Saúde

Por falta de repasses do governo federal, faltam remédios para tratamento de câncer no SUS

Ao menos oito medicamentos oncológicos de alto custo incorporados ao SUS (Sistema Único de Saúde) não estão chegando aos pacientes porque o valor repassado pelo Ministério da Saúde aos hospitais não cobre o custo dessas novas drogas.

Levantamento do Instituto Oncoguia (ONG que dá apoio a pacientes com câncer) mostra que o atraso entre a incorporação e a entrega, que deveria ocorrer em 180 dias, chega a quase dez anos e afeta vários tipos de câncer avançado, como o de pulmão, de rins, de pele, de sangue, de mama e de próstata.

Os medicamentos erlotinibe e o gefitinibe, por exemplo, para tratar o câncer de pulmão que tem a mutação EGFR, deveriam estar disponíveis desde maio de 2014 nos centros oncológicos que atendem SUS (Cacons e Unacons). O custo mensal das drogas por paciente é de R$ 4.192, mas o ministério só repassa R$ 1.100.

Os chamados inibidores de ciclinas (abemaciclibe, palbociclibe e succinato de ribociclibe), para câncer de mama avançado com mutação HR+ e HER2 , são outro exemplo. Incorporados em dezembro de 2021, teriam que estar sendo ofertados desde junho de 2022, mas o valor do repasse por paciente (R$ 2.378 mensais) não cobre um quinto dos custos mensais (R$ 12.896).

“A gente está falando de pacientes metastáticos que estão sem controle adequado da doença por falta de acesso a drogas já incorporadas ao SUS. Estão perdendo a chance de ganho de sobrevida com menos efeitos tóxicos”, diz a mastologista Maira Caleffi, presidente da Femama (federação das instituições de apoio à saúde da mama).

A questão passa pelo modelo de financiamento da assistência oncológica no SUS, que é diferente em relação a medicamentos de alto custo para outras doenças, que são adquiridos pelo Ministério da Saúde e repassados às secretarias de saúde.

No caso do câncer, em geral, são os Cacons e Unacons que definem seus protocolos clínicos e fazem as compras dos remédios. Eles recebem do ministério um valor mensal por paciente, por meio da Apac (Autorização de Procedimento de Alta Complexidade), que, em tese, deveria cobrir o custo do tratamento, do remédio aos materiais para a infusão, como soro, luvas e agulhas.

“É como se cada hospital trabalhasse com um ‘cardápio’ próprio de medicamentos passíveis de serem prescritos pelo seu corpo clínico. O que está fora desse ‘cardápio, simplesmente não é oferecido aos pacientes”, diz o advogado Tiago Farina Matos, conselheiro de advocacy do Oncoguia.

Como essa escolha está diretamente atrelada ao custo do tratamento e ao valor da remuneração paga pelo ministério, grande parte dos medicamentos oficialmente incorporados ao SUS fica fora desse “menu”.

Pesquisa feita em 2017 pelo Oncoguia mostrou as desigualdades do acesso a tratamentos oncológicos dentro do SUS. Na época, nove estados tinham centros com diretrizes para câncer de pulmão metastático abaixo das recomendadas pelo ministério.

Segundo Tiago Matos, há um descaso nas diversas etapas dos processos de incorporação e pós-incorporação de antineoplásicos no SUS.

“A Conitec [comissão que avalia a incorporação de novas tecnologias no SUS] tem que pensar como vai ser a dispensação, quanto vai custar. Se for definido que será por Apac, tem que ter um valor de lastro que cubra todo o custo do medicamento”, diz.

Informações: Folha de São Paulo

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