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SAÚDE NÃO É BRINCADEIRA

Confira artigo do presidente do Cremesp (Conselho Regional de Medicina - SP) que pede mais respeito das autoridades com os médicos e os cidadãos

A saúde do Brasil está em xeque. Tanto o sistema público
quanto o privado patinam em uma crise de décadas, tornando o acesso dos
cidadãos cada vez mais difícil. Das autoridades, faz tempo, cobramos uma
política de estado para o setor. Uma política acima dos partidos, de ambições
eleitorais e de improvisos equivocados.

 Os apelos de médicos, de outros profissionais e
trabalhadores da saúde, dos pacientes e do conjunto dos cidadãos, infelizmente,
parecem não sensibilizar as autoridades. Os erros são sucessivos, como o
recém-lançado Programa Mais Médicos, anunciado como solução para todos os males
do Sistema Único de Saúde (SUS) pelo Governo Federal.

 É lamentável que o mesmo Governo que anuncia uma série de
êxitos no campo econômico, ignore uma questão social da maior importância,
perpetuando o subfinanciamento e a gestão ineficiente no âmbito da rede pública
de saúde. A desassistência é risco iminente e precisa de ações consistentes
agora para ser evitada.

 Um dos vários pontos questionáveis do Programa Mais Médicos
é a mudança do currículo acompanhada da ampliação do curso de Medicina em dois
anos. O governo pretende obrigar, já a partir de 2015, quem entrar na faculdade
a passar dois anos em treinamento no SUS. Em outras palavras, afronta a
Constituição Federal, criando, na prática, o serviço civil compulsório para
médicos. Ou o ser meio médico, meio escravo. 

 Inadmissível! Inclusive por atrasar a entrada de
profissionais no mercado e a formação de especialistas que o Brasil tanto
necessita, como pediatras, ginecologistas, médicos de família, entre outros.

 A proposta não é efetiva nem eficaz, e sim midiática, para
serenar os ânimos dos milhões de brasileiros que têm tomado as ruas exigindo
saúde de qualidade e justiça social, pois que ingressar na faculdade de
medicina em 2015, só sairá graduado em 2022, o que não é solução para o
iminente colapso do sistema.  

 A vinda de médicos estrangeiros sem revalidar o diploma para
comprovar se estão ou não qualificados e a abertura de mais vagas em escolas
médicas sem qualidade são outras medidas inaceitáveis.

 O plano do Executivo Federal representa perigo aos
pacientes. Expõe, sobretudo, a parcela mais vulnerável e carente, pois é ela
quem de fato estará entregue a profissionais de formação duvidosa, já que o
governo sinaliza que a importação em massa ocorrerá sem que os médicos formados
no estrangeiro tenham de comprovar capacitação.
 
As fronteiras do País sempre estiveram abertas a médicos de todas as nações.
Entrementes, existem regras legais a serem cumpridas para o ingresso desses
profissionais, para garantir assistência de qualidade aos cidadãos. Uma delas é
o processo de avaliação que mensura os conhecimentos e habilidades na prática
da medicina.
 
Para ter ideia do risco a que a população será exposta se a revalidação de
diplomas for dispensada, no ano passado, o exame registrou alto índice de
reprovação, em torno de 90%. Fica assim evidenciado que os cidadãos serão
assistidos por profissionais não habilitados o suficiente e, consequentemente,
estarão sujeitos a erros médicos.

 Quanto ao oferecimento de uma bolsa de três anos com salário
pago pelo Ministério da Saúde de R$ 10 (cerca de R$ 7, abatidos impostos) para
atrair médicos, é mais uma cortina de fumaça para legitimar a vinda de
profissionais de fora com formação inadequada. Hoje, devido à falta de
estrutura e de políticas consistentes para interiorização, nem um salário de R$
100 mil atrai profissionais para essas áreas.

Os médicos brasileiros não são mercenários, não pautam suas
ações no mercantilismo, na busca de dinheiro fácil. Querem sim condições para
exercer a profissão com dignidade e resolubilidade.

Não dá para fazer medicina sem ter infraestrutura, sem ter
enfermagem, sem ter cirurgião-dentista, sem ter outros profissionais da área da
saúde, sem ter assistente social, sem ter acesso a um hemograma, a raio-X,
medicamentos, maca… O dinheiro não compra médico; seu compromisso é com o
paciente e a prestação de assistência humanística e de qualidade.

 Diz o governo ter se inspirado na Inglaterra para conceber o
Programa Mais Médicos. O paradoxo é que a Inglaterra possui um sistema de saúde
exclusivo e investe 10% de seu Produto Interno Bruto nele. No Brasil, são
investidos apenas 3,5% do PIB.

 Pontuadas nossas principais críticas ao Programa Mais
Médicos, apresentamos, novamente, propostas simples e eficazes para reverter o
caos da saúde. Como solução para o problema da falta de profissionais de saúde
em áreas remotas e nas periferias, pedimos especial empenho do Executivo para a
aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 454/2009, que cria a
carreira médica no serviço público, semelhante à de juízes e promotores.

 A aprovação da PEC 454 é a garantia da interiorização de
médicos brasileiros para as áreas carentes de acesso à assistência. A medida
evitaria a necessidade de importação de médicos sem aprovação do Revalida e,
dessa forma, reaguardaria o direito à saúde da população.

 Que fique registrado, contudo, que a resolução do problema
do atendimento integral não depende somente da melhor distribuição geográfica
de médicos, mas também de estrutura adequada à assistência. Atualmente,
repetimos, o SUS enfrenta um grave subfinanciamento e também distorções no
processo de gestão. Por consequência, pleiteamos o aumento da destinação de
verbas federais para 10% da Receita Bruta, e a criação de mecanismos adequados
à fiscalização da gestão.

 Desde já, exaltamos os presidentes do Senado Federal, Renan
Calheiros, e da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves, assim como a
todos os parlamentares do Congresso Nacional a derrubar a Medida Provisória
(MP) que institui o Programa Mais Médicos. Também conclamamos a população a
entrar imediatamente em contato com os deputados e senadores e deputados que
elegeram, cobrando uma posição firme contra a MP e em defesa da saúde dos
brasileiros.

 Renato Azevedo Jr, presidente do Cremesp

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