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Quem foi Patricia Highsmith, controversa autora de livro que inspirou Ripley, da Netflix?

Calculista, amoral e astuto, Tom Ripley é um dos personagens mais populares da literatura norte-americana. Criado por Patricia Highsmith (1921-1995), o vigarista apareceu pela primeira vez no livro <i>O Talentoso Ripley</i>, de 1955, que acaba de ganhar uma nova adaptação pela Netflix: a minissérie <i>Ripley</i>, na qual o charmoso trambiqueiro é vivido pelo ator irlandês Andrew Scott.

Na trama, Tom Ripley é um nova-iorquino que pratica pequenos golpes até ser contratado por um milionário para ir à Itália atrás de seu filho, Richard Greenleaf (Johnny Flynn), ou Dickie, e trazê-lo de volta aos Estados Unidos. Chegando na Europa, Ripley finge conhecer o rapaz enquanto se embrenha por um mundo recheado de luxo e beleza. Marge (Dakota Fanning), namorada de Dickie, suspeita das intenções de Tom. Ele, porém, sendo mestre na arte de mentir, não demora para conquistar a confiança do ricaço.

A nova produção aposta no formato seriado para dar maior vazão às ambiguidades do trapaceiro. O thriller já ganhou outras versões no passado, com destaque para os filmes <i>O Sol por Testemunha</i>, de 1960, e <i>O Talentoso Ripley</i>, de 1999, protagonizados por Alain Delon e Matt Damon, respectivamente.

O interesse do audiovisual em reviver o vigarista é facilmente justificado: na série de livros de Highsmith, que ganhou outros quatro volumes entre 1970 e 1991, as peripécias de Ripley levam o leitor a torcer pelo anti-herói, por mais nefastas sejam suas lorotas. A fórmula se repete em outras obras da autora que, ao narrar crimes, prefere a dimensão psicológica do que o simples mistério.

<b>Quem foi Patricia Highsmith</b>

A profundidade – por vezes sombria – de Tom Ripley, bem como de outras criações de Patricia Highsmith, vem da própria personalidade da americana, marcada por excentricidades e visões de mundo no mínimo controversas. Nascida no Texas, a autora morou parte de sua vida em Nova York e outra parte como expatriada na Europa. Ela começou a carreira como roteirista publicitária e escritora de quadrinhos e contos, mas logo ganhou notoriedade com seus livros, tornando-se um dos nomes mais prolíficos da literatura de suspense norte-americana.

Sua primeira obra foi <i>Pacto Sinistro</i> (<i>Strangers on a Train</i>), publicada em 1950. No ano seguinte, a trama ganhou uma adaptação hollywoodiana dirigida por Alfred Hitchcock.

"O mórbido, o cruel, o anormal me fascina", disse ela uma vez. De fato, suas histórias são centradas no lado obscuro humano: relacionamentos destrutivos, roubo de identidade, traição e assassinatos estão no centro de seus principais romances. Além de imaginar os mais funestos cenários, Highsmith emprestava suas obsessões, medos e desejos aos seus personagens, ao passo que examinava as profundezas da psique humana. Criou, assim, tramas consideradas repulsivas e irresistíveis.

A autora foi uma pessoa muito reservada e até solitária. Grande parte do que se sabe sobre sua vida íntima veio à tona com revelações de amigos e conhecidos, e, principalmente após sua morte, com a publicação de seus extensos diários, em 2021. Mesmo neles, não raro se autocensurava ao desabafar.

A americana teve uma infância traumática, marcada pela relação tóxica com a mãe. Esta adorava lhe contar sobre como tentou abortá-la durante a gravidez. Mais tarde, abandonou a filha com a avó por um ano, indo viver em outra cidade sem maiores explicações. Os ressentimentos familiares se estenderiam por toda a vida de Highsmith, aparecendo não somente em sua escrita particular como também na ficção.

Highsmith é descrita como uma mulher amarga, viciada em álcool e com manias esquisitas, como criar centenas de lesmas e carregá-las em sua bolsa. Tinha opiniões altamente contestáveis e guardava todo tipo de preconceito. Em seus diários, tecia comentários abertamente misóginos, racistas e antissemitas – ela com frequência dizia que o Holocausto não havia ido longe o suficiente. Por outro lado, pessoas que se relacionaram com a autora já a descreveram como uma pessoa romântica, em busca perpétua pelo amor. Em 2022, foi lançado o documentário <i>Loving Highsmith</i>, que traz depoimentos de alguns de seus Affairs.

A autora descrevia em seus diários relacionamentos conturbados (e até violentos) com diversas amantes. Ela tinha dificuldade em manter as pessoas em sua vida e sabotava relacionamentos. Ao longo da vida, Highsmith tentou lutar contra sua sexualidade como mulher lésbica, chegando até a frequentar terapia com o objetivo de "curar" sua atração por mulheres.

Em 1952, ela publicou sob um pseudônimo o romance <i>The Price of Salt</i>, em que narra o encontro entre uma jovem vendedora e uma dona de casa infeliz, que acabam se envolvendo romanticamente. É o livro mais autobiográfico da autora, inspirado em um acontecimento real (na ocasião, ela teria ficado obcecada por tal mulher, rica e mais velha). Na época, rompeu padrões por dar um final feliz para um casal lésbico, algo raro naquele período.

O tom destoa do restante da obra de Highsmith, que só revelou sua autoria nos anos 1990, pouco antes de morrer, quando a trama foi republicada com novo título, <i>Carol</i>. O livro foi adaptado para o cinema por Todd Haynes em 2015, com Rooney Mara e Cate Blanchett.

<b>Confira livros de Patricia Highsmith disponíveis no Brasil</b>

O Talentoso Ripley (Intríseca; 322 páginas; R$ 79,00)
Em Águas Profundas (Intríseca; 336 páginas; R$ 64,71)
Ripley Subterrâneo (Intríseca; 365 páginas; R$ 31,90)
Carol (L&PM; 312 páginas; R$ 49,90)
Os Gatos (L&PM; 128 páginas; R$ 16,80)
O Livro das Feras (L&PM; 268 páginas; R$ 32,77)
Um Jogo para os Vivos (L&PM; 304 páginas; R$ 23,90)
O Tremor da Suspeita (Benvirá; 312 páginas; R$ 25,00)
Sem Saída (Benvirá; 326 páginas; R$ 42,99)
Este Doce Mal (Benvirá; 320 páginas; R$39,90)
Nada é o que Parece Ser (Benvirá; 632 páginas; R$ 80,00)
A Talentosa Highsmith, biografia por Joan Schenkar (Biblioteca Azul; 816 páginas; R$99,90)

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