Ainda que discretamente, uma parte dos trabalhadores está conseguindo repor as perdas com a inflação do último ano no Brasil nas negociações salariais em 2022. Nos primeiros seis meses deste ano, 56,6% das negociações salariais ficaram em linha ou acima da inflação, de acordo com levantamento do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), que compilou informações sobre 6,7 mil negociações em todo o País registradas no Ministério do Trabalho até junho.
O resultado indica uma mudança em relação ao mesmo período de 2021, quando 52% das negociações salariais ficaram abaixo da inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).
O mês de junho é o que mais se descolou da tendência que vinha sendo observada ao longo do ano. No último mês do semestre, o número de negociações que resultaram em reajuste acima da inflação ficou em 96 das 261 negociações concluídas, enquanto 69 ficaram abaixo do INPC. O que se vê geralmente é o oposto.
O técnico responsável pelo Sistemas de Acompanhamento de Informações Sindicais do Dieese, Luis Ribeiro, explica que há negociações atrasadas e ainda é cedo para afirmar que o mês foi o ponto de partida para a virada de jogo para um cenário mais positivo.
"Desde pelo menos 2018, percebemos uma piora gradual (dos reajustes). O que vimos em 2022 é que há certa estabilização em um patamar alto de categorias que não conseguem reajuste igual ao INPC", disse. A hipótese de Ribeiro para esse ponto fora da curva é a desigualdade regional e setorial: em junho há mais negociações da região Sul e também do comércio e indústria, que apresentam resultados mais positivos.
<b>DESEMPREGADOS</b>
O economista e professor da FGV-SP Renan Pieri afirma que o fato de mais trabalhadores estarem conseguindo reajustar seus salários pela inflação também está relacionado ao fato de haver um estoque menor de desempregados no País. "O mercado de trabalho para 2022 é mais positivo do que em 2021. Isso se deve primordialmente ao pico de casos de covid-19 observado no primeiro trimestre do ano passado. Naquela época, várias cidades ainda estavam com restrição de pessoas e de funcionamento de comércio, o que implicava uma redução significativa dos postos de trabalho."
Mesmo assim, uma parte considerável dos reajustes ainda ficam abaixo do INPC, cujo valor acumulado nos últimos 12 meses é de 11,92%. "Esses 43,4% (de reajustes abaixo da inflação) são o retrato da tremenda precariedade do mercado de trabalho, e o ato de não se fazer o reajuste à luz do INPC, IPCA e IGP-M é uma demonstração da fragilidade que existe nos contratos e nas negociações", afirmou Istvan Kasznar, professor da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da FGV.
Além disso, o movimento não é disseminado em todos os segmentos da economia. Proporcionalmente, o setor que mais conseguiu reajustar acima do INPC neste ano foi a indústria, com 26,8%, seguida pelos serviços ( 20,0%) e o comércio (15,7%). Já nos serviços, 50,9% dos salários ficaram abaixo da inflação. Historicamente, o setor apresenta os piores índices por ser uma área com vínculos trabalhistas mais precários.
Até agora, o reajuste mais robusto foi de 31,14% (variação real de 16,60%), a serem aplicados nos pagamentos de trabalhadores em Entidades Recreativas Assistenciais de Lazer e Desporto do Distrito Federal.
Em segundo lugar, vem o reajuste de 22,28% ( 9,28% real) obtido pelo Sindicato dos Trabalhadores em Pesquisa, Ciência e Tecnologia de São Paulo para os funcionários da Fundação de Apoio ao Instituto de Pesquisas Tecnológicas (FIPT).
Até o primeiro semestre de 2021, 4,9 mil negociações haviam sido concluídas, ou seja, 1,8 mil negociações a menos que neste ano. Sobre essa diferença, Ribeiro, do Dieese, afirma que vários indicadores estão mostrando que talvez haja uma certa melhora da economia.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>