Ruy Ohtake se levanta em seu escritório. Busca um giz. Na parede, começa a desenhar o projeto do Condomínio Residencial de Heliópolis, um dos que mais se orgulha. “O que se faz ainda hoje nos conjuntos habitacionais é uma solução longa, com um corredor no meio. Depois de um ano, já começa a se deteriorar”, explica ao jornal O Estado de S. Paulo, enquanto desenha. “Pensei em fazer quatro apartamentos por andar, sem corredor, só com um hall. E entra também a parte estética. Prédios redondos, democráticos, com ventilação para todos, sem frente, nem fundo”, ele diz.
Tanto este projeto como cerca de 40 outros de sua longa carreira na arquitetura, que já tem quase 60 anos, estão numa exposição no Museu da Casa Brasileira, intitulada Ruy Ohtake: A Produção do Espaço. Feita em associação com o Museu Oscar Niemeyer, de Curitiba, a mostra apresenta maquetes, desenhos, plantas, fotografias e vídeos. A abertura para o público geral será nesta quarta-feira, 27.
Ao mesmo tempo, no Instituto Tomie Ohtake, centro cultural que leva o nome de sua mãe, pintora nipo-brasileira, e que fica localizado em um prédio desenhado por ele próprio, uma outra exposição relembra a sua obra pelo viés do design. Com o título de O Design da Forma, mostra algumas de suas peças em materiais variados, como porcelanato, madeira, aço e vidro. Esta, já está aberta ao público a partir desta terça-feira.
Aos 81 anos, Ohtake se diz feliz com a dupla homenagem. “Ambas, levadas ao conhecimento público, devem provocar algumas discussões. A vanguarda é polêmica sempre. Quem tem medo de polêmica não pode ser de vanguarda”, ele afirma. “Essa vanguarda é bem materializada no curso da contemporaneidade brasileira, que começou, ao meu ver, com o Oscar (Niemeyer) fazendo os projetos da Pampulha.”
A primeira das exposições, no Museu da Casa Brasileira, apresenta projetos de Ruy Ohtake desde que saiu da faculdade até hoje, com a presença de algumas plantas que ainda estão em fase de construção. São obras públicas, prédios empresariais, residências particulares e praças urbanas e orlas marítimas, em cidades não apenas do Brasil, mas também em outros países. “O desafio é fazer uma boa pesquisa. Para fazer um hotel, tenho que pesquisar alguns que já existem e fazer alguma coisa que não tenha nesses hotéis.”, ele esclarece. “No Renaissance, por exemplo, entre a Alameda Santos e a Itu, na descida da Haddock Lobo, o térreo tem quatro pavimentos, cada um com vista e entrada para a rua.”
O Renaissance, para ele, é outro marco na carreira. “O papel da arquitetura é magnetizar um pouco a cidade”, afirma. “O golpe militar prejudicou nossa arquitetura, no sentido de avanço da nossa criatividade. Os militares fizeram grandes obras de arquitetura no País, mas não interessava a parte criativa”, ele explica. Por isso, segundo Ohtake, faltava forma e cor nas obras do Brasil.
“Cor é muito importante para mim. O Brasil sempre foi um País de um colorido muito forte, em cidades como Paraty, Ouro Preto e Olinda”, acredita. “Achei que nós devíamos ter cor na cidade e comecei a colocar muitas cores.” O projeto do Renaissance, em vermelho, para ele, se destoa de muitos prédios da região. “Era o único com cor, o resto era cinzento. Esse foi meu desafio, trabalhar formas mais livres e também a cor.”
Ruy conta que a cor já estava presente em um dos projetos iniciais da sua carreira, a casa que desenhou para a mãe, Tomie Ohtake, em 1966. O colorido também foi parte fundamental do projeto de arquitetura social na comunidade de Heliópolis, em São Paulo. Um primeiro passo do projeto, lá, foi pintar casas em três vielas. Metade das cores foi escolhida pelos moradores e a outra metade pelo arquiteto. “A cor ajuda a obra a vibrar, ela tem que exalar vitalidade.”
O outro projeto de Ohtake na comunidade, o já citado Condomínio Residencial de Heliópolis, também é colorido e contou com a ajuda dos moradores na hora de bater o martelo das cores. “Alguém lá me disse que nos Jardins a construtora que escolhe a cor e vende os apartamentos. E eu fui perguntar a eles que cor eles queriam”, relembra Ruy.
Para o curador da exposição A Produção do Espaço, Agnaldo Farias, é a mistura dos elementos social e estético no pensamento de Ruy Ohtake que faz a sua obra particular, seja em qual for o tipo de construção. “O pensamento espacial de Ruy Ohtake traduz-se em sua arquitetura singular, produção que encara as dificuldades do País e que luta por melhorá-lo não só por meio de respostas técnicas, mas pela beleza que alivia o olho e alimenta a imaginação”, afirma em seu texto.
Entre outras obras de Ohtake lembradas na mostra, a primeira sobre a sua carreira em mais de 10 anos, estão ainda projetos urbanísticos como o Parque Ecológico do Tietê e o Terminal Sacomã, ambos em São Paulo, e também edificações marcantes, como o Hotel Unique e o complexo Aché Cultural, também em São Paulo, o Alvorada Hotel em Brasília e a Embaixada Brasileira em Tóquio, no Japão.
A PRODUÇÃO DO ESPAÇO
Museu da Casa Brasileira. Av. Faria Lima, 2705. Tel. 3032-3727. 3ª a dom., 10 às 18h. R$ 10. Grátis aos fins de semana. Até 19/5.
O DESIGN DA FORMA
Instituto Tomie Ohtake. R. Coropés, 88. Tel. 2245-1900. 3ª a dom., 11 às 20h. Grátis. Até 14/4.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.