A corrida por hedge (proteção) por parte de empresas e investidores com compromissos em moeda estrangeira foi o fenômeno que, no Brasil, impulsionou as cotações do dólar à vista nas últimas semanas. O gatilho para o movimento foi a perspectiva de mais elevações dos juros nos Estados Unidos, além das preocupações em torno do comércio internacional, em meio às disputas entre o governo de Donald Trump e a China.
Com a expectativa de juros mais elevados nos EUA, aumentou a tendência de saída de dólares de países emergentes. Um dos exemplos mais claros disso é a Argentina, onde a fuga de divisas acabou por forçar um acordo de auxílio com o Fundo Monetário Internacional (FMI). “Só que o mercado brasileiro é mais sofisticado que o de outros emergentes”, pontua o economista Sidney Nehme, da NGO Associados Corretora de Câmbio. “Temos outros instrumentos. Em um primeiro momento, em vez de saírem correndo do País, os investidores buscam proteção.”
O fato de o mercado de derivativos cambiais no Brasil ser muito mais líquido que o de moeda física acabou evitando uma debandada de dólares neste primeiro momento. Atualmente, enquanto os negócios com o dólar à vista somam em torno de US$ 1 bilhão por dia, o mercado de dólar futuro – o mais líquido – chega atingir 15 vezes este valor. “Com a busca por proteção, a cotação no mercado futuro de dólar subiu, o que acabou contaminando o dólar à vista”, explica Nehme.
Somente em abril, o dólar à vista avançou 6% ante o real, para acima dos R$ 3,50. O dólar turismo – que sempre opera em patamares mais elevados – atingiu os R$ 3,65.
A busca por hedge ficou nítida entre os investidores estrangeiros. No fim de março, eles carregavam uma posição comprada em contratos de dólar futuro de US$ 1,944 bilhão. No fim de abril, essa posição já era 595% maior, de US$ 13,493 bilhões. Na prática, uma posição comprada significa que os investidores travaram um valor para o dólar.
Se a moeda americana se valorizar – o que vem ocorrendo nas últimas semanas – quem está comprado em dólar terá ganhos com o movimento ou pelo menos evitará perdas. É a “proteção” contra as oscilações da moeda.
Assim, se estes investidores decidirem de fato deixar o Brasil mais à frente, essa proteção evitará perdas no momento da conversão dos investimentos. Operações de hedge cambial como esta também costumam ser feitas por meio de contratos de cupom cambial (DDI), que refletem a taxa de juros em dólares no Brasil.
Dólar travado
No caso das empresas, houve procura por hedge em dólar futuro, mas o movimento ficou mais nítido no caso dos contratos a termo de moeda. Por estes contratos, uma empresa trava o valor do dólar numa cotação específica. Assim, se a moeda disparar, a empresa comprará dólares na cotação contratada, no momento de efetuar o pagamento do compromisso. Empresas muitas vezes dão preferência a estes contratos porque, ao contrário do dólar futuro, eles não exigem margem para ajustes financeiros diários.
Os dados da B3 (a bolsa de valores de São Paulo) mostram que a compra de dólares a termo pelas empresas aumentou 9,7% de março para abril. São empresas que em alguns meses terão de pagar algum compromisso no exterior e que, em função do avanço do dólar, decidiram travar agora as cotações.
“Muitas empresas que não fizeram o hedge lá atrás estão buscando a proteção agora”, afirma o diretor da consultoria Wagner Investimentos, José Faria Júnior. O medo é de que, com a pressão vinda de fora e as indefinições em torno da eleição presidencial no Brasil, a alta do dólar continue nos próximos meses. O efeito dessa busca por hedge é o de manter o suporte às cotações da moeda americana à vista. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.