Esportes

Sem tanto dinheiro como antes, clubes fazem negócios mais modestos

Não faz muito tempo desde que os torcedores dos grandes clubes do Brasil, em especial os de São Paulo, sonhavam com contratações milionárias e elencos estelares. Mas, a julgar pelo que o mercado da bola tem indicado até aqui, o tempo de vacas gordas ficou para trás e deu lugar a negociações mais modestas. O conto de fadas do futebol brasileiro acabou.

Reforços de impacto ainda são possíveis, mas são peça cada vez mais rara e geralmente vem acompanhados de algum parceiro que são interessados numa valorização para rápida revenda. As últimas negociações deste tipo – a ida de Leandro Damião para o Santos e de Marcelo Cirino para o Flamengo – foram nestes moldes. De resto, as cifras vultuosas de outros momentos estão cada vez mais desidratadas.

A renegociação dos direitos de televisão com a Rede Globo em 2011 marcaram o que parecia ser uma revolução no futebol brasileiro. Munidos com as luvas milionárias pagas pela emissora, os clubes foram às compras e passaram a fazer transações antes nunca imaginadas. O São Paulo, por exemplo, pagou R$ 24 milhões para tirar Paulo Henrique Ganso do Santos e acenou com R$ 500 mil mensais para convencer Lúcio a deixar o futebol italiano e voltar para o Brasil, mesmo valor pago pelo Grêmio para seduzir Kleber a defender o clube.

Ninguém, no entanto, superou o Corinthians. Embalado pelo título da Copa Libertadores e do Mundial de Clubes da Fifa, o time alvinegro chacoalhou o mercado ao pagar R$ 45 milhões para repatriar Alexandre Pato do Milan. O negócio parecia ser a implementação de um novo paradigma, já que pela primeira vez um clube brasileiro trazia da Europa um atleta com mercado fora do país e que não estava em fim de carreira. Não faltou quem imaginasse uma era de ouro no país. Mas o ouro era de tolo.

“Ficou claro que era uma bolha que estourou; os balanços de 2013 já mostravam o endividamento crescente dos clubes. Torraram o dinheiro sem preocupação com o amanhã”, detonou Amir Somoggi, da Consultoria BDO. Para o especialista em gestão, faltou planejamento de longo prazo para que os clubes se preparassem para anos mais complicados. “A tendência é que os clubes fechem o ano em situação ainda pior”.

Além do gasto desenfreado do dinheiro que parecia brotar como água, a economia brasileira foi crucial para que o ímpeto murchasse. O futebol não passou incólume ao fraquíssimo desempenho de outras áreas e viu as verbas minguarem. Diversos clubes perderam o patrocínio e terminaram o ano vivendo de aportes pontuais de empresas que queriam ver suas marcas estampadas em determinados jogos. Não fosse a Caixa, que patrocinou sete dos 20 participantes da Série A no ano passado, o número poderia ser pior.

Para Somoggi, no entanto, nada bate a falta de planejamento. “O Corinthians gastou quase R$ 100 milhões entre luvas e salários para o Pato jogar no arquirrival, o Botafogo quebrou para trazer o Seedorf”, lembrou. Nem mesmo o Cruzeiro, considerado modelo de gestão, escapa das críticas. “Gastaram uma fortuna com o Júlio Baptista e ele não trouxe o retorno esperado. Não se trabalha o conceito de marketing direito”, emendou.

FREIO – Asfixiados por dívidas crescentes e cada vez menos recursos, os clubes agora trilham o caminho inverso e não são poucos os que trabalham para enxugar gastos. Carlos Miguel Aidar reduziu em 20% o quadro de funcionário do São Paulo, o Grêmio reduziu a folha salarial do elenco em quase 40% e o recém-empossado Modesto Roma Júnior promete colocar o Santos, que deve o 13.º para seus funcionários e ainda não quitou os salários do time, em dia. Já o palmeirense Paulo Nobre tenta implementar contratos por produtividade no elenco.

Um dos primeiros a identificar a necessidade de se readequar foi o flamenguista Eduardo Bandeira de Mello. O mandatário assumiu em 2012 pregando uma gestão profissional e austeridade financeira e aos poucos vai conseguindo arrumar o time rubro-negro, apontado no passado como exemplo maior de baderna administrativa.

Ao apresentar Marcelo Cirino, o dirigente prometeu manter a política, que parece ter aceitação cada vez maior da torcida. “Sempre falei que o Flamengo vai fazer tudo dentro da nossa possibilidade, sem ferir nossos valores. Vamos agir dentro da lei, pagando tudo em dia, pagando nossos impostos. Trouxemos o Flamengo dentro de uma legalidade. Em qualquer cenário no futuro, o Flamengo vai honrar seus compromissos”.

A dúvida é saber se jogadores e treinadores aceitarão os novos tempos e toparão salários menores que os pagos atualmente. “Quem não estiver pronto para isso, vai precisar se contentar em jogar em mercados de menor expressão como México e China, que pagam bem, mas não te dão exposição alguma”, analisou Somoggi.
Criatividade e inovação serão fundamentais nestes tempos, já que o dinheiro acabou.

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