Objeto de discussões no Banco Central nos últimos meses, as estimativas de taxa de juros real neutra no Brasil foram objeto de estudo em boxe do Relatório Trimestral de Inflação (RTI). Neste mês, o BC decidiu elevar a sua estimativa de 4,0% para 4,5%, citando como fatores, na ata do Comitê de Política Monetária (Copom) uma possível elevação das taxas de juros neutras nas principais economias e a resiliência na atividade brasileira em meio a um processo desinflacionário lento.
Além disso, o BC mencionou a análise de modelos auxiliares que incorporam diferentes metodologias.
No boxe apresentado no RTI nesta quinta-feira, 29, o BC apresenta diversas estimativas da taxa de juros neutra da economia brasileira, obtidas utilizando diferentes metodologias, com a ressalva de que outras abordagens estão presentes na literatura e podem ser consideradas no processo decisório da autoridade monetária.
No boxe, o BC calculou a média e a mediana dos resultados de cada uma das metodologias para a taxa de juros real neutra do primeiro trimestre de 2023. Elas são de 4,8%.
São apresentadas as seguintes metodologias: taxa de juros reais ex-ante da pesquisa Focus, taxas neutras de baixa e alta frequência, taxas reais de mercado descontado o prêmio a termo, paridade descoberta de juros, modelo semiestrutural de pequeno porte, modelo Samba e as estimativas dos analistas consultados pelo Questionário pré-Copom.
<b>Panorama internacional</b>
O Relatório Trimestral de Inflação trouxe ainda um boxe com um panorama internacional das taxas de juros neutras. A autoridade monetária aponta que, nas décadas que antecederam a pandemia de covid-19, houve uma redução significativa e sustentada das taxas de juros reais de equilíbrio em diversos países. "Com a elevação das taxas de juros reais ao redor do mundo desde 2021 em resposta à elevação das taxas de inflação, surge o debate sobre o quanto desse aumento no cenário pós-pandemia seria temporário ou refletiria de fato alterações nas taxas de juros reais de equilíbrio das economias avançadas e emergentes, refletindo mudanças estruturais relevantes", acrescentou o documento.
O documento traz uma tabela com as taxas neutras estimadas de um grupo de países pré e pós pandemia. No caso do Brasil, a taxa neutra passou de 3,0% no RTI de dezembro de 2020 para 4,5% agora. Da mesma forma, houve aumento nas taxas neutras dos Estados Unidos (0,6% para 1,0%), Canadá (0,8% para 1,0%) e Colômbia (1,2% para 2,0%).
A lista segue com estabilidade nas taxas neutras de Peru (1,5% antes e depois), México (2,6%), e Reino Unido (0,6%). Por fim, há ainda países em que a taxa neutra estimada caiu, como Chile (1,0% para 0,8%) e Índia (1,7% para 0,9%).
"A experiência internacional ainda não identificou de forma definitiva o efeito da pandemia no nível das taxas naturais de juros. Mesmo em países onde as autoridades monetárias estimam elevação das taxas neutras no cenário pós-pandemia, à exceção do endividamento público, não houve alteração nos seus principais determinantes, sinalizando que pode haver um retorno ao patamar anterior à pandemia", apontou o documento.
Mais uma vez, o BC destacou as dificuldades em se estimar a taxa de juros de equilíbrio, já que "ela não é observável e sua estimação contemporânea é sujeita à elevada incerteza". Entre os fatores considerados para se projetar essa taxa estão a variação da produtividade e da taxa de crescimento do produto potencial, a propensão a poupar dos agentes econômicos, as perspectivas de longo prazo da política fiscal, fluxo de capital e inovações no sistema financeiro, entre outros.
"Assim como esses fatores variam ao longo do tempo, a taxa de juros real de equilíbrio também se altera, potencialmente aumentando a imprecisão de sua estimativa em tempo real", afirmou o BC.
Citando trabalhos acadêmicos, o boxe aponta que o aumento do endividamento público gera um desbalanceamento entre a demanda por recursos e a oferta de poupança, provocando a elevação na taxa de juros de equilíbrio da economia. "Até que ponto isso ocorre depende de quanto do investimento privado é substituído pela dívida pública adicional. Vasta literatura aponta para o aumento da dívida pública como fator relevante de pressão altista sobre a taxa neutra nas últimas décadas", destacou o BC.