Esportes

Rogério Ceni diz que trabalhará no São Paulo ou no exterior se seguir no futebol

Após 25 anos, Rogério Ceni começa a se despedir de sua rotina diária de treinar e jogar pelo São Paulo. O goleiro se esforça para conseguir disputar o último jogo oficial neste domingo contra o Goiás, no estádio Serra Dourada, em Goiânia, pela 38.ª e última rodada do Campeonato Brasileiro, mas admite que pode ficar fora da partida que vale vaga na Copa Libertadores. Em entrevista exclusiva à Agência Estado, ele revela que pretende investir em palestras motivacionais, quer estudar o futebol e admite o desejo de treinar o São Paulo um dia.

Agência Estado – Você vai jogar domingo?
Rogério Ceni – Estou trabalhando. Esta lesão tem sido uma das coisas mais desagradáveis do final da minha carreira. Senti no momento que era grave porque não parava de doer. E no dia seguinte, quando fizemos o exame, foi constatada uma ruptura do ligamento (tíbio-fibular do pé direito). Vou esperar até quarta para fazer um teste, mas não é fácil. Estou há 32 dias sem treinar. Tem o meu desejo de jogar e sei o que o time precisa neste momento. Se conseguir voltar sem dor, treinar, aí tudo bem. Caso não dê, vou ajudar na parte motivacional. Se eu não estiver em condições de fazer um bom papel em campo não vou atrapalhar. Tenho de avaliar.

AE – A classificação para a Libertadores seria um prêmio por tudo o que elenco passou este ano?
Rogério Ceni – Sem dúvida. Pelo cenário, diante das circunstâncias que foram apresentadas, conseguir uma vaga na Libertadores seria uma prova da grandeza do clube, da grandeza da camisa.

AE – Em termos de liderança, como você imagina que será sua sucessão dentro da equipe?
Rogério Ceni – Na vida é assim, quando existe necessidade as pessoas aparecem, se formam novos líderes. Alguém tem de tomar a frente. Outros terão de aparecer. Já temos alguns como o Rodrigo (Caio), Lucão, que são jovens, não têm um lastro de títulos nas costas para assumir este papel, mas têm voz ativa. O (Alan) Kardec também é um cara muito profissional, tem uma consciência muito grande. Tem o Paulo Henrique Ganso também. Podem chegar outros jogadores mais rodados. Alguém terá de ocupar esse lugar.

AE – E no gol? Como o São Paulo vai buscar um sucessor para a sua posição?
Rogério Ceni – Posso falar pela experiência que eu vivi com o Zetti. Quando você tem uma oportunidade rara, quando o titular se machuca ou vai para a seleção, tem de mostrar tudo. Fui muito bem quando o Zetti não pôde jogar. Aí, quando vem uma oportunidade de ser o titular, depende da sua maturidade. O Denis, por exemplo, tem 80 jogos pelo São Paulo. O torcedor o conhece, tem uma expectativa sobre ele, sabe virtudes, deficiências, cria uma identidade. O Renan (Ribeiro) também pôde jogar sete, oito jogos agora. Os dois têm muita capacidade, tem o Leo também. Os três estão prontos. Agora, se vier um período mais fácil, com títulos, o torcedor vai abraçar. Se pegar um período mais difícil, é sempre mais complicado para encaixar.

AE – Você disse que não se via como treinador, até porque gostaria de trabalhar no São Paulo e sabe da instabilidade no cargo. O pensamento mudou?
Rogério Ceni – Tenho muita vontade de estender o meu conhecimento do gramado, da experiência que tive com todos os treinadores com os quais trabalhei, mas também tenho receio. O treinador é uma peça muito importante, mas não é o único fator que vai levar ao sucesso. Temos de ter uma simbiose de todos os envolvidos no trabalho. Mas, quem sabe, para o futuro, mais adiante, eu me arrisque nessa carreira. Por enquanto quero aprender, evoluir, adquirir o máximo de conhecimento. Agora, em outro clube, não tem como. Não dá para trabalhar em rivais. Não caberia isso dentro da história. Mas quem sabe aqui no São Paulo ou até fora do Brasil.

