Quatro em cada dez municípios paulistas fecharam no vermelho o primeiro ano da recessão econômica brasileira. Levantamento do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE) detectou que 263 cidades (41%) registraram déficit financeiro em 2015, quando o PIB nacional encolheu 3,8%. Em 197 das prefeituras, o rombo foi superior a 25% da receita.
O retrato fiscal é apenas uma das 230 fotografias analisadas pelo TCE sobre cada um dos 644 municípios que fiscaliza – apenas a capital fica de fora porque é fiscalizada pelo Tribunal de Contas do Município (TCM) – , com base no Índice de Efetividade da Gestão Municipal (IEGM), que foi criado em 2014 para avaliar os resultados das políticas públicas nas cidades.
“É uma mudança de paradigma no modelo de auditoria. Antes a gente analisava a conformidade e a legalidade das contas, se estavam cumprindo o mínimo constitucional de gastar 25% com educação, por exemplo. Agora, a gente mede a qualidade dos gastos, se ele resultou na melhora do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica)”, explica o presidente do TCE, Sidney Beraldo.
Com base em um questionário respondido pelas prefeituras, a Corte avalia anualmente os resultados das ações municipais em sete áreas (Educação, Saúde, Planejamento, Gestão Fiscal, Meio Ambiente, Proteção aos Cidadãos e Tecnologia da Informação). Com os dados compilados e auditados, o TCE classifica os 644 municípios em cinco categorias de gestão, que vai do “altamente efetiva” até a do “baixo nível de adequação”.
Segundo o IEGM, 424 municípios, 67% do total, tiveram uma gestão efetiva em 2015, ou seja, com índices que variaram entre 60% e 75% da nota máxima para cada área avaliada. Apenas 63 cidades (10%), entre as quais São Bernardo do Campo, São José dos Campos e Sorocaba, foram classificadas como muito efetivas. Nenhum município foi enquadrado como altamente efetivo na análise das sete áreas.
Na gestão fiscal, por exemplo, o maior déficit financeiro foi registrado pela cidade de Santos, no litoral paulista, com rombo de R$ 258 milhões. A prefeitura de Santos, porém, administrada pelo prefeito Paulo Alexandre Barbosa (PSDB), já contestou dados do TCE e afirmou ter registrado superávit de R$ 76,4 milhões em 2015. Por isso, completa, “apresentou defesa perante o TCE demonstrando os números oficiais e reais da execução orçamentária de 2015 e apontando as divergências entre os dados publicados e os apresentados pelo TCE”.
Planejamento
Responsável pela adoção do índice em São Paulo, o conselheiro Sidney Beraldo acredita que o “principal indicador” responsável pelo desempenho das prefeituras é o de Planejamento. “Constatamos uma inconsistência muito grande entre o Plano Plurianual (PPA), que são as metas para quatro anos, com a Lei Orçamentária Anual (LOA). Cerca de 40% das metas do PPA não são executadas por falta de recursos previstos. Não há uma aderência entre as metas estabelecidas e o resultado final”, diz.
De acordo com o IEGM, por exemplo, quase 85% dos municípios paulistas aplicaram menos de 15% da receita arrecadada em obras e programas. Cerca de 12%, ou 81 cidades, investiram menos de 2% do que arrecadaram e só 17 municípios (2,8%) aplicaram mais de 15% em novas ações, que não incluem gastos de manutenção e pagamentos de salário a servidores.
Educação
A área da Educação é que a tem mais itens avaliados pelos auditores do tribunal, que vão da qualificação dos professores à qualidade da merenda escolar. O levantamento constatou, por exemplo, que só 422 escolas municipais (8%) do Ciclo 1 (1.º ao 5.º ano) do Estado oferecem ensino em tempo integral, com pelo menos sete horas/aula por dia. No caso da pré-escola, o índice é de 25% e nas creches, de 76%. A meta do Plano Nacional da Educação é que pelo menos 25% do total de alunos da educação básica tenham educação em tempo integral.
Ainda segundo o IEGM, 30% das escolas do Ciclo 1 não possuem laboratório de informática, 48% dos municípios paulistas não entregaram uniforme escolar aos alunos, 44% não entregaram kit escolar e 48% das creches, pré-escolas e escolas do Ciclo 1 precisam de algum tipo de reparo, como conserto de janelas, rachadura, infiltração e fiação elétrica.
Na Saúde, o levantamento constatou que apenas 437 dos 644 municípios têm alvará de funcionamento da vigilância sanitária em todos os locais de atendimento médico ou hospitalar e o tempo médio de espera para realizar um exame clínico na rede pública municipal é de 28 dias. Na área ambiental, o TCE apurou que no ano da pior crise hídrica da história do Estado, 411 cidades (63,8%) não possuíam plano emergencial com ações no caso de escassez de água potável.
As prefeituras têm até o fim de março para responderem o questionário do IEGM. Depois, técnicos do TCE compilam e checam os dados enviados e encaminham relatório aos auditores e conselheiros, que analisarão e julgarão as contas municipais daquele ano, podendo aprová-las ou rejeitá-las. A partir deste ano, o modelo será adotado pelos tribunais de contas dos demais Estados do País.
Beraldo afirma que o TCE já está trabalhando para lançar um índice semelhante para medir a eficiência das políticas públicos do governo do Estado, que também é fiscalizado pelo órgão. “E devemos levar em conta as regiões do Estado, que possuem realidades sociais e econômicas diferentes”, afirma.