O setor siderúrgico brasileiro poderá dentro dos próximos meses confirmar a expectativa do mercado e iniciar uma onda de corte de preços do aço. Sem encontrar respaldo na demanda doméstica e diante da forte queda dos preços do mineiro de ferro – a principal matéria-prima para a produção -, a percepção é de que um desconto deverá ocorrer para que as companhias consigam se ajustar ao novo cenário.
Uma redução de preços dará ao setor uma dificuldade extra, pois a atividade já vem sendo prejudicada pela deterioração dos negócios dos principais clientes das siderúrgicas, dentre eles o automotivo, cuja produção anual apresenta queda significativa, e da construção civil, com aumento dos estoques das construtoras, fora a morosidade dos investimentos em infraestrutura.
“Havia uma expectativa de aumento da demanda após a Copa, o que não ocorreu”, destaca o analista-chefe da XP Investimentos, Ricardo Kim. “As montadoras ainda estão indicando que terão férias coletivas no fim do ano e, em paralelo, há uma grande oferta de importados. Acho que as usinas terão que refazer o discurso” disse Kim, referindo-se à expectativa de manutenção de preços pela direção das empresas ao fim do primeiro semestre deste ano.
Dados apresentados pelo Instituto Nacional dos Distribuidores de Aço (Inda) na semana passada ilustram esse movimento. No acumulado de janeiro a agosto, as compras da rede de distribuição nas usinas somaram 2,851 milhões de toneladas, queda de 9,2% ante o mesmo intervalo de 2013. O presidente do Inda, Carlos Loureiro, afirmou que a pressão para um ajuste dos preços é crescente e que a queda do valor do minério de ferro é uma “espada” sobre os preços do aço no mercado brasileiro. Segundo o executivo, a recente diminuição no insumo não foi repassada ainda para os preços do aço no mercado internacional, mas é muito provável que a China pratique uma queda de 10% no seu preço do exportação de aço em breve.
Exatamente por conta da expectativa de recuo dos preços do aço na China, os analistas do BTG Pactual questionam se o atual prêmio do aço (diferença do produto nacional do importado nacionalizado), hoje em 13%, é sustentável. “Antes de se considerar que esse nível é sustentável em mercados equilibrados, temos preocupação de que a referência de preços na China possa cair diante de custos mais baixos das matérias-primas e condições fracas de demanda”, afirmam os analistas em relatório recente.
Hoje o preço da bobina a quente (HRC, na sigla em inglês) da China, exportada para Europa e Estados Unidos, está em US$ 495 a tonelada, queda de mais de 7% no ano e o valor mínimo de 2014.
Como cita Loureiro, do Inda, a queda do minério neste ano já chega a cerca de 42%, criando componente extra para a expectativa de recuo de preços, diante do menor custo para a produção. Como os clientes não vivem bom momento, a demanda é que as siderúrgicas dividam esses menores custos. “Na nossa visão, os grandes clientes da indústria siderúrgica irão buscar uma fatia da melhor margem que as usinas estão tendo diante do menor custo das matérias-primas, como minério de ferro e carvão”, destaca o analista Marcelo Aguiar, do Goldman Sachs, em relatório recente. Em seu cálculo, os contratos de longo prazo das siderúrgicas com as montadoras e autopeças deverão ser renegociados até o fim deste ano e os preços a serem implementados a partir de janeiro de 2015 poderão ficar entre 5% e 10% menores.
Para o analista da Coinvalores, Bruno Piagentini, esse ajuste nos preços acontecerá, mas deverá esperar 2015. Isso porque a percepção é de que o minério de ferro apresentará recuperação até o final do ano, por conta da expectativa de maiores compras pelas siderúrgicas chinesas, que historicamente ampliam os estoques nessa época do ano para se prepararem para o rigoroso inverno no país. “Com isso, pode haver um pouco mais de equilíbrio da oferta e demanda, mas em 2015 deverá surgir uma discussão para ajustes de preços”, conclui o analista.