AE – Mas não tem intenção de continuar no São Paulo?
Rogério Ceni – Não tenho nenhum plano. Tenho compromisso até o dia 15 de dezembro. Depois disso quero descansar, pelo menos uns 45 dias. Aí, quem sabe, começar um novo ciclo de palestras. O ano de 2016 será difícil para o setor empresarial. É um nicho bacana de trabalho. Posso passar um tempo fora também, estudar futebol. Já falei com o Osorio (Juan Carlos) que quero passar uma semana acompanhando o trabalho dele na seleção mexicana. Também quero ir para os Estados Unidos para acompanhar um pouco o trabalho do Klinsmann. E ainda quero viajar à Europa para entender um pouco mais do futebol moderno. Independentemente de ser treinador no futuro, do que eu escolher, é 99% de chance de estar ligado ao esporte.

AE – Qual foi o seu maior rival? E o atacante mais temido?
Rogério Ceni – O atacante foi o Romário. Joguei muitas vezes contra ele e levei alguns gols. Tinha muita qualidade na frente do gol, finalizava muito bem, antecipava o chute com o bico da chuteira, a bola saia muito rápida e forte. A rivalidade fica restrita a Corinthians, Palmeiras e Santos. São quase 180 clássicos. É maior número de jogos, são os times que você enfrenta em finais ou momentos importantes de competições.

AE – Qual o melhor momento de toda a sua carreira?
Rogério Ceni – É difícil escolher em mais de 1.200 jogos, mas claro que os melhores momentos são aqueles que culminam com títulos importantes. O ano de 2005 foi espetacular. Foram três títulos, 21 gols em uma temporada, o que é um número expressivo para um goleiro. Um gol a cada 3,5 jogos. É uma média excelente. Marquei 11 gols de falta. Se fosse para escolher um único ano seria esse, que fica praticamente no meio da carreira.

AE – Como imagina que será o primeiro dia sem o São Paulo?
Rogério Ceni – Imagino com muita alegria, mas também uma mistura com um pouco de tristeza. Hoje estou falando sorrindo, mas no dia será chorando. Tento não pensar muito nisso. Tomara que aconteça com a maior naturalidade possível.

AE – Você lamenta não ter jogado mais pela seleção?
Rogério Ceni – De maneira nenhuma. Sou muito feliz porque pude estar em duas Copas. Infelizmente joguei só alguns minutos de uma partida. Confesso que sempre gostei muito mais de trabalhar aqui todos os dias do que em um ambiente que não era o meu do dia a dia, como era o da seleção brasileira. Acho extremamente valioso, honroso, você vestir a camisa da seleção, mas sou muito feliz pela minha história aqui. A minha história na seleção é pequena se comparada à que tenho no clube, mas foi marcante na minha carreira. Sou grato pela oportunidade que tive de estar presente lá.

AE – Como analisa o ano conturbado na política do São Paulo?
Rogério Ceni – Não podemos julgar a história do clube pelo fato de uma pessoa ter cometido supostamente erros quando presidente da entidade (nota da redação: Carlos Miguel Aidar). O São Paulo tem camisa. Tanto é que com muitos erros, com uma administração muito complicada, nós ainda disputamos vaga na Libertadores. Já que a história se tornou pública, é importante esclarecer o que aconteceu para que todos possam ter uma avaliação melhor.

AE – Você é o maior ídolo da história do São Paulo?
Rogério Ceni – Sinceramente, não tenho a mínima ideia. Acho que serei lembrado na história por todos aqueles que viveram esses anos com as conquistas expressivas, com situações amargas e alegres. Tenho um orgulho muito grande do que conquistei no São Paulo. Os títulos que ganhei serão lembrados com muito carinho. A cada década ou época se tem um grande ídolo, mas tenho certeza de que faço parte de um grupo seleto de jogadores que marcaram a história do clube.

Posso ajudar?