Ele sempre foi o diretor das estrelas. André Téchiné ofereceu grandes papéis a Catherine Deneuve, Emmanuelle Béart, Juliette Binoche, Isabelle Adjani, Isabelle Huppert. Quando resolveu ser autobiográfico e buscou novos atores, deu a primeira (grande) chance a Élodie Bouchez e a Gaël Morel, que depois virou diretor (e bom). Na quinta-feira, 28, estreou O Homem Que Elas Amavam Demais, o novo Téchiné. E nesta terça, 2, começa a retrospectiva do diretor – do autor, 8 Vezes Téchiné. Ele foi crítico de Cahiers du Cinéma. Pertence à geração pós-nouvelle vague. Ao contrário de um Christophe Honoré, nunca foi particularmente marcado pelo movimento. Como narrador, Téchiné é mais atraído pelos clássicos. Quando acerta, faz filmes maravilhosos.
No ano passado, em Cannes, Téchiné teve de se explicar 1.001 vezes. Depois de celebrar Catherine Deneuve em diferentes papéis – ele chegou a fazer dela uma lésbica -, Téchiné ousou fazer da eterna bela da tarde uma velha. Catherine Deneuve usa bengala em O Homem Que Elas Amavam Demais. O filme inspira-se num caso real que comoveu a França. Ela faz uma mulher rica, poderosa. Possui os maiores cassinos da Cote dAzur. E aí seu advogado se casa com sua filha. Volta a garota contra a mãe. A filha desaparece, depois de deixar todos os seus bens para o marido. Ele a matou? Sem cadáver, não existe crime. Deneuve vai aos tribunais. O caso arrasta-se.
Em Cannes, Téchiné teve de se explicar. “Catherine embarca nos filmes sem se preocupar com sua imagem. Vocês, jornalistas e críticos, é que se preocupam com isso. Para ela, são papéis. Usar uma bengala, envelhecer. Catherine não questiona muito o que lhe peço. Somos cúmplice há muito tempo. Ela confia em mim e sabe que não vou pedir nada que seja desabonador. Vocês (jornalistas) é que, insisto, tentam criar casos onde eles não existem.” Téchiné realizou seus primeiros curtas nos anos1960. A partir de Barroco, em 1976, vieram os longas. As Irmãs Brontë, Hotel das Américas, Os Ladrões, O Lugar do Crime, Rendez-vous. Há uma estrutura romanesca no cinema de Téchiné. Ele ama as grandes histórias. Em As Irmãs Brontë, mostra como as filhas de um pastor religioso liberaram sua imaginação e produziram obras-primas literárias. Emily, Charlotte e Anne. E as atrizes, Isabelle Adjani, Isabelle Huppert e Marie-France Pisier.
Em Hotel das Américas, Catherine Deneuve atropela Patrick Dewaere e inicia uma relação intensa com ele. Em Os Ladrões, Deneuve, de novo, fica entre dois irmãos, um criminoso, que morreu, e outro policial, que investiga o caso. E, em O Lugar do Crime, Deneuve, mais uma vez, é a mãe de garoto que está sendo chantageado por criminoso em fuga. No cinema de Téchiné há sempre essa coisa excessiva. As relações são complicadas, passionais. Muitas vezes ,o amor não ousa dizer seu nome. O autor, que não reprime sua homossexualidade – veja Rosas Selvagens -, é o primeiro a reconhecer que os amores, sejam heteros ou homos, são sempre complicados. É o tema que percorre os oito Téchinés da retrospectiva (Barroco, As Irmãs Brontë, Hotel das Américas, etc.) até o nono, que acaba de estrear. São filmes clássicos e elegantes. Celebram a arte da narração como a da representação. No centro desse cinema estão os atores – as atrizes. Deneuve, primeira e única. Com ela, Téchiné tudo ousa, tudo pode.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.