvidas no inquérito. A polícia, contudo, ainda não formalizou acusações.
"Acredito que ela está em surto e a Kat se aproveita disso para manipular ela, criar histórias fantasiosas, misturando a suposta história de vida da Kat com a da Letícia", diz o pai da jovem. "Eu faço um apelo às autoridades, para que nos ajudem."
<b>O CASO DESIRRÊ</b>
Além do caso de Leticia, amigos e familiares de outra jovem que também teria se consultado com a coach Katiuscia, Desirrê Torres, 26, afirmam o seu desaparecimento. Ela saiu do Brasil há alguns anos e cortou relações com a família depois dos primeiros atendimentos com a influenciadora.
Esta semana, Desirrê gravou um vídeo afirmando que estava feliz e viajando pela Europa. "Eu não quero falar com nenhum de vocês. Estou cansada de vocês. Não quero nenhum de vocês na minha vida. Se eu quisesse falar com vocês eu estava falando. Parem de me perseguir. Que saco, vocês são insuportáveis", diz a jovem.
Amigos e familiares suspeitam que o vídeo é ensaiado e criaram uma página no Instagram chamada @searchingdesirre , para reunir informações sobre o paradeiro da jovem. Há quatro publicações contendo relatos de mulheres que supostamente foram atendidas por Katiuscia. Elas afirmam que entregaram grandes quantias de dinheiro à coach, que tiveram contato com Desirrê e Leticia, e que recebiam promessas de que encontrariam "um marido velho e rico".
O <b>Estadão</b> entrou em contato com os administradores do perfil, mas não obteve retorno.
<b>COM A PALAVRA, A COACH KATIUSCIA TORRES SOARES</b>
A reportagem entrou em contato com a coach Katiuscia Torres Soares através da sua aba de contatos do site e pelo e-mail disponibilizado em seu Facebook. Até o momento, não houve retorno. A palavra está aberta para manifestação.
O perfil utilizado pela coach no Instagram está fora do ar. A reportagem indagou ao Instagram quem apagou o perfil. Contudo, a empresa afirma que "não comenta sobre contas de terceiros".