Mundo das Palavras

Políticos punem mulheres que os elegem

Das mulheres que abortam no Brasil, 87% são representadas no Congresso Nacional por parlamentares empenhados em punir de forma dura a interrupção da gestação, revelou a Pesquisa Nacional do Aborto 2016, financiado pelo Ministério da Saúde e realizada pelo Anis-Instituto de Bioética, em parceria com a Universidade de Brasília. 
 
São parlamentares eleitos por comunidades religiosas – sobretudo evangélicas, mas também católicas. Entre eles, os autores dos cinco projetos que visam enquadrar o aborto na categoria de crime hediondo – um dos quais apresentado pelo ex-presidente da Câmara Federal, deputado cassado Eduardo Cunha, ligado à Assembleia de Deus. 
 
Eles ocupam 24 das 28 vagas da Comissão Especial criada pelo atual presidente da Câmara Federal, Rodrigo Maia, com a missão de discutir mudanças na legislação sobre o aborto. Exatamente quando se aproxima a data de nova eleição para o cargo, no qual Maia tentará se manter, com o apoio da Bancada da Bíblia, como é chamado aquele grupo de parlamentares, abertamente contrário à interrupção de gravidez – registrou a repórter Marcella Fernandes, em matéria postada no site Brasilpost. 
 
A comissão surgiu no dia seguinte à aprovação da descriminalização do aborto, até o terceiro mês de gestação, pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal. Uma decisão que, segundo João Campos, do Partido Republicano Brasileiro, o autor do projeto “cura gay”, colocado na presidência da comissão, “rasgou a Constituição", e "veio estabelecer a morte, o assassinato, o homicídio para seres humanos indefesos". 
 
Visão oposta teve, em seu voto, o ministro-relator Luís Roberto Barroso ao defender a medida. Não para disseminar o aborto, mas para torná-lo raro e seguro, disse ele. A necessidade da decisão emergiu da pesquisa feita para o Ministério da Saúde. Seus dados mostram que, só em 2015, ocorreram 503 mil abortos no Brasil: 1,3 mil por dia, 57 por hora, quase um por minuto. 
 
A maioria entre mulheres – além de cristãs -, negras, indígenas, de menor escolaridade, moradoras do Norte, Nordeste e Centro-Oeste.  Sessenta e sete por cento delas cria filhos. Suas vidas estiveram em risco nos abortos por terem acontecido em clínicas suspeitas, banheiros e fundos de quintais – destacaram os repórteres Débora Melo e Tory Oliveira na matéria “A trincheira do aborto” publicada pela Revista Carta Capital.  
 
Por que, então, elas deram poder político a membros de suas igrejas que querem o controle não só de suas consciências como também de seus corpos? 
 
 
 

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