O antigo setor Repertório da SP-Arte mudou de nome e de curador em 2019: o crítico e professor de história da arte Tiago Mesquita assume o espaço, agora chamado Masters. A proposta é parecida, porém: oferecer aos visitantes trabalhos de artistas de cujas obras os conceitos já estivessem estabelecidos no século 20. É o caso de nomes como Lygia Pape (1927-2004), Letícia Parente (1930-1991) e Pedro Escosteguy (1916-1989) – mas também de gente que continua na ativa, como Analívia Cordeiro, Carlos Zilio e Carlos Fajardo.
“Esse trabalho é feito muito em parceria com as galerias”, explica o curador. “Ao tomar propostas, tentamos dar um formato para a exposição.” Uma das ideias foi criar um espaço de contemplação numa feira que tem por característica ser esparsa: cada estande de galeria apresenta a obra de apenas um autor, demonstrando justamente o repertório de ambos.
“A feira oferece uma relação de muita intensidade, porque as pessoas têm pouco tempo para ver muita coisa. Fico atento para criar um lugar de visitação mais pacífico dentro desse ambiente frenético. Então, a seleção lida com questões fortes da América Latina e do Brasil.” Ele dá o exemplo da obra de Lygia Pape. “Na trajetória dela, é possível notar uma mudança de ânimo pós-AI-5, é outro trabalho, muito autorreflexivo. Se antes havia uma resolução sensorial otimista, depois ganha um sentido de luta social e política.”
A Galeria Almeida e Dale vai levar obras da artista fluminense à feira: são alguns relevos em azul, da década de 1950, peças do Livro do Tempo, do início da década de 1960, e também serigrafias em metal dos anos 1970. Peças do Livro dos Caminhos, projeto idealizado por ela no início da década de 1960 e concretizado no início do século 21, também estarão presentes no espaço. Esse poema visual é uma construção modular composta por estruturas que, segundo a artista dizia, lembram os edifícios de São Paulo.
O galerista Carlos Dale Junior encara a feira como uma oportunidade de desenvolver relações, mais do que propriamente vender. “Nosso principal papel ali é o de divulgação da galeria, dos artista que trabalhamos, do nosso método, conhecer novos clientes”, explica. “Nós temos uma estratégia de fidelizar.” Ele vem, entretanto, enxergando a SP-Arte como espaço interessante também para visitantes que desejam apenas apreciar as obras. “Na feira, existem trabalhos que nenhum museu exibe.”
Uma peça marcante que poderá ser vista na seção Masters é Neutral, de 1966, de Carlos Fajardo, ponto de virada na carreira do artista. Ele não participa manualmente da produção da peça, mas constrói as instruções para ela ser manufaturada: um cubo de acrílico de 40 cm, com outro cubo dentro dele, visto apenas quando manuseado pelo espectador. “A obra demonstra uma relação entre o atual (a coisa) e o virtual (a imagem). A peça influenciou toda minha produção até hoje, porque vou buscar muito no meu trabalho a relação entre o que é imaginário e o que é linguagem”, explica o artista.
Ele comenta que, hoje em dia, não é necessário construir de fato o cubo de acrílico. “A obra de arte é sempre considerada o objeto feito à mão. O meu trabalho não indica essa direção. Não me preocupo muito com o fazer físico, me preocupo com a concepção técnica no sentido da execução do trabalho a partir de uma proposta artística. Essa execução não deve ou precisa estar na minhas mãos”, reflete. A Galeria Marcelo Guarnieri vai levar outros trabalhos de Fajardo, inclusive pinturas (“sempre preocupadas com o reflexo”) e artigos de aspecto construtivo, derivados de sua formação em arquitetura.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.