Enquanto o cinema brasileiro comemora o sucesso comercial de Marighella, de Wagner Moura, visto por cerca de cem mil pagantes em uma semana, seu protagonista, o cantor Seu Jorge, já está de volta às telas no papel de um ícone da música: o maestro, compositor, flautista e saxofonista Alfredo da Rocha Vianna Filho (1897-1973). Seus feitos são revisitados, sob a direção de Denise Saraceni, em Pixinguinha – Um Homem Carinhoso, que estreia hoje.
Até o fim do mês, vai ter mais uma canja de Seu Jorge: ele é um dos atores de Medida Provisória, primeiro longa de Lázaro Ramos como diretor. São três narrativas que passam pelas contradições raciais do Brasil, como a voz por trás de hits como Burguesinha afirma nesta entrevista ao <b>Estadão</b>.
<b>Qual é a importância de Pixinguinha para a maneira de se fazer música no Brasil e como ele o influenciou? </b>
Ultimamente, por conta do que a pandemia mudou, tudo para mim é som. Estou sempre na música. Mas trabalho como ator há 20 anos e quando tenho a chance de viver um músico no cinema, essa experiência é uma consagração para mim – como é o caso de Pixinguinha, que é um instrumentista virtuoso em todos os sentidos. Vinicius de Moraes dizia que ele era um anjo na Terra. Sempre fui encantado com as histórias sobre a generosidade dele. O momento que mais me emociona em sua trajetória é quando ele e seu conjunto, Os Oito Batutas, saem do Brasil para divulgar nossa música no exterior.
<b>Em 2022, Cidade de Deus completa duas décadas. Foi o filme que o revelou como ator internacionalmente. Um filme com um dos processos de preparação de elenco mais singulares de nosso cinema. Quase 20 anos depois, aquele processo ainda marca a sua forma de atuar? As lições que recebeu para fazer o papel de Mané Galinha criaram o método de atuação que você usa em um filme como Pixinguinha?</b>
Cidade de Deus me aproximou das causas do Brasil, da minha gente, origem, da minha própria negritude. É um marco para atores negros. É a história de uma cidade inteira, com seus conflitos. Ali, vi que tudo o que um personagem sente na história dele, vou sentir também. Nas filmagens, vou conviver com o que o personagem sente na história. Fazer o filme sobre Pixinguinha significava experimentar um outro lado da dramaturgia, pautado pela poesia e beleza. A Denise Saraceni é uma mulher com larga experiência em direção. Quando você é músico, é lógico que a prática auxilia. Mas quando você precisa viver o Pixinguinha, a pessoa, nessa hora fica só o humano.
<b>Com pré-estreias lotadas, Marighella desponta como o fenômeno nacional de bilheteria do ano. Como avalia a importância política do longa de Wagner Moura em meio ao racha político que hoje divide o Brasil? </b>
A proposta do Wagner de contar a história de Marighella começou lá em 2013, mas só agora o filme saiu em circuito por aqui. Não fazia sentido não ser lançado no Brasil. Mas, passado tanto tempo, acho que os astros convergiram e tornaram mais fácil a compreensão das pessoas sobre o que significou a luta contra a ditadura naquele momento.
<b>Marighella pode levar alguém a votar diferente em meio à polêmica política? </b>
Não posso afirmar isso. Mas sei que o filme tem a capacidade de fazer as pessoas sentirem a História e se aproximarem dela. Tem gente que fica duas horas vendo Homem de Ferro. Mas tem gente que pode usar esse tempo para ver um pouco da nossa história.
<b>Além de Pixinguinha e Marighella, você estará nas telas, no fim do mês, com Medida Provisória, de Lázaro Ramos. Os três têm personagens ligados a lutas raciais. O que esses filmes trazem de mais relevante para a representação das populações negras?</b>
Estamos em momento de debate profundo. Somos a maioria no Brasil. Um povo ávido pela mudança de uma prática que só contribui para a desigualdade. É impossível se desenvolver com o racismo.
<b>E sobre sua participação no cinema internacional? </b>
Acabei de vir de um filme do Wes Anderson, Asteroid City. Foi incrível voltar a filmar com ele quase 20 anos depois de A Vida Marinha com Steve Zissou.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>