O Senado Federal quer votar ainda em maio um novo projeto de lei sobre clube-empresa. De autoria do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), a proposta conta com o apoio de times e da CBF para tentar aplicar no futebol brasileiro algumas mudanças. A principal delas está na criação de uma estrutura societária específica, intitulada Sociedade Anônima do Futebol (SAF). Os clubes poderiam, assim, deixar de lado a constituição mais comum, a de entidade sem fins lucrativos.
O relator do Projeto de Lei é o senador Carlos Portinho (PL-RJ), advogado na área de direito desportivo com anos de experiência em serviços para clubes e jogadores. As discussões sobre clube-empresa se prolongam há anos em Brasília. Uma das últimas propostas tramitou na Câmara e teve como relator o deputado federal Pedro Paulo, que se licenciou do cargo para assumir a Casa Civil do Rio de Janeiro. O projeto ficou adormecido desde então.
Entre a proposta anterior, que circulou na Câmara, e o Projeto de Lei em tramitação do Senado, há uma grande diferença no que diz respeito ao incentivo para os clubes aderirem ao formato empresarial. No projeto anterior, o texto criava contrapartidas como refinanciamento de dívidas, possibilidade de recuperação judicial e simplificação do sistema judicial para incentivar a mudança posterior. Agora, a ideia é primeiramente criar um marco relatório e oferecer segurança jurídica aos investidores para que somente depois disso seja feita a adoção ao novo tipo societário.
"Esse projeto busca trazer novos recursos para o futebol para dar segurança ao investidor. Para alguns clubes, essa ideia é uma grande solução", disse ao <b>Estadão</b> o relator do projeto, senador Carlos Portinho. "Nós temos de construir uma legislação que seja sedutora para os clubes e para o investidor. A ideia não é ter isso como a salvação, mas sim uma oportunidade para aqueles que quiserem. Não será uma adesão obrigatória", acrescentou.
Segundo Portinho, um das vantagens da SAF é permitir a emissão de títulos, com a regulação dos clubes pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). O projeto sugere a criação de duas classes ordinárias dentro das equipes. A primeira seria no formato atual, composta por dirigentes do futebol e dona da maior parte do ativo. A segunda, por sua vez, seria integrada por investidores. Dessa maneira, seria possível um clube buscar recursos no mercado, seja por oferta pública de ações (IPO) ou pela emissão de debêntures – título de crédito junto a terceiros.
Para conseguir apoio, Portinho afirma que desde março realizou conversas com mais de 340 pessoas. Clubes, CBF, credores e políticos foram ouvidos. Da parte do futebol, a principal articulação é com a Associação Nacional de Clubes de Futebol (ANCF). O presidente do órgão é o mandatário do Avaí, Francisco José Battistotti, que é um grande entusiasta do projeto e da criação da SAF.
"Ter uma sociedade específica para o futebol vai nos ajudar facilitar, porque assim conseguiremos fazer parcerias e ter uma gestão compartilhada na qual o clube teria a maior parte do ativo", disse Battistotti ao <b>Estadão</b>. A ANCF conta atualmente com 24 filiados e tem acompanhado de perto as discussões. "Uma das nossas principais solicitações ao senador é que a adesão ao novo formato não fosse obrigatória, até porque alguns clubes podem querer permanecer no modelo atual", afirmou.
Além disso, com o projeto, as SAFs pagariam menos tributos que uma empresa tradicional graças a programa de natureza transitória chamado "Re-Fut". Com ele, passaria a vigorar a taxa única de 5% da receita mensal para contribuições sociais e impostos por cinco anos. A previsão do relator é que em maio o texto seja votado e aprovado pelo Senado. Depois, seguirá para a Câmara e na sequência dependerá da sanção presidencial. O intuito é que ainda neste ano já se tenha um marco legal sobre o clube-empresa no Brasil.
APROVAÇÃO – Para especialistas em direito esportivo e tributário ouvidos pelo <b>Estadão</b>, a proposta em tramitação no Senado Federal é bastante positiva por apresentar soluções para uma antiga demanda. O termo clube-empresa é discutido no Brasil desde o fim da década de 1990 e encontra agora um amparo mais concreto para que possa ser aplicado.
"O primeiro grande benefício é que o assunto seja finalmente tratado. O tema era renegado pela legislação. O segundo benefício é ter um tipo societário que traz formas de o clube se transformar em empresa. E o terceiro, é ter recursos para ter acesso ao capital de investimento", explicou o especialista em Direito Desportivo do CSMV Advogados André Sica. Apesar das vantagens, a expectativa é que o futebol ainda leve um tempo para absorver essas mudanças. "É um processo que vai levar de dez a 15 anos para que a gente tenha uma alteração visível de cenário", explicou.
"A proposta pode encorajar associações em sua maior profissionalização, trazendo maior segurança para investidores, e isso pode ser vetor de fluxo financeiro para melhorar a situação geral do futebol", comentou o especialista em Direito Tributário do CSMV Advogados, Flávio Sanches. "O modelo proposto tem muitas virtudes. Dentre elas a simplificação do tema como um todo", acrescentou.