"Não lembro nem se é homem ou mulher." A declaração é da eleitora Luane Nepomuceno, estudante de Administração da Universidade de São Paulo (USP) e consultora de estratégia empresarial, sobre em quem ela votou para vereador nas eleições municipais de 2020. Assim como a jovem de 23 anos, quase 60% dos eleitores paulistanos também não têm essa lembrança.
A "amnésia eleitoral" captada na pesquisa Viver em São Paulo – feita pela Rede Nossa São Paulo em parceria com o Ipec -, segundo analistas, evidencia o grau de afastamento da população de seus representantes nos Legislativos. De acordo com o levantamento, 58% dos eleitores da cidade disseram não se recordar do candidato escolhido para a Câmara Municipal, ante 37% que afirmaram saber em quem votaram.
Os dados apontam ainda que as instituições políticas municipais estão mal avaliadas. Para 57% dos entrevistados, a atuação da Câmara Municipal de São Paulo é "ruim/péssima". Apenas 8% disseram que ela é "ótima/boa" e 27% declararam que a consideram "regular". Ainda segundo a pesquisa, 25% não souberam responder sobre como funciona o andamento de projetos na Casa.
Na avaliação da diretora de Inteligência e Insights do Ipec, Patrícia Pavanelli, os dados deixam evidente também o distanciamento dos eleitores com os candidatos, sejam eles eleitos ou não. "Isso ajuda a entender um pouco como é que a população lida com a questão. Pensando no dia a dia, a população pode não estar observando ganhos no trabalho da Câmara, o que se reflete na avaliação negativa da Casa", disse Patrícia.
O cientista político George Avelino, da Fundação Getulio Vargas (FGV), destacou que a falta de memória eleitoral é comum tanto para o Legislativo federal como para o municipal. "É um número preocupante, mas não é muito diferente do Congresso Nacional e da Assembleia Legislativa", afirmou. De acordo com ele, existe "um descontentamento geral em relação à política". "E há uma perspectiva de que a política é uma atividade criminosa."
<b>Administração</b>
A avaliação da atual administração municipal é negativa, conforme o levantamento. Para 45% dos entrevistados, a gestão é "ruim/péssima" – um aumento de 10 pontos porcentuais em relação ao ano anterior e o segundo pior resultado na série histórica da pesquisa, que é realizada desde 2008. Já 13% consideram a administração "ótima/boa" e 39% a classificaram como "regular".
A pesquisa mostrou também que 48% dos paulistanos consideram a administração municipal "pouco ou nada transparente" em relação à divulgação de informações sobre a gestão, metas e prestação de contas. Em comparação com 2019, houve um aumento de 7 pontos porcentuais.
Para o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), as ações da Prefeitura devem ser mais divulgadas. "Nós, como Prefeitura, precisamos melhorar a nossa comunicação para que as pessoas também possam ter a percepção do que está sendo feito", disse Nunes.
Luane também defendeu uma Prefeitura e uma Câmara Municipal mais "acessíveis" à população, com "mais transparência e menos retórica".
<b>Instituições</b>
Pela quinta vez consecutiva, as igrejas aparecem na liderança entre as instituições que mais contribuem para a melhoria da qualidade de vida dos paulistanos (22%). Em seguida, vêm as associações de bairro (18%) e as ONGs que trabalham e atuam nas comunidades (15%).
Patrícia Pavanelli, do Ipec, disse acreditar que a predominância da igreja no topo do ranking se explica por ela ser um local de "acolhimento" para as pessoas. "A população se sente acolhida porque a porta está aberta. Você não bate na porta do prefeito, você não bate na porta da Prefeitura para pedir acolhimento."
<b>Qualidade de vida</b>
Pelo segundo ano consecutivo, a avaliação da qualidade de vida na cidade foi negativa. A porcentagem dos que consideravam que a vida tinha piorado "muito ou um pouco" era de 28% em 2019. Em 2020, esse número passou para 43%. Hoje, são 37%. Já a percepção de melhora na vida dos paulistanos foi de 31% em 2019. Nas pesquisas seguintes, a avaliação passou para 19% em 2020 e 21% em 2021.
Entre os entrevistados no levantamento, 57% afirmaram que sairiam da cidade se pudessem. O desejo de deixar São Paulo foi mais expressivo entre os que possuem renda familiar superior a cinco salários mínimos (72%), os que têm ensino superior (69%) e os que têm entre 25 a 34 anos e são da região norte (67%).
O coordenador da Rede Nossa São Paulo, Jorge Abrahão, observou que há uma relação direta entre os números do levantamento. As pistas que indicam o desejo dos paulistanos de se mudar, afirmou Abrahão, estão nas três coisas que eles menos gostam na cidade: a violência (33%), a criminalidade (17%) e o trânsito (14%).
A pesquisa Viver em São Paulo foi feita com pessoas que residem na cidade, com 16 anos ou mais. A aplicação das entrevistas foi online e domiciliar, com questionário estruturado. Um total de 800 entrevistados foram ouvidos entre os dias 4 e 28 de dezembro. O intervalo de confiança da pesquisa é de 95% e a margem de erro é de três pontos porcentuais para mais ou para menos.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>