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Seminário discute a transformação urbana pela cultura

Primeiro museu nacional dedicado à arte moderna e contemporânea do Reino Unido, a Tate Modern de Londres, em pouco mais de 13 anos, deixou de ser uma antiga central elétrica deteriorada na área do Bankside para se transformar numa das principais instituições culturais do mundo. Seu diretor de Regeneração e Parcerias Comunitárias, Donald Hyslop, está em São Paulo para participar de um seminário importante sobre a transformação dos centros urbanos, Cidades Performáticas: Uma Discussão sobre Arte, Arquitetura e Espaço Público, que a Fundação Bienal e o Arq.Futuro promovem nesta sexta-feira, 5, das 9 às 19h, no auditório da Bienal.

Participam do evento outros representantes de instituições igualmente respeitadas, como o arquiteto português Pedro Gadanho, curador do Departamento de Arquitetura e Design do Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA), que, a exemplo de Hyslop e da economista e professora Lídia Goldenstein, diretora da Fundação Bienal que abre o evento, conversaram com o Caderno 2 sobre a criatividade como motor da regeneração urbana. Eles também apontam novas diretrizes para a formulação de políticas que estimulem a economia criativa, que fez da Tate Modern um exemplo de sucesso.

A economista Lídia Goldenstein reconhece o Reino Unido como a “capital global do debate sobre economia criativa”, mas teme que, no Brasil, o termo economia criativa “mais pareça uma caricatura”, associado ao artesanato e frequentemente confundido com políticas sociais populistas para as populações de baixa renda. Com a crise de 2008, lembra a professora, analistas estrangeiros passaram a recomendar investimentos no setor cultural como alternativa, mas essa estratégia nem sequer foi considerada no país de Macunaíma. O design, as políticas de inovação e os projetos de revitalização urbana são abstrações no Brasil, que, segundo ela, “ainda pensa a economia como se pensava nos anos 1950”.

Nossa economia, diz a professora, despreza a estratégia baseada na importância da cultura como alavanca do crescimento, do turismo, das exportações e da geração de empregos. “Não olhamos para o que acontece no mundo, onde a cultura e a criatividade não são consideradas marginais, secundárias no plano macroeconômico.” Em outras palavras: quando ouvem falar em política cultural, as autoridades governamentais brasileiras não sacam o revólver, como Göring, mas disparam o velho discurso da inclusão social.

Desprezam a sinergia, a parceria com entidades privadas e não ouvem a comunidade para reinventar as cidades e replicar exemplos como o da Tate Modern, que, aliás, promoveu internacionalmente mais artistas brasileiros (Cildo Meireles e Mira Schendel, entre outros) que os museus nacionais.

“Considerando o que aconteceu nos últimos 15 anos, quando a antiga usina Bankside começou a ser reformada para virar a Tate Modern, fica claro que ela é muito mais que um museu”, diz o diretor Donald Hyslop. A Tate ocupa, sim, o centro de uma estratégia que faz uso de organizações criativas para revitalizar a área central de Londres. O projeto, revela Hyslop, é sustentado por alianças entre as esferas pública, privada e política, que tentam encontrar um ponto de equilíbrio entre as necessidades das comunidades locais, os trabalhadores e turistas.

Ele reconhece que, embora a Tate Modern e o Guggenheim tenham inspirado uma série de investimentos de capital, trouxeram, por outro lado, frutos indesejáveis como o comércio ilegal e a mendicância, atraída pelo impressionante número de turistas (são 13 milhões de visitantes por ano no quarteirão da Tate Modern, segundo ele). “No entanto, devemos considerar que ela criou mais de 2 mil empregos diretos, 32 mil indiretos, além de estimular a construção de imóveis residenciais e comerciais na área, fazendo dobrar a população e o número de trabalhadores na área.” E, dado relevante: tem um impacto de £ 900 milhões na economia londrina.

“Não poderia falar da experiência do Guggenheim de Bilbao, se ele continua ou não a promover a regeneração local, mas trata-se de um projeto icônico, que mudou a feição da cidade e a destinação dos turistas”, avalia Hyslop, garantindo que a Tate Modern não tem a menor intenção de se instalar no Brasil, ao contrário do Guggenheim. Tampouco o de usar seus museus para promover exposições do tipo blockbuster – as que vieram para cá, como a de Mira Schendel, são culturalmente relevantes. “A revitalização movida pela cultura vai além dos prédios dos museus, ela tem de romper com antigos mecanismos, como os planos diretores das cidades, para trabalhar com parcerias mais sólidas, como é o caso da associação dos moradores de Bankside, que discute conosco as formas de uso da área.”

O curador de arquitetura e design do MoMA de Nova York, Pedro Gadanho, que acaba de inaugurar no museu americano a exposição Uneven Growth, sobre urbanismo tátil em megacidades, pensa igualmente nos efeitos positivos que provoca a reinvenção do espaço urbano quando o foco não é o simples delírio arquitetônico, mas a inclusão comunitária nos projetos das instituições. “O MoMA, particularmente, tem um histórico, desde a sua criação, em 1929, de difundir a arquitetura moderna, atraindo a população local para o convívio com seu acervo, a partir mesmo da abertura de seu jardim logo pela manhã.” O museu nova-iorquino, revela, guarda mais de 30 mil peças dos arquitetos Mies van der Rohe e outras tantas de Frank Lloyd Wright, dois vetores da modernidade arquitetônica que inspiraram a criação de museus referenciais (a Galeria Nacional de Berlim e o Guggenheim de Nova York, respectivamente). E ninguém duvida que a arquitetura de ambos trouxe benefícios econômicos para ambas as metrópoles.

CIDADES PERFORMÁTICAS
Fundação Bienal de São Paulo. Av. Pedro Álvares Cabral, s/nº, Ibirapuera, portão 3. Hoje, 9 h/19 h. Grátis (lugares limitados).

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