Nesta terça, 15, à noite sai a premiação do 10º Fest-Aruanda. Antes da distribuição dos troféus será exibido, fora de concurso, o documentário Chico – um Artista Brasileiro, de Miguel Faria Jr. O doc é, desde já, forte candidato a outro prêmio, este informal, o de mais amado documentário dos últimos tempos. Isso porque mostra um retrato bastante amplo de um dos nossos artistas mais populares e que vem se mantendo íntegro e amado por gerações de brasileiros. Foi ótima escolha do Aruanda, para dar um fecho legal àquela que talvez tenha sido a melhor edição do evento.
Dizendo isso já se diz que o júri terá bastante trabalho para escolher os vencedores entre os longas-metragens selecionados. Não há nenhum deles que não mereça ser lembrado pela premiação, pelo menos em algum dos seus aspectos. Com muita força para os prêmios aparece Para Minha Amada Morta, de Aly Muritiba, baiano radicado no Paraná. O filme já concorreu no prestigiado Festival de Brasília e conquistou uma série de troféus. Tem de tudo para repetir a dose aqui na Paraíba.
Seu protagonista é o personagem (Fernando Alves Pinto) que vive na recordação da esposa que faleceu. Ele cultua seus objetos e até algumas fitas VHS deixadas por ela. Em uma dessas fitas, Fernando (é também este o nome do personagem) descobrirá uma faceta oculta da falecida e que o levará à busca obstinada de uma reparação problemática. Muito bem filmado e interpretado, provoca surpresas ao espectador e nunca entrega por completo o seu mistério.
Ele concorre com candidatos de peso, como os veteranos Walter Lima Jr. e Julio Bressane, cujos filmes já comentamos em texto anterior. Basta lembrar que, com Através da Sombra, Walter produz mais uma adaptação do conto A Volta do Parafuso, de Henry James, empenhando-se em narrativa clássica e bem decupada. O trabalho de fotografia de Pedro Farkas é um dos destaques. O de Virginia Cavendish, como a governanta que cuida de duas crianças numa casa soturna, é outro. Virgínia é grande candidata ao prêmio de melhor atriz.
Mas tem páreo duro pela frente. Gloria Pires encarna a mitológica doutora Nise da Silveira em Nise – o Coração da Loucura, de Roberto Berliner. O longa provocou impacto no público. A tal ponto que uma projeção extra teve de ser programada para os que ficaram de fora da sessão oficial. Gloria compõe uma Nise sóbria, incisiva, humana e solidária. Exatamente como supomos tenha sido a Nise da vida real, com seu trabalho pioneiro com os internos do Hospital Psiquiátrico do Engenho de Dentro, baseada nas ideias de Carl Gustav Jung.
Os dois filmes mais ousados do festival são Garoto, de Julio Bressane, versão muito pessoal de um relato de Jorge Luis Borges sobre Billy the Kid, e o insólito documentário Invólucro, de Caroline Oliveira. Ela documenta sua própria gravidez e, quando pensamos que irá procurar personagens semelhantes para discutir esse tema, propõe entrevistas com duas mulheres sem filhos e uma transexual. No fundo, seu filme é um interessante debate sobre a imagem do corpo feminino, tal como ele é visto pelas próprias mulheres.
Travessia, de João Gabriel, surge um pouco como azarão. É a narrativa (correta) sobre um homem, Roberto (Chico Diaz), que acaba de perder a esposa e se relaciona mal com o filho. Ao atropelar um garoto, Roberto entra definitivamente em crise o que, na sua condição, pode até ser produtivo. Os caminhos da história nunca são óbvios. A ponto de desconcertar espectadores mais convencionais. Chico Diaz é um óbvio candidato a melhor ator.
Entre os curtas, a qualidade foi menor. Dois deles se destacam e devem concentrar os prêmios, caso o júri seja justo. Sinaleiro, de Daniel Augusto, adapta um conto de fantástico de Charles Dickens. Tem alta qualidade de elaboração. Mais inventivo é Praça de Guerra, de Ed Júnior, divertida e comovente história da formação de um foco guerrilheiro em Catolé do Rocha durante os anos da ditadura. Merece o prêmio principal.