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Pré-candidato, ministro Fábio Faria privilegia RN em programa de internet grátis

Em pré-campanha ao governo do Rio Grande do Norte, o ministro das Comunicações, Fábio Faria (PSD), decidiu privilegiar seu reduto eleitoral em um dos principais programas da pasta. Ele escolheu as 23 estações de trem que ligam a capital do Estado, Natal, à região metropolitana para receber pontos de acesso à internet do projeto Wi-fi Brasil, que ainda não havia beneficiado nenhuma unidade de transporte público do País.

Como revelou o <b>Estadão</b> em setembro, usuários do programa em escolas eram obrigados a assistir a uma propaganda sobre benefícios sociais da gestão do presidente Jair Bolsonaro a cada vez que se conectavam à rede. A estrutura instalada nas estações de trem em Natal também exigirá audiência cativa aos conteúdos institucionais do governo federal. Funciona assim: se o usuário precisar entrar na internet cinco vezes ao dia, ele vai ter de assistir à propaganda cinco vezes. Se demorar para usar, a rede desconecta e tem de assistir de novo.

"O programa Wi-Fi Brasil prevê, no projeto básico da implantação de pontos de acesso gratuito à internet em localidades públicas, a visualização de um vídeo de 10 segundos para divulgação das políticas públicas do governo e de informações de utilidade pública, como previsto no Decreto 6.555/2008, da Constituição, e na Instrução Normativa Secom 02/2018. Todos os usuários dispõem das mesmas condições de uso para acesso ao programa", disse o Ministério das Comunicações, em nota. Segundo a pasta, a instalação nas estações de Natal vai custar R$ 358,8 mil ao ano.

Questionado sobre o motivo de apenas Natal receber o programa nas estações de trem, o Ministério das Comunicações disse que ainda estuda a possibilidade de fazer instalações do projeto em VLTs de outros Estados, mas não explicou quais critérios foram utilizados para a escolha do domicílio eleitoral de Faria como pioneiro.

Para o diretor executivo da Transparência Brasil, Manoel Galdino, a imposição do vídeo viola o princípio constitucional da impessoalidade e configura abuso de poder por parte do governo, que se beneficia eleitoralmente da medida. "Nesse caso, a prestação de um serviço público está condicionada à audiência a uma propaganda. Imagine, se para ter acesso a uma escola ou ser atendido em um hospital fosse preciso assistir um vídeo falando bem do governo. Isso também dá vantagem eleitoral, porque a oposição não tem os mesmos meios de fazer campanha", afirmou.

Segundo Galdino, a fundamentação da escolha da capital potiguar deve ser pública, para que possa haver fiscalização de órgãos de controle, como o Tribunal de Contas da União (TCU). "Alocar recursos públicos deve sem critérios ou transparência é temerário, O TCU pode fazer uma auditoria e, se entender que os motivos para o investimento não atendem o interesse público, determinar a reformulação ou até a suspensão da política."

De acordo com os dados oficiais, o Wi-fi Brasil já incluiu 8,5 milhões de brasileiros no universo digital, ambiente no qual a base orgânica do bolsonarismo tem forte presença. A maior parte das instalações se concentra no Norte e no Nordeste, regiões onde Bolsonaro enfrenta índices menores de intenção de votos para sua reeleição, segundo pesquisas de intenção de voto.

O chefe do Executivo planeja viagens aos Estados do Ceará e da Paraíba em fevereiro. O Nordeste é a única região do País onde o candidato petista à Presidência da República em 2018, Fernando Haddad, venceu Bolsonaro.

Após a reportagem do <b>Estadão</b> revelar a exigência aos usuários do programa Wi-Fi de assistir à publicidade oficial, partidos de oposição entraram com representações no Ministério Público contra Bolsonaro por propaganda eleitoral antecipada.

<b>Pré-candidato</b>

Faria tem intensificado ataques à atual governadora do Estado, Fátima Bezerra (PT), contra quem deve disputar o cargo nas próximas eleições. "Deixou as crianças um ano e meio sem estudar. Ela é professora. O Hospital Walfredo Gurgel é um caos. Todo dia há assassinatos, mortes, explosão de farmácias", disse em entrevista ao Sistema Tribuna no último domingo (16).

Na disputa de 2018, a petista derrotou o pai do ministro, o ex-governador Robinson Faria, que concorria à reeleição. Ela rebateu as críticas por meio de nota na qual diz que a gestão anterior à sua foi responsável pelos maiores índices de violência da história do estado e quatro folhas de pagamento de servidores atrasadas.

Faria fez coro aos apelos de Bolsonaro pela reabertura da economia durante a fase aguda da pandemia do novo coronavírus. Também apoiou o que considerava "liberdade dos médicos" para prescrever medicamentos sem eficácia comprovada contra a covid-19.

"A atual gestão seguiu as orientações do Comitê Científico e dialogou com os órgãos de controle quanto à definição do momento adequado e seguro para o retorno de crianças, jovens e adultos às escolas, adequando-as às medidas sanitárias preconizadas pelas autoridades em saúde. Ao contrário da gestão negacionista a qual o ministro pertence e defende, causadora, por falta de atitude e decisão firme, de tantas perdas durante a pandemia de Covid-19", disse o governo do Rio Grande do Norte em nota.

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