Durante uma tempestade em alto-mar, é preciso diminuir a superfície de contato da vela com o ar. Ou seja, para continuar navegando, é preciso rizar. O verbo foi escolhido pelo cantor e compositor Zé Pi para dar nome a seu primeiro disco, que ele lança nesta terça, 21, em show gratuito no Sesc Pompeia, como parte do projeto Prata da Casa.
Produzido por Gustavo Ruiz, o álbum, curiosamente, não faz qualquer referência direta ao mar. Mas há nele um pouco de brisa, um pouco de vento, e até de tormenta. Em nove canções, o músico apresenta o amor e suas decorrências em diferentes fases. Paixões, brigas, riscos, desacertos. Tudo é descrito em músicas de roupagem pop, com arranjos sofisticados. Guitarras e sintetizadores convivem com violinos, fagotes, clarinetes e violoncelos.
O músico, que nasceu em Campinas, passou infância e adolescência em Bragança Paulista e mudou-se para São Paulo há 14 anos, para fazer faculdade de Comunicação e Multimeios na PUC, carrega desde cedo o que é hoje nome artístico. José Ulpiano de Castro Del Picchia herdou seu segundo nome do avô. Vovô Pi, como era chamado. Então, José Ulpiano virou naturalmente Zé Pi.
Bisneto do poeta modernista Menotti Del Picchia (1892-1988), teve seu primeiro contato com a música por intermédio do pai. “Ele compunha também, e tinha umas músicas muito emotivas. Lembro de chegar em casa um dia e ele estava tocando piano. E eu corri pro meu quarto porque não aguentei a emoção. Ainda não entendia direito aquilo; tinha uns 4 anos”, conta o artista, durante encontro com o jornal O Estado de S.Paulo.
É essa mesma emoção que Zé coloca em suas canções, assumidamente autobiográficas. “Sempre fui muito romântico, minhas relações são muito intensas; e minhas músicas nascem naturalmente disso. Ao falar de mim, das minhas dores, das minhas experiências, eu falo de tudo, da complexidade das relações humanas”, observa.
Em Rizar, uma das faixas mais bonitas e sensíveis é Anoiteceu, em que ele divide a voz com Leo Cavalcanti. Juntos, entoam um refrão aparentemente simples (“Eu vou esperar você acordar/ Já é de manhã”), que ganha contornos mais profundos ao se observar os versos iniciais: “Anoiteceu no seu coração/ E mais ninguém aparece por lá”.
Nela, os arranjos de cordas feitos por Jaques Mathias traduzem a delicadeza da canção. “A abertura de Anoiteceu é muito imagética, muito cinematográfica. Na primeira vez que escutei, logo pensei num filme da Atlântida”, conta Zé, fazendo referência ao estúdio brasileiro que despontou nos anos 1940.
Formado por viola, violoncelo e dois violinos, o quarteto de cordas também tem presença decisiva em Dor e Solidão. É ele que dá um final inesperado e vibrante, com influências da disco music setentista, a uma letra que teria tudo para ser melancólica: “Se hoje o tempo é meu amigo/ E insiste em mudar/ Antes tivesse desistido/ Para nunca encontrar/ Dor e solidão”.
Essa tristeza travestida de alegria percorre, aliás, vários momentos dançantes do disco. “É um lamento, mas é um festejo. Um jeito de celebrar a beleza da tristeza, porque tudo na vida deve ser celebrado, e a tristeza faz parte disso”, analisa.
Tulipa Ruiz é das participações especiais do álbum. Zé Pi já tinha feito dueto com ela no primeiro CD da cantora, Efêmera, lançado em 2010. Juntos, gravaram Só Sei Dançar com Você, que integrou a trilha sonora da novela Cheias de Charme, da Rede Globo. Agora, ele retribuiu o convite e chamou Tulipa para cantar Depois.
Parceria com Guilherme Calzavara, a canção fez parte do repertório da banda Druques, na qual Zé iniciou sua carreira em 2005, como vocalista. De lá para cá, ele também compôs trilhas para peças do Teatro Oficina.
Um lado mais alegre e divertido do disco aparece em faixas como Se Você Soubesse e Acredito. “É quase uma homenagem ao gênero rock. Elas são mais animadas, mais maliciosas, mais libidinosas; falam de outro momento de uma relação.”
Enquanto a primeira soa provocativa (“Se você soubesse/ Que o que você merece/ Eu posso dar”), a segunda sugere um convite (“O jeito é não olhar pra trás/ O jeito é não fugir de mim”). Em ambas, a levada roqueira é reforçada por um coro feminino, composto por Bárbara Eugênia e Karine Carvalho.
Rizar é encerrado com a faixa Bem Melhor do Que Está, que, logo de cara, sentencia: “É, tudo podia estar bem melhor do que está”. Um verso que se transmuta sutilmente, ao final, para: “Tudo há de ficar bem melhor do que está”. Como um sopro de otimismo, após passar por momentos tão revoltos.
No palco
Músicos que fizeram parte do disco (disponível para download gratuito pelo site www.zepimusic.com) acompanham o artista no show desta terça, 21, à noite. A banda inclui nomes como Richard Ribeiro (bateria), André Lima (teclado) e Meno Del Picchia (baixo), irmão de Zé Pi, que também é cantor e compositor.
O quarteto de cordas, tão fundamental à sonoridade de Rizar, também estará no palco, ainda que com músicos diferentes dos que entraram em estúdio. E Leo Cavalcanti repete, na Choperia do Sesc Pompeia, o dueto que fez com ele no disco, cantando Anoiteceu. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.