O secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, afirmou nesta segunda-feira, 30, que o enfrentamento à pandemia do novo coronavírus fará com que o ano de 2020 seja bastante atípico para a gestão fiscal do governo. Ele citou a estimativa do governo de um déficit primário superior a R$ 350 bilhões neste ano.
"Vou repetir: 2020 teremos um forte aumento do déficit primário. Já estimamos déficit primário acima de R$ 350 bilhões, e vamos revisar esses dados todas as semanas", disse Mansueto. "Haverá uma pressão forte em receitas e despesas de abril a junho, com o impacto de programas do governo no combate à pandemia e os efeitos sobre a atividade econômica. O déficit primário deve aumentar muito nos próximos três meses."
Quando as despesas do governo superam as receitas com impostos e contribuições, o resultado é deficitário. Quando acontece o contrário, há superávit. O conceito primário não engloba os gastos com juros da dívida pública.
Para este ano, o governo tinha de atingir uma meta de déficit primário até R$ 124,1 bilhões. Entretanto, com o decreto de calamidade pública, proposto pelo governo e aprovado pelo Congresso Nacional por conta da pandemia do coronavírus, não será mais necessário atingir esse valor.
Caso seja concretizado nesse patamar, o rombo terminará este ano acima de 4,5% do Produto Interno Bruto (PIB). De acordo com a série histórica do Tesouro Nacional, esse será o pior resultado desde o início da série histórica, em 1997.
Até então, o maior déficit primário, na porcentagem do PIB, indicador considerado mais apropriado para esse tipo de comparação, foi em 2016. Naquele ano, as contas apresentaram um rombo de 2,6% do PIB, o equivalente (em valores corrigidos pela inflação até janeiro) a R$ 181,571 bilhões.
Mansueto listou fatores que trarão mais desafio à gestão do governo, como o adiamento de pagamentos de impostos do Simples Nacional e medidas já anunciadas, como as antecipações de pagamentos de abono salarial e 13º de aposentados.
<b>Gastos temporários </b>
O secretário avaliou ainda ser fundamental o controle de gestão para que essas despesas temporárias de combate à pandemia não se transformem em gastos permanentes. "Se as ações contra coronavírus virarem permanentes, ajuste fiscal estará em risco. Ainda bem que estamos passando por crise depois de ter aprovado a reforma da Previdência e com juros e inflação baixos", acrescentou.
"Deve-se evitar os erros cometidos em 2009, quando o uso defensável de políticas anticíclicas foi ampliado no pós-crise e estas se tornaram políticas permanentes de concessão de subsídios e de maior intervenção do Estado na economia", afirma o Tesouro, em sumário executivo que acompanha o resultado do governo central de fevereiro.
O órgão cita como exemplo o Programa de Sustentação do Investimento (PSI) que, em 2009, era um programa de R$ 44 bilhões e foi ampliado nos anos seguintes para um programa de R$ 400 bilhões. "Assim, é importante que as despesas para combater a crise do Coronavírus sejam gastos de natureza temporária, cobertos pela abertura de crédito extraordinário no âmbito do decreto de calamidade pública, em 2020", conclui.
O texto ressalta que, enquanto a expansão da despesa para combater os efeitos da crise do coronavírus ficar restrita a programas temporários, não deverá haver problemas para a retomada do ajuste fiscal estrutural.
De acordo com o Tesouro, a política fiscal expansionista não é "a típica política keynesiana de expansão do gasto e investimento público" e se concentrará em programas de transferência de renda. "Em um contexto que as empresas estão fechadas, com restrições à mobilidade urbana e isolamento social, o desafio não é a expansão da demanda para combater o desaquecimento da economia, mas sim aumento do gasto público para amenizar a perda de renda de uma parcela significativa de trabalhadores e das empresas que precisam da ajuda do setor público para manter suas necessidades financeiras básicas", completa.
<b>Dívida</b>
O órgão destaca ainda que deverá haver um encurtamento da dívida pública, mas que deve ser diferente, por exemplo, da crise de 2002, quando houve forte efeito da desvalorização do real na dívida pública, que tinha 40% do estoque indexado ao câmbio. Em 2020, a parcela é de 10%. "O setor público é credor líquido em dólar, o que significa que a valorização do dólar amortece o efeito expansionista na Dívida Líquida do Setor Público (DLSP) do maior déficit primário", completa.
O Tesouro afirma ainda que, diferentemente de crises passadas, a desvalorização do real não tem sido repassada para os preços dos produtos e serviços. "O cenário de inflação baixa para este e para os próximos anos não foi alterado. Dessa forma, as taxas de juros de curto prazo continuam em níveis historicamente baixos, o que ajuda a não pressionar excessivamente a conta de juros e, por consequência o déficit do resultado nominal do setor público pelo lado monetário."