Flamengo e Guarulhos se enfrentam pela segunda vez neste Campeonato Paulista da 4ª Divisão, em jogo válido pela 10ª rodada da 1ª fase, neste domingo, 2/06, às 10h, no Estádio Antônio Soares de Oliveira, no Jardim Tranquilidade. No primeiro clássico, acompanhado por 260 pagantes, no dia 21 de abril, o Corvo levou a melhor e venceu o rival por 3 a 1. Hoje, separados por três pontos na tabela do grupo 6, os dois clubes estão na zona de classificação para a próxima fase. O Rubro-Negro é o vice-líder da chave com 14 pontos, enquanto o Índio ocupa a quarta colocação, com 11.
Mas este início, até certo ponto animador, não esconde a frustração dos guarulhenses que veem os dois times profissionais do segundo maior município do Estado de São Paulo na última divisão do Estadual.
Para efeito de comparação, Campinas, que possui cerca de 300 mil habitantes a menos do que Guarulhos, tem suas equipes na elite do Paulista. Isto sem contar as glórias passadas. A Ponte Preta já disputou decisões da primeira divisão do Estadual. A última, inclusive, há apenas dois anos. O Guarani também já chegou a este nível. E foi além. Campeão Brasileiro em 1978, sendo o único clube interiorano a conseguir tal feito no País, o Bugre ainda decidiu o Nacional de 1986, superado pelo São Paulo nos pênaltis.
Além disto, no último dérbi campineiro, disputado no dia 16 de março deste ano, 11.287 torcedores pagaram para ver a Ponte derrotar o Guarani por 3 a 0. Ou seja, um público 4.241,15% maior do que o registrado no clássico guarulhense de 21 de abril. A renda na partida de Campinas foi de R$ 325.235.
Mas, afinal, por que há este abismo entre os clubes dos dois municípios? Por que as equipes de Guarulhos estão afundadas na última divisão do Campeonato Paulista? O GuarulhosWeb ouviu os presidentes dos dois times guarulhenses, torcedores e o secretário municipal de Esporte e Lazer, Rogério Hamam, para saber o que eles têm a dizer sobre o assunto.
O presidente do Flamengo, Edson David Filho, foi o mais sucinto ao comentar a situação do futebol guarulhense. Para o cartola, o grande problema está na falta de apoio do poder público, inclusive em gestões passadas. “Quando tivemos a oportunidade de chegar à elite, não tivemos o apoio necessário da administração pública da época, o que acabou desgastando a imagem do clube com o passar do tempo. Agora para sair daqui o mais importante é somar pessoas que gostam do Corvo no nosso dia a dia”, resumiu.
Já Ricardo Agea, presidente do Guarulhos, aprofundou-se mais na questão e recorreu à história da cidade para tentar explicar o cenário. “Teria que escrever um livro e deixar muita gente brava. A história de Guarulhos no futebol se confunde com a da cidade. Ruas estreitas para sobrar mais áreas nos lotes. Loteamento sem o planejamento correto. Uma cidade que não tem viadutos e passagens de nível. O município foi sempre explorado. No futebol não é diferente”, disse o dirigente.
Agea afirmou que Guarulhos precisa ter praças esportivas modernas e cuidadas. “Temos um estádio com uma permissão de uso. Dois ou três campos sintéticos. Fazemos futebol por amor. Necessitamos ter um bom estádio municipal e um bom centro de treinamentos para profissionais e categorias de base, além de um bom centro de recuperação e fisiologia, bons meios de transporte e alojamento para os atletas”, continuou.
O cartola do Índio ainda sugeriu uma solução para os problemas financeiros enfrentados pelos clubes da cidade. “Talvez nem todos concordem, mas, como vivo as dificuldades de se fazer futebol, digo que uma ajuda real seria uma lei de incentivos fiscais. Isto poderia motivar a indústria da cidade a patrocinar categorias de base. O poder público não pode ajudar, porém tem como criar uma atmosfera que, por si só, colaboraria a termos um ou dois clubes em melhores condições”, pontuou Agea.
O presidente do Guarulhos salientou que a Prefeitura deveria ser a responsável pelo estádio. “Assim, os clubes não precisariam dispor de recursos próprios para a manutenção, que é feita com precariedade, ou de forma paliativa”, concluiu.
Questionado sobre as falas dos cartolas, o secretário Rogério Hamam admitiu que o orçamento de sua pasta é restrito. “Não temos como negar, considerando que assuntos como educação, saúde e segurança pública devem ser prioridade para a gestão municipal. Ainda assim, temos mantido contato com os dirigentes de ambos os clubes na busca por soluções inovadoras que possam mudar o patamar do futebol profissional guarulhense”, afirmou.
Hamam também deu sua opinião sobre o motivo de Flamengo e Guarulhos estarem na 4ª Divisão. “Resultados esportivos, geralmente, não são atingidos em curto prazo, eles são reflexo de um planejamento feito para um período de alguns anos. Acredito que ambas as equipes possuam dirigentes altamente qualificados e que os times possuam potencial para melhorar seus respectivos desempenhos”, analisou.
Torcedores
O GuarulhosWeb também ouviu um torcedor de cada equipe para saber como eles enxergam este cenário do futebol guarulhense. Membro da Torcida Jovem, organizada do Guarulhos, Luiz Saraiva disse que incompetência é a palavra que define a administração do Índio. “A única palavra que eu vejo para isto. O Guarulhos tem uma administração que é distante da torcida que já existe e é incapaz de atrair novos torcedores”, avaliou.
Saraiva reconheceu que não é uma tarefa fácil ser torcedor do clube. “Não temos muitas informações do time. Não há dezenas de canais esportivos falando do clube e do campeonato. Também não é fácil quando temos casos como quando eu e outros torcedores do Guarulhos passamos por 2.000 torcedores do São José, em São José dos Campos, para conseguir assistir ao jogo”, relembrou.
“Recentemente tivemos outros dois casos interessantes. Primeiro a incerteza do jogo contra o Mauaense, já que o Flamengo ameaçava fechar os portões, e o aumento repentino do valor do ingresso do clássico. Já tentei convidar amigos também, mas quem vai? Qual atrativo? E ainda tem tantos problemas assim… Não sairá da 4ª Divisão jamais sem torcida, sem a cidade”, destacou.
Para o torcedor do Índio, a proximidade com a Capital também atrapalha os clubes guarulhenses, embora ele considere esta questão secundária. “É importante lembrar que Guarulhos e Flamengo não possuem dinheiro e ainda brigam nos bastidores, um atrapalhando o outro. Se é difícil administrar um clube e um estádio, as diretorias de ambos deveriam cuidar melhor da torcida. Estamos esbarrando até em questão de violência”, concluiu.
Torcedor do Corvo, Guilherme Gomes afirmou que há três fatores para os clubes estarem na última divisão estadual. “O primeiro, e ao meu ver o mais importante, é a falta de apoio das grandes empresas aos clubes. Quando eu comecei a acompanhar, o Flamengo tinha patrocínio de uma grande marca de bebidas (Schincariol). O time estava à beira de conseguir o acesso para a 1ª Divisão. O acesso não veio, o patrocínio foi embora e o Flamengo nunca mais teve um apoiador que incentivasse tanto o clube. O Guarulhos teve um ano em que trouxe até o Milton Neves para fazer apresentação do elenco, um bom patrocínio e uma promessa: 'Em quatro anos, estariam na elite do Paulista'. Já se passaram 13 anos desta promessa e o clube nunca conseguiu sair do último nível estadual”, recordou.
O segundo fator apontado por Gomes é o distanciamento do poder público atrelado às más administrações dos clubes. “O Flamengo foi campeão da A3 em 2008, 5º colocado na A2 de 2009 e rebaixado para a A3 em 2010 com a pior campanha. Como pode isto? Fruto de péssima administração, que gastou muito mais do que poderia. O clube, então, entrou de vez numa crise financeira. Depois disto, o Flamengo quase fechou as portas e, se não fosse a parceria com o Corinthians em 2011, não existiria mais em nível profissional. Isso é inacreditável”, indignou-se.
Por fim, o torcedor rubro-negro destacou que estar muito perto da capital dificulta a criação de uma identidade dos guarulhenses com os clubes locais. “O que o cara prefere: ir ao Antônio Soares de Oliveira ver a 4ª Divisão do Paulista ou ir, por exemplo, a Itaquera ver um jogo do Brasileirão? Se o cara tem condições, ele obviamente opta pela segunda alternativa. Se ele não tem, não vai sair de casa e gastar R$ 20 (ingresso + salgado e refrigerante) para ver um jogo de qualidade técnica duvidosa e que, pior ainda, não envolve o time do coração. Os 200, 300 que vão aos jogos são apaixonados, heróis de verdade, que ainda têm esperança”, finalizou Gomes